quarta-feira, 11 de junho de 2025
quarta-feira, 4 de junho de 2025
STF retoma julgamento que pode mudar regras das redes sociais no Brasil
Por Fernando Miller, no DCM: O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira 4 de junho um julgamento crucial que pode redefinir o papel das redes sociais no Brasil. Em debate está a constitucionalidade do artigo 18 do Marco Civil da Internet Lei 129652014 que atualmente limita a responsabilidade das plataformas digitais pelo conteúdo postado por seus usuários exigindo decisão judicial para que postagens sejam removidas.
O que está em jogo é a possibilidade de tronar as big techs como Google Meta dona de Facebook, Instagram e WhatasApp entre outras legalmente responsáveis por conteúdos ilegais publicados por terceiros como discursos de ódio, desinformação, incitação à violência e crimes contra crianças. O julgamento acontece em meio a pressões políticas e empresarias e pode gerar profundas mudanças na maneira como o Brasil regula o ambiente digital.
Hoje o artigo 19 estabelece que os provedores de aplicações de internet não podem ser responsabilizados por conteúdo gerado por terceiros a menos que haja uma ordem judicial específica determinando sua remoção. O texto também prevê que essa ordem judicial deve especificar claramente o que deve ser retirado do ar. A aplicação dessa regra depende de legislação específica. O STF agora analisa se esse modelo é compatível com a Constituição ou se é necessário ampliar a responsabilização das plataformas permitindo a remoção de conteúdo ilegal a partir de notificações extrajudiciais, ou seja sem decisão judicial.
Até agora três ministros já votaram e todos de formas diferentes se posicionaram contra o atual formato do artigo 19. Os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux defenderam que em casos de conteúdos evidentemente ilegais como mensagens com ataques à democracia incitação à violência, racismo, pornografia infantil, entres outros a plataforma deve ser obrigada a remover o material apenas com uma notificação extrajudicial. Para eles não seria necessário aguardar uma ordem da Justiça.
O ministro Luís Roberto Barroso, por sua vez, apresentou uma posição mais moderada. Em seu voto ele defende que a notificação extrajudicial seja suficiente apenas nos casos de crimes graves à democracia. No entanto, para crimes contra a honra ou ilícitos civis em geral Barroso entende que a remoção deve ocorrer somente após decisão judicial.
O julgamento havia sido interrompido em dezembro de 2024, após pedido de vista do ministro André Mendonça que nesta quarta-feira apresentará um voto divergente dos já proferidos sinalizando uma terceira linha de interpretação.
Do lado empresarial, o Google e a Meta se posicionam publicamente contra a possibilidade de mudança do modelo atual. O presidente do Google no Brasil Fábio Coelho declarou em entrevista que se prevalecer o entendimento de que as plataformas são responsáveis juridicamente pelo que os usuários publicam o ambiente digital no país se tornará mais difícil de operar.
Em nota, o Google afirmou que abolir as regras que separam a responsabilidade civil das plataformas e dos usuários não contribuirá para o fim da circulação de conteúdos indesejados na internet e que o Marco Civil da Internet pode e deve ser aprimorado desde que sejam estabelecidas garantias procedimentais e critérios que evitem insegurança jurídica e a remoção indiscriminada de conteúdo. Já a Meta ressaltou que caso o artigo 19 seja declarado inconstitucional as plataformas digitais estariam sujeitas a um regime amplo de notificação e remoção e ao mesmo tempo poderiam ser responsabilizadas por praticamente todos os tipos de conteúdo mesmo sem terem sido notificadas.
O julgamento tem também impacto no cenário internacional. Recentemente o governo dos Estados Unidos sob Donald Trump ameaçou vetar vistos a autoridades brasileiras envolvidas em sanções contra as big techs. A ameaça veio após o ministro Alexandre de Moraes do STF ordenar a suspensão da rede social X, antigo Twitter, em 2024 devido ao descumprimento de decisões judiciais.
Estão sendo analisados dois recursos extraordinários que tratam da responsabilidade civil das plataformas por conteúdos de terceiros e da possibilidade de remoção de postagens ofensivas a partir de notificação extrajudicial. Um desse recursos foi apresentado pelo Google e outro pelo Facebook, ambos com o objetivo de contestar decisões judiciais que responsabilizariam as empresas por danos causados por conteúdo de usuários.
A depender do resultado do julgamento o STF pode declarar o artigo 19 inconstitucional obrigando as plataformas a atuarem de forma mais ativa na remoção de conteúdos ilegais, criar uma nova jurisprudência sobre a responsabilidade civil das empresas de tecnologia e os limites da liberdade de expressão na internet, além de intensificar o debate político sobre a necessidade de uma nova legislação. Trata-se portanto de um momento decisivo para o futuro da internet no Brasil.
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quarta-feira, 12 de março de 2025
Moraes diz que Starlink, de Elon Musk, representa uma ameaça à soberania nacional
Por DCM: O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou na última terça-feira (11) que a Starlink, empresa do bilionário Elon Musk, representa um projeto de poder. Com informações da Folha de S.Paulo. Segundo ele, o Brasil tem conseguido manter sua soberania porque as big techs ainda dependem das antenas de telecomunicação de cada país. No entanto, com o avanço dos satélites de baixa órbita da Starlink, a empresa poderia operar sem precisar seguir a legislação nacional.
"Por enquanto nós conseguimos manter a nossa soberania. É uma questão de soberania nacional. E a nossa jurisdição. Porque as big techs necessitam das nossas antenas e dos nossos sistemas de telecomunicação. Por enquanto", declarou Moraes.
O ministro fez referência às decisões do STF que resultaram na suspensão de redes sociais, como o X (antigo Twitter), também de Musk, no ano passado, e da plataforma de vídeos Rumble, cujo bloqueio ainda está em vigor. Nessas situações, o tribunal notifica a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) para restringir o acesso às plataformas.
"Não é outros motivos quer uma das redes sociais tem como sócia uma outra empresa chamada Starlink e que pretende colocar satélites de baixa órbita no mundo todo para não precisar das antenas de nenhum país. No Brasil, hoje só há 200 mil pontos. A previsão é chegar a 30 milhões de pontos, no Brasil. E aí não adianta cortar antena", alertou Moraes.
"É um jogo de conquista de poder, sendo feito ano após ano, e, se a reação não for forte agora, vais ser muito difícil conter depois", afirmou.
O ministro também destacou os riscos para a democracia com o crescimento das big techs e a falta de regulamentação das redes sociais. "As big techs têm lado, têm posição econômica, religiosa, política, ideológica, e programam seu algoritmo para isso. Não podemos acreditar que as redes sociais caíram do céu e os algoritmos são randômicos", criticou.
Segundo ele, essas empresas ameaçam os três pilares fundamentais das democracias ocidentais: liberdade de imprensa, eleições livres e independência do Judiciário.
"Para tornar realmente poder, a partir determinado momento que já tinha solidificado essas estruturas, passou a atacar de forma extremamente organizada e competente, temos de reconhecer, não adianta subestimar, passaram a atacar os três pilares da democracia", declarou.
Diante desse cenário, o magistrado defendeu que, enquanto não houver uma regulamentação específica para responsabilizar as redes sociais, o Judiciário deve interpretar e aplicar as leias atuais aos casos que ocorrem na internet.
As declarações forma feitas durante a abertura de um curso sobre democracia e comunicação digital. O MBA, oferecido pela FGV Comunicação (Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getulio Vargas), em parceria com a AGU, teve sua aula inaugural na note desta terça-feira (11).
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terça-feira, 25 de fevereiro de 2025
Fascistas e extrema-direita no controle das Big Techs corroem a democracia, diz Moraes
Por Patrícia Faermann, no GGN: As redes sociais estão sendo controladas por grupos "fascistas e de extrema-direita" para "corroer a democracia", disse Alexandre de Moraes, em confronto direto com as tentativas da empresa do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e da plataforma Tumble entrarem com processo contra Moraes nos EUA.
Segundo o ministro, "grupos econômicos e ideologicamente fascistas, de extrema-direita" foram instrumentalizados para "corroer a democracia por dentro". "As Big techs não são enviadas de Deus", disse, na aula magna inaugural da Faculdade de Direito da USP, no histórico Largo do São Francisco, nesta segunda-feira (24).
Moraes enfrenta empresa de Trump
A fala de Moraes ocorre dias após o grupo tecnológico de Trump, Trump Media & Technology Group, e a plataforma de compartilhamento de vídeos Rumble acionarem Alexandre de Moraes em tribunal dos Estados Unidos.
Na última sexta-feira (21), o ministro da Suprema Corte brasileira ordenou a suspensão da plataforma de vídeo no Brasil até que a empresa nomeie um representante legal para responder judicialmente à legislação brasileira, acusada de propagar conteúdos ilegais e Fake News.
O caso é similar às ações do STF brasileiro contra o X do bilionário Elon Musk. Desde que o caso teve início, Musk vem usando as suas plataformas para atacar publicamente Alexandre de Moraes.
Elon Musk volta a atacar Moraes
Nesta terça (25), Musk compartilhou em suas redes sociais uma suposição de que o juiz brasileiro tenha retirado seus recursos e bens dos EUA, em meio aos processos judiciais da empresa de Trump e da Rumble.
Segundo a publicação compartilhada pelo dono do X, Moraes teria a obrigação de "comparecer pessoalmente" se for intimado na Justiça norte-americana e "se ele se recusar, corre o risco de sr julgado à revelia". Ambas informações não estão confirmadas: mesmo que tenha sido alvo das ações nos EUA, como cidadão brasileiro, Moraes não deveria precisar comparecer pessoalmente aos EUA para o processo judicial.
"Big Techs não são enviadas de Deus"
Em sua fala aos calouros no largo do São Francisco, o ministro criticou enfática e publicamente as atuações das Big Techs.
"As Big Techs não são enviadas de Deus, não são neutras. São grupos econômicos que querem dominar a economia e a política mundial, ignorando fronteiras, as soberanias nacionais, as legislações, para conseguir lucro", disse.
Ainda, enfatizou o ministro, o Brasil vive o retorno do "discurso do 'tio do churrasco', que estimula a visão de mundo preconceituosa e ressentida, de "pessoas que ficaram com rancor pela universlização de direitos e pela excessiva concentração de renda".
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sexta-feira, 24 de janeiro de 2025
Zuckerberg sinaliza que big techs querem governar a política mundial
Por Roseli Fígaro, em Correio Braziliense: Depois da controvertida participação do X na campanha eleitoral dos Estados Unidos da América (EUA), que acabou por eleger Donald Trump, Elon Musk vai assumir um cargo no governo para sanear a estrutura do Estado. Juntou-se a ele o CEO da Meta, Mark Zuckerberg, cujas declarações atacam as ações dos EUA, dos países latino-americanos e da União Europeia em busca da regulação das redes sociais.
Zuckerberg classificou a moderação de conteúdo, mesmo a autorregulação, de "censura e ataque à liberdade de expressão". Ao usar o termo liberdade de expressão, dá o recado para os ingênuos que vinham atestando o papel de bom mocismo dos empresários e financistas das empresas de redes sociais digitais, as usualmente chamadas de big techs.
A ação desses empresários que controlam boa parte da produção e circulação de informações no mundo mostra uma mudança tática. As recentes declarações tanto de Zuckerberg quanto de Musk apontam para uma atitude mais direta e não dissimulada: governarão eles mesmos.
A mudança tática dessas lideranças aponta que as questões relativas à geopolítica sofrerão alterações. As medidas econômicas contra a China e a Rússia também se estenderão a todos - regiões e países - que não obedecerem aso determinantes daqueles que regerão o governo Trump, ou seja, as medidas que favoreçam diretamente as big techs. O ataque à autodeterminação e à soberania dos países fica explícito.
Dessa maneira, para que os interesses das big techs ocupem esse lugar de protagonismo nos rumos da governança global, o jornalismo e a circulação de informações devem ser cerceados. Pois a desinformação, defendida por essas empresas ao recusarem a moderação de conteúdos, é um instrumento político que combate as forças democráticas, impede o exercício dos direitos civis e o debate de ideias sem discurso de ódio. O jornalismo, de outra parte, de modo geral, trabalha para a circulação de informações devidamente apuradas e desenvolve mecanismos de moderação de conteúdos e de checagem.
E mais: a desinformação, propugnada pelas big techs que negam a moderação de conteúdos, gera resultados eleitorais que beneficiam os interesses particulares dessas corporações. As big techs alimentam-se da desinformação, da polarização, da discórdia, da quebra dos laços comunitários e, sobretudo, da perda da noção de cidadania, dos direitos civis e trabalhistas porque não querem nenhuma regulamentação para seus negócios e lucros estratosféricos, gerados graças aos dados captados dos usuários.
Mas o ataque não para aí. Estende-se, sobretudo, às camadas subalternas, às maiorias de negros(as), pobres, imigrantes, populações LGBTQIA e a todas as pessoas que cabem no quadro caracterizado pela diversidade. Ao atualizar suas políticas sobre o tipo de conteúdo que poderá ser removido dos próprios sites, as big techs, como o X e a Meta (Instagram, Tik Tok...), passam a permitir o uso de linguagem ofensiva a questões de gênero, etnia, raça, orientação sexual, entre outros direitos identitários. Ou seja, mulheres, pessoas negras, indígenas, transgêneras, não binárias, PCDs e imigrantes serão alvos fáceis para os discursos de ódio nas redes sociais sob o aval da negação de moderação de conteúdos por parte das big techs.
Ficou evidente que a questão da diversidade não interessa mais a tais empresas. Logo depois da declaração de Zucherberg, a Meta anunciou o encerramento do seu apoio a programas de diversidade e inclusão. O anúncio feito pelo CEO fortalece o movimento conservador antidireitos civis em crescimento nos EUA. A influência desses grupos é, inclusive, política, com as recentes críticas feitas por apoiadores de Donald Trump à candidatura de Kamala Harris.
A diversidade também parece não ser lucrativa para os capitalistas. Eles apostam no discurso da meritocracia para ofuscar o propósito da exclusão com base no darwinismo social e na eugenia. No qae diz respeito às redes digitais, Zuckerberg deu a largada.
Uma dica: para ajudar as pessoas a refletirem sobre todas essas questões, pesquisadores da USP preparam uma cartilha educativa produzida a partir de estudo sobre os Termos de Uso e Política de Privacidade da empresa Meta e seus produtos: Facebook, Instagram e WhatsApp. O Centro de Pesquisa em Comunicação e Trabalho (CPCT), sediado na Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA/USP), coordenou essa pesquisa intitulada Meta: se apropriar de seus dados. O caminho das informações pessoais no ambiente digital.
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domingo, 12 de janeiro de 2025
Financial Times cita Moraes e diz que Musk e Suckerberg berram e bajulam Trump por fraqueza, não força
Por Kiko Nogueira, no DCM: X e Meta estão sentadas no colo de Donald Trump não por causa de seu penteado combover. Em um artigo do Financial Times, o advogado e escritor britânico David Allen Green diz que essas empresas precisam do apoio dos EUA para combater ações regulatórias, como na União Europeia e no Brasil.
Segundo ele, as big techs "não são tão fortes e poderosas quanto seus torcedores e críticos parecem acreditar. De fato, os provedores de plataformas de mídia social americanos são fracos diante de um obstáculo específico. Pois é a fraqueza, e não a força, que explica seu comportamento recente".
Alguns trechos:
Só porque alguém quer que algo seja regulado, isso não o torna capaz de realmente ser regulado. Se algo é desagradável ou indesejável, a demanda instantânea é que algo seja feito, e que a coisa indesejada possa ser regulada para que não aconteça.
A noção de que tudo o que precisamos para tornar o mundo um lugar melhor é "mais regulamentação" está profundamente enraizada em nossa cultura. E uma coisa pela qual o clamor por regulamentação é feito são as plataformas de mídia social. Se ao menos elas fossem "mais bem reguladas", diz o sentimento popular, então vários problemas políticos e sociais seriam todos resolvidos.
Mas há dois problemas com a regulamentação de plataformas de mídia social. O primeiro vem da própria tecnologia que deu origem a esse fenômeno relativamente recente, mas agora quase onipresente. O segundo é que impor regulamentação eficaz contra plataformas relutantes exigirá ação governamental determinada e inabalável, além de vontade política - a possibilidade da qual as plataformas agora estão fazendo o que podem para evitar.
Basicamente, a mídia social é sobre a capacidade de qualquer pessoa com uma conexão de internet usar uma plataforma online para dizer qualquer coisa que quiser sobre qualquer pessoa para qualquer pessoa. Assim que o que eles querem dizer é digitado - ou gravado em vídeo e áudio - tudo o que eles precisam fazer é pressionar enter e é publicado - ou transmitido - para o mundo. (...)
Como esse balbucio constante seria regulado? Seria possível Ou seria tão fútil quanto tentar regular conversas cotidianas em casa ou na rua?
As plataformas fizeram lobby com sucesso para que a responsabilidade legal fosse incorrida somente se uma solicitação de remoção válida não fosse concedida. E, em qualquer caso, essa abordagem só funcionou quando havia causas de ação jurídica individuais preexistentes: fazia sentido em relação à difamação de um indivíduo específico identificável.
O obstáculo é a regulamentação por jurisdições fora dos EUA - principalmente na União Europeia mas também em outros lugares, como o Brasil e a China
Mas a desinformação em massa e a desinformação muitas vezes não violam nenhum direito privado dos indivíduos. A verdadeira vítima, em vez disso, é o discurso público saudável. Outro desafio foi a informação perigosa em relação à automutilação e ao suicídio. E também a promoção de atividade criminosa, como abuso infantil ou terrorismo.
Esses problemas eram gritantes e exigiam mais do que meros avisos de retirada por parte dos reclamantes. De fato, muitas vezes não haveria reclamantes cientes de tal material, apenas aqueles que buscavam consumi-lo. Vigilância constante seria necessária.
Uma maneira de lidar com isso seria as plataformas de mídia social empregarem sistemas complexos e caros. Isso seria uma imposição de custo imensa para plataformas que queriam principalmente monetizar dados e vender publicidade no verso das postagens de usuários nas mídias sociais. Mas seria uma imposição que as plataformas só aceitariam se não houvesse alternativa. (...)
Figuras impulsivas como Elon Musk, o dono do X (anteriormente Twitter), e tomadores de decisão inconsistentes como Mark Zuckerberg, da Meta, podem nos desviar do que suas empresas estão racionalmente buscando alcançar.
E houve alguns eventos que indicam que tais empresas não são tão fortes e poderosas quanto seus torcedores e críticos parecem acreditar. De fato, os provedores de plataformas de mídia social americanas são fracos diante de um obstáculo específico. Pois é a fraqueza, e não a força, que explica seu comportamento recente.
O obstáculo é a regulamentação por jurisdições fora dos EUA - principalmente na União Europeia, mas também em outros lugares, como Brasil e China. As plataformas de mídia social perceberam que não podem vencer as batalhas com governos estrangeiros e sistemas legais sozinhas. Elas não são poderosas o suficiente para resolver seus próprios problemas. Elas precisam de ajuda.
Um exemplo aqui é como X e outros interesses comerciais dirigidos por Musk passaram pelos movimentos de se opor à ordem do Supremo Tribunal Federal brasileiro para retirar material ofensivo, apenas para capitular e cumprir as obrigações impostas pelo sistema judicial brasileiro e pela lei local.
Essa fraqueza corporativa da ação estatal determinada não deveria ser surpreendente. Em qualquer batalha final, o estado prevalecerá sobre uma corporação pela simples razão de que uma corporação como pessoa jurídica só tem existência legal e direitos na medida estabelecida pela legislação. Aqueles que controlam a lei podem, se quiserem, controlar e domar qualquer corporação em sua jurisdição.
É por isso que, por exemplo, a corporação mais poderosa que o mundo tinha visto até então - a East India Company - foi sumariamente dissolvida pelo parlamento britânico em 1874. É também por isso que o Bell System de empresas de telecomunicações foi desmembrado pela lei e política antitruste dos EUA na década de 1980. As empresas podem ser muito poderosas - mas sempre há algo mais forte do qual elas dependem para reconhecimento legal.
Grandes empresas, portanto, depositam grande confiança em serem capazes de influenciar políticas públicas e legislação. Isso explica o que a Meta fez, por exemplo, com a nomeação do ex-vice-primeiro-ministro pró-europeu do Reino Unido Nick Clegg como vice-presidente de assuntos globais e comunicação. Essa foi uma boa escolha para uma empresa que busca influenciar construtivamente a formulação e implementação da política da UE.
Como demonstra a rendição de Musk e X aos tribunais brasileiros, o poder estatal provavelmente sempre vencerá as plataformas se for testado
(...) A reeleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos proporcionou à Meta uma oportunidade gloriosa de mudar a cooperação fútil com a UE para o confronto e a coerção. Se a Meta conseguisse colocar o governo dos EUA do seu lado em suas batalhas com a UE e outras jurisdições, então maximizaria suas chances de sucesso.
Em seu anúncio no Facebook desta semana sobre mudanças em várias políticas, Zuckerberg disse abertamente que queira "trabalhar com o presidente Trump para pressionar governos ao redor do mundo. Eles estão indo atrás de empresas americanas e pressionando para censurar mais. Os EUA têm as proteções constitucionais mais fortes para a liberdade de expressão no mundo... A única maneira de pressionarmos contra essa tendência global é com o apoio dos governo dos EUA."
Isso foi listado em sua declaração pré-preparada como a sexta mudança de política, mas era declarante a mais importante - pois também explicava os outros cinco pontos, que incluíam abandonar a verificação de fatos e mover a moderação de conteúdo da Califórnia para um Texas "menos tendencioso". Tudo naquela declaração foi para alinhar o Meta com os valores e prioridades da nova administração. (...)
E não é a única tática a serviço dessa estratégia comercial mais ampla. Os líderes de muitas empresas de tecnologia têm todo o interesse em promover o novo governo dos EUA e em enfraquecer a determinação na UE. Estados-membros com líderes simpáticos a Trump, como a Hungria e Itália, estão sendo cortejados igualmente para que a politica da UE possa ser enfraquecida de dentro.
Os gigantes da tecnologia estão adotando essa estratégia robusta não porque são forte - eles sabem que, como o X no Brasil, não podem enfrentar nenhum governo ou sistema legal determinado em um mercado significativo e vencer. Eles estão fazendo isso porque sabem que são fracos e que precisam de aliados. Seu modelo de negócios depende disso.
E como os modelos de negócios da maioria das plataformas de mídia social exigem engajamento acima de tudo - pois em engajamento não é possível ter mineração de dados, monetização e publicidade - realmente não importa que o engajamento seja gerado e amplificado por desinformação e fake news.
Moderação e checagem de fatos são caras. Se as plataformas de mídia social fossem obrigadas, sob pena de sanção legal, a fazer tal moderação e checagem de fatos funcionarem, então essa seria maneira comercial de avançar. Corporações internacionais tenderão a cumprir com a lei aplicável, e a despesa de conformidade é um custo de negócios.
Mas não ter tais procedimentos e políticas em vigor é muito mais barato e lucrativo. Então, se eles puderem evitar tais obrigações, eles o farão - e se o lobby "suave" não funcionar, então eles procurarão os governos para fazer coerção.
Se a Meta e X estivessem confiantes em evitar as imposições regulatórias da UE, do Brasil e de outros lugares, eles não precisariam apoiar Trump e a nova administração. O fato é de que eles estão fazendo isso aberta e sem pedir desculpas - na verdade, sem vergonha - significa que eles sabem que têm um desafio. Eles sabem que certos governos estrangeiros e sistemas legais são capazes de vencer qualquer batalha regulatória frente a frente.
Pois, como mostra a rendição de Musk e X aos tribunais brasileiros, o poder estatal provavelmente sempre vencerá as plataformas se testado. Mas essa foi uma situação externa: a regulamentação é um fenômeno contínuo, e casos judiciais emocionantes e dramáticos devem ser uma exceção.
As recentes nomeações no nível do conselho da Meta parecem que ela está se preparando para uma batalha, e uma na qual seu atual modelo comercial exige que ela derrote os objetivos de governos estrangeiros. As novas nomeações fazem muito sentido estratégico.
E se essa situação for bem interpretada, com o governo dos EUA intimidando outros estados em benefício das plataformas, essa é uma batalha e uma guerra que as empresas de tecnologia podem vencer - não por como exploram seus pontos fortes, mas por como cobriram suas fraquezas.
A questão agora é se a UE, o Brasil e outros têm determinação e estômago para o que se tronará uma disputa pública multinacional feia. (...)
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quinta-feira, 9 de janeiro de 2025
Zuckerberg e a nova etapa do capitalismo: a ditadura das big techs, por Luís Nassif
Por Luís Nassif, no GGN: As declarações de Mark Zuckerberg, da Meta, de que irá encerrar o programa "fact cheking" é uma revanche contra o Estado profundo norte-americano. Em meu livro "A Conspiração Lava Jato - o jogo político que comprometeu o futuro do país" narro em detalhes essa história. A eleição de Barack Obama definiu duas formas de atuação política na rede. De um lado, o Partido Republicano adotando o estilo Steve Bannon, com o apoio central da Fox News. A emissora criava as notícias falsas e as redes sociais se incumbiam de disseminar. A reação do Partido Democrata se deu através da militância digital.
Ambos os lados perceberam ter em mãos um instrumento para tentar influenciar a política em outros países.
A primeira tentativa de instrumentalizar as redes deu-se em torno da participação de hackers russos na campanha que elegeu Donald Trump. Um blog de pouca penetração apareceu com supostos estudos acadêmicos tentando comprovar que o alcance da campanha foi centenas de vezes maior do que se percebia.
Seu trabalho foi apresentado a diversos veículos da mídia norte-americana, e apenas um deu guarida: o Washington Post, que acabara de ser adquirido por Jeff Bezos, o dono da Amazon. A decisão do jornal foi duramente criticada pelos demais veículos, por se tratar de um trabalho direcionado e falho.
Mesmo assim, foi a brecha que precisava o Congresso para enquadrar as redes sociais. Zucherberg foi convocado a uma sessão pesada. Saiu de lá direto para o Atlantic Council, um think tank ligado ao Estado profundo norte-americano - integrado por membros do Departamento de Estado, potentados árabes, empresas com problemas de reputação e procuradores gerais de países atrasado, como foi o caso de Rodrigo Janot, do Brasil. Foi o principal estimulador da Lava Jato e dos primeiro movimentos da sociedade civil, bancados pelos bilionários do Partido Democrata, como o Viva Rio.
O Atlantic Council foi contratado para definir uma estratégia para Zuckerberg. Consistiu na tentativa de montar uma rede mundial de agências de checagem, reunidas em torno de uma associação.
Tempos depois, blogueiros independentes levantaram os dados técnicos do tal blog e constataram que era um domínio de propriedade do próprio Atlantic Council.
A intenção inicial era barrar a disseminação de notícias de esquerda. Os bilionários financiavam diversas ONGs e portais noticiosos, muitos deles com reportagens proveitosas sobre abusos a direito humanos, mas sem estabelecer vínculos com o modelo econômico e a financeirização.
Por isso, na fase inicial - quando as "primaveras" prosperavam por todos os cantos - os grandes adversários a serem combatidos eram os blogs enquadrados como de esquerda.
Os ecos desse modelo chegaram ao país. Primeiro, através de uma pesquisa de um professor da Universidade de São Paulo, Pablo Ortellado, contratado pela revista Veja - através da Agência Pública -, para um trabalho de identificação de blogs radicais. Ele colocou no mesmo nível blogs de ultradireita, conhecidos por espalhar fake news, com os principais blogs críticos da mídia. O trabalho de Ortellado foi apresentado pela Veja em um seminário para o mercado publicitário, resultando no bloqueio de publicidade para esses portais.
O próprio Ortellado teve papel dúbio nas manifestações de 2013, tornando-se uma espécie de mentor dos black blocs - o grupo violento, cujas ações visavam claramente desmoralizar os movimentos iniciais, de cunho progressista, jogando o movimento nas mãos da direita.
O passo seguinte foi montar, no Brasil, uma associação de agências de checagem, para se integrar à rede proposta pelo Atlantic Council. A rede foi constituída apenas por agências de checagem da mídia corporativa e de portais alinhados politicamente.
A primeira jogada pesada foi quando o Papa Francisco mandou um terço bento para Lula, já preso em Curitiba. Uma das agências denunciou dois portais de esquerda por fake news. Se não fosse verdade, no mínimo seria uma barriga, jamais uma fake news - a notícia falsa com intenção de promover ódio. Imediatamente bloqueados pelo Facebook. Dias depois, o próprio Papa confirmou o envio do terço e a trama se desfez.
Tempos atrás, o Congresso pressionou novamente as big techs, em uma sessão dura.
Agora, com a vitória de Trump, há a revanche de Zuckerberg, inaugurando oficialmente a nova etapa da globalização: a ditadura das big techs, como extensão do poder norte-americano.
quarta-feira, 8 de janeiro de 2025
Redes sociais buscam se tornar 'ministérios da verdade', diz Celso de Mello
Conjur: O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello defende a regulação das big techs que controlam as redes sociais, alegando que elas buscam se tornar "ministérios da verdade", em uma referência ao clássico 1984, de George Orwell. O ministro fez uma longa reflexão sobre o tema no prefácio do livro Democracia e Redes Sociais - O Desafio de Combater o Populismo Digital e Extremista, do ministro do STF Alexandre de Moraes.
O texto, com várias citações "orwellianas", defende a necessidade de uma legislação que coloque as redes sociais dentro de uma lógica de soberania digital, que é uma das camadas da soberania política do Estado brasileiro. A citação a Orwell faz menção aos "ministérios" da obra que, a partir de um lastro delineado no oficialismo, propagam mentiras para a população daquela sociedade ficcional.
"Examino, além de outros temas, questões pertinentes às "bolhas de informação", ao paradoxo da tolerância nos regimes democráticos (Karl Popper), à retórica do ódio e à 'novilíngua" do populismo extremista digital", diz Celso.
As big techs, conforme afirma o ministro no prefácio, "moldam o ecossistema digital e influenciam opiniões e comportamentos humanos por meio da disseminação de conteúdo, que inclui desde "fake news" até manipulações informativas, priorizando, algoritmicamente, o sensacionalismo, o lucro ou, eventualmente, até a intolerância ou mensagens de ódio e de desprezo à ordem democrática".
Dessa forma, a atuação das redes sociais, voltada ao lucro e partir da disseminação de conteúdos, deve ser regulada para que se crie um regime de responsabilidade compatível com o tamanho e a capilaridade dessas empresas. Ele cita como exemplos de regulação das empresas as leis aprovadas na Austrália e na União Europeia.
"Importa esclarecer, neste ponto, por necessário, que medidas destinadas a estabelecer a regulação legislativa dos serviços, dos mercados e das plataformas digitais não se confundem com censura estatal (mecanismo autoritário vedado pela Constituição da República), nem com intervenção indevida do Estado, muito menos com cerceamento à liberdade de expressão", escreve o ministro.
"Tais medidas reguladoras traduzem instrumentos legítimos e essenciais à proteção da supremacia da ordem constitucional, do postulado ético da verdade, da formação de um espaço digital seguro e de defesa da integridade plena do regime democrático."
Fio condutor do golpismo
Para o ministro, a liberdade de expressão não é um direito absoluto e, conforme a Carta brasileira, cabe aos Estado coibir a intolerância, seja esta por meio de incentivo a golpes ou por violências contra segmentos da sociedade (racismo, homofobia etc). "O discurso de ódio, que propaga preconceito e discriminação, não tem nem merece a proteção constitucional da liberdade de expressão", diz.
Celso de Mello cita ainda a intentona golpista de 8 de janeiro de 2023, que completa dois anos nesta quarta-feira (8/1), como exemplo de que, sem controle, as plataformas se tornam fios condutores de movimentos antidemocráticos.
"No autoritarismo digital, a liderança populista desconhece os limites impostos pela Constituição e pelas leis do Estado, ignora as instituições e a soberania nacional, suprime o espaço de dissenso e somente se submete à sua própria regulação."
Clique aqui para ler a íntegra do prefácio
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sábado, 12 de outubro de 2024
É só o começo: big techs já sabem onde querem chegar com as IAs
Por Thiago Morais, no Olhar Digital: As principais big techs já começaram a direcionar esforços e investimentos para o desenvolvimento de agentes de IA, uma nova geração de sistemas que promete revolucionar a automação de tarefas complexas. Microsoft, Google, Anthropic e OpenAI esgtão na vanguarda dessa tendência, que pode transformar radicalmente a interação com a tecnologia nos próximos anos.
Diferentemente dos bots e assistentes virtuais tradicionais, que seguem comandos pré-programados, os agentes de IA são projetados para tomar decisões dinâmicas, aprender com feedback e se adaptar a situações imprevistas. Essa capacidade os torna potencialmente mais versáteis e eficientes em uma ampla gama de aplicações, desde atendimento ao cliente até análise de dados complexos.
A Microsoft já introduziu "Copilots" em seus produtos, visando automatizar tarefas administrativas e de atendimento ao cliente. O Google, por meio de sua divisão DeepMind, está explorando simulações avançadas para treinar esses agentes. Já a OpenMind considera o desenvolvimento de agentes como um passo crucial em direção à criação de inteligência artificial de nível humano.
Agentes de IA: Investimentos altos na nova tecnologia
O interesse nessa tecnologia não se limita apenas às grandes corporações. No últimos 12 messes, startups focadas em agentes de IA receberam mais de US$ 8 bilhões em investimentos, um aumento de 81,4% em relação ao ano anterior, segundo dados da PitchBook.
No entanto, apesar do otimismo, os agentes de IA ainda enfrentam desafios significativos. Demonstrações recentes revelaram falhas ao lidar com tarefas multietapas e cenários imprevistos. Além disso, o alto consumo de energia computacional torna esses sistemas custosos para operar em larga escala.
Preocupações éticas e de segurança também surgem, especialmente em relação ao potencial uso indevido dessa tecnologia para fins de spam ou engano. Um exemplo disso foi uma demonstração da OpenAI em que um agente de IA fez uma ligação telefônica sem se identificar como inteligência artificial, levantando questões sobre transparência e consentimento.
Apesar dos obstáculos, as empresas de tecnologia veem nos agentes de IA uma oportunidade de monetizar seus dispendiosos modelos de inteligência artificial. A expectativa é que, até 2025, essas tecnologias estejam amplamente implementadas em ambientes corporativos, assumindo tarefas de baixo risco e potencialmente liberando tempo humano para atividades mais criativas e estratégicas.
Edição: Bruno Capozzi
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sexta-feira, 7 de junho de 2024
STF assina acordo com redes sociais para combater a desinformação
sábado, 18 de maio de 2024
Quem tem medo da regulamentação das redes sociais
Por Araré Carvalho, no Congresso em Foco: A partir de 2018, as busca por votos ganhou um novo ingrediente que mudou o comportamento de políticos/candidatos e da população/eleitores: o surgimento das fake news, impulsionadas pelas gigantes da tecnologia, assumiu um papel central na busca pelo poder. Hoje, boa parte dos políticos investe mais tempo e recursos na disseminação de ódio, preconceito e notícias falsas do que em pensar e elaborar soluções para os problemas reais da sociedade. Além da verdade, a democracia também é afetada, pois, neste cenário de disseminação de desinformações, o principal interesse de parte dos políticos é o apoio e o engajamento que conseguem nas redes sociais, e não o debate público baseado em evidências e estudos.
A tragédia ambiental no Rio Grande do Sul é o mais recente palco de proliferação de fake news. E, pasmem, os maiores divulgadores dessas informações falsas são os políticos! Um levantamento feito pelo O Globo identificou "ao menos vinte notícias falsas diferentes que circularam durante esse período, potencializadas por políticos. Apenas as postagens originais tiveram 13,46 milhões de visualizações, segundo dados públicos das plataformas.".
Recentemente, tanto Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, quanto Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados, apontaram a necessidade de regulamentar as redes sociais. Lira anunciou a criação de um grupo de trabalho para debater a regulação das redes sociais. O objetivo deste grupo é elaborar um texto para ser votado no Plenário, já que o PL 2630/20, de autoria do Deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), acabou estigmatizado nas redes sociais como o "PL da censura", o que prejudicou sua apreciação pela Câmara.
Mas quem tem medo da regulamentação das redes sociais? Justamente aqueles que capitalizam votos e apoio nas redes sociais como a divulgação de mentiras. "Ah, mas fake news sempre existiram na politica!" Sim, isso é verdade, mas na quantidade e o alcance atual só foram possíveis porque a internet é o espaço ideal para a proliferação dessas notícias. A internet, essa ágora, esse espaço polifônico onde todos se manifestam - o que é muito interessante, diga-se de passagem - serviu para o surgimento e estabelecimento de mitos conspiratórios, concretizados na política do "nós contra eles". Esses mitos reforçam no imaginário das pessoas uma luta patriótica, religiosa e moral contra a liberdade nos costumes, o comunismo e tudo o que ameaça a sociedade e a família.
E por que os políticos figuram entre os maiores criadores ou disseminadores de notícias falsas? A disseminação de notícias falsas pode beneficiar os políticos de várias formas: influenciando a opinião pública, manipulando e sequestrando o debate político e consolidando seu poder junto a um espectro ideológico.
Além de pautar o debate público e manipular a opinião pública, elas contribuem para desacreditar adversários, gerando dúvidas sobre suas intenções e capacidades. As notícias falsas são usadas para mobilizar a população, pois provocam emoções como raiva, ódio e/ou indignação. Essas emoções ajudam no engajamento em torno de um político, partido ou causa de maneira mais fervorosa.
Não raramente, fake news são usadas para tirar o foco de problemas reais, desviando a atenção de questões importantes e criando uma cortina de fumaça.
A força das fake news é tamanha que elas têm o poder de definir e pautar a discussão pública, moldando o debate político de acordo com os interesses de quem as produz. Isso gera engajamento e visibilidade para os políticos nas redes sociais. Conteúdos sensacionalistas, textos falsos e conspiratórios, imagens geradas por inteligência artificial são privilegiados pelos algoritmos das redes sociais, pois mantêm os usuários navegando por mais tempo.
O efeito mais perverso, no entanto, é a capacidade que as fake news têm de solapar as instituições democráticas como o Judiciário, o sistema eleitoral, os meios de comunicação de massa e instâncias governamentais. Políticos que se beneficiam dessa desconfiança geralmente se apresentam como as únicas fontes de verdade.
Diante desse cenário, é urgente que a sociedade e os legisladores tomem medidas concretas para enfrentar a proliferação de fake news. A regulamentação dessas plataformas não deve ser vista como censura, mas como uma forma de garantir um ambiente democrático onde o debate público seja baseado em fatos, estudos, dados, pesquisas, enfim, em evidências.
A democracia depende da verdade e do diálogo entre diferentes pontos de vista. Sem esses pilares, corremos o risco de transformar a esfera pública em um campo de batalha onde a desinformação reina e a intolerância se fortalece. E neste cenário corremos o risco de eleger este ano, prefeitos e vereadores que fica lutando contra problemas imaginários e não sabem lidar com problemas reais quando eles surgem. A tragédia do Sul tá mostrando como isso é perverso para a população.
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quinta-feira, 11 de abril de 2024
Arthur Lira matou o PL das fake news
Por Tatiana Dias, no Intercept/Brasil: O PL das fake news está morto. Na tarde de terça, 9, o presidente da Câmara, Arthur Lira, anunciou a morte do PL 2630, o PL das fake news. Depois de quatro anos de discussões, audiências públicas e um lobby pesado das big techs, o projeto, até então relatado por Orlando Silva, do PC do B paulista, será enterrado.
No lugar, Lira propôs a criação de um grupo de trabalho com lideranças para discutir um novo projeto - um truque conhecido quando se quer enterrar uma ideia. Ele culpa a "falta de consenso" e a "polemização" na discussão do PL 2630. Sua ideia é discutir o novo projeto até julho, com apoio do governo federal.
Os próximos meses serão cruciais. Quem discutirá o projeto? Qual será a influência das grandes empresas de tecnologia? Por que o governo Lula, que tem tantas frentes para discutir políticas digitais, apoiou essa decisão?
São muitas as perguntas, e há muito a ser revelado nessa decisão abrupta do presidente da Câmara. Nós já mostramos aqui no Intercept Brasil o quanto a imprensa no país é contaminada com dinheiro das gigantes de tecnologia. O jornalismo independente será crucial nos próximos meses.
Lira simplesmente jogou fora os quatro anos de discussão do PL das fake news, que foi profundamente debatido e modificado para tentar abarcar os diferentes interesses envolvidos no tema. O texto sofreu várias modificações, e seus pontos mais "polêmicos", para usar a palavra de Lira, já haviam sido suprimidos. Mas Lira acha que seu grupo de trabalho vai criar, em 40 dias, um texto "mais maduro".
A decisão pegou todo mundo que acompanha o projeto de surpresa. "Nos parece que, nessa queda de braços, a extrema direita munida com os argumentos das empresas acabou vencendo", me disse Bruna Martins, gerente de campanhas global na Digital Action e membro da Coalizão Direitos na Rede, que acompanha o tema desde o princípio. A Coalizão, que reúne dezenas de organizações de dfesa de direitos digitais, soltou uma nota sobre o tema.
O Intercept é uma das principais vozes fiscalizando as Big Techs e sua aliança como o bolsonarismo. Sem o jornalismo independente, tudo pode acontecer neste ano eleitoral. (...)
Para piorar, o presidente da Câmara ainda quer misturar outro assunto, a regulação da inteligência artificial, que está sendo discutida no Senado. Sua ideia é alinhar os debates "sem as disputas políticas e ideológicas que estão em torno do 2630".
Não está claro o que Lira considera "disputa ideológica". As discussões do PL das fake news giravam em torno, por exemplo, da responsabilidade civil das empresas por conteúdos patrocinados ou monetizados - ou seja, se elas estão lucrando com conteúdos criminosos -, e punição em relação a conteúdos que violem o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Não vejo muita polêmica nessas questões.
A briga, mesmo, era porque as big techs sabiam que ia doer no bolso. E justamente fizeram um lobby pesado, que incluiu anúncios alarmistas em jornais, ecoando o discurso de bolsonaristas do naipe de Eduardo Bolsonaro e Gustavo Gayer.
Esse esforço engavetou o PL em duas tentativas de votação, em 2022 e 2023. No ano passado, o próprio Lira se mostrou surpreso: disse que as big techs fizeram "o horror" com a Câmara e operaram paara "colocar o Congresso de joelhos". Sugeriu, até, entrar com uma ação contra elas. "É como se tivessem impedido o funcionamento de um poder", disse.
Só que a gente não caiu nesse discursinho surpreso do Lira. A gente sabe que ele pende para o lado que for mais conveniente. E já contamos aqui que ele próprio já havia sido premiado pela bancada das big techs - que morreu, mas segue operando nos bastidores -, sentou à mesa e posou para fotos com representantes das empresa de teconologia.
Agora, o tema ferveu essa semana após Elon Musk peitar as decisões judiciais do ministro Alexandre de Moraes de suspender contas de notórios golpistas no X. De acordo com o Marco Civil da Internet, as empresas de internet são obrigadas a remover conteúdo após uma ordem judicial.
Em uma sequência insana de tuítes, Musk atacou o magistrado brasileiro e espalhou fake news e teorias conspiratórias, enquanto era aplaudido como paladino da liberdade de expressão pela direita brasileira. Quem lê o Intercept sabe: não tem nada de ideologia ali, É interesse em desestabilizar nosso país para beneficiar seus negócios.
No meio disso tudo, muita gente começou a defender que Arthur Lira finalmente pautasse o PL 2630 - inclusive o relator do projeto, Orlando Silva. "As big techs se arrogam poderes imperiais. Descumprir ordem judicial, como ameaça Musk, é ferir a soberania do Brasil. Isso não será tolerado!", ele tuitou na segunda.
No dai seguinte, foi surpreendido com a decisão de Lira de atropelar o PL 2630. Publicou uma mensagem agradecendo o apoio nos últimos anos, em tom resignado. Os próximos meses prometem.
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Ataque de Musk à soberania brasileira evidencia interesses econômicos
Conjur: Não é de hoje que grandes empresários como Elon Musk tentam influenciar políticas internas de países para proteger ou alavancar seus negócios.
Em tempos de discussão sobre a regulação de big techs, a última cartada do empresário foi atacar Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do Supremo Tribunal Federal, para impulsionar o argumento de que a atuação do Judiciário e a regulação das plataformas fará com que o Brasil se torne uma ditadura.Ao mirar em Alexandre, Musk escolheu um alvo tanto fácil quanto difícil. De um lado, qualquer crítica ao ministro é amplificada por quem acredita que decisões do TSE para conter notícias falsas durante as eleições de 2022 foram proferidas com o objetivo de eleger Lula. De outro, no entanto, a experiência mostra que as tentativas de emparedar o ministro não renderam bons frutos.