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terça-feira, 29 de novembro de 2016

Olhando para o próprio umbigo, mas ‘nem tanto’

Quero crer que a maioria dos brasileiros amam a sua  Pátria e seus semelhantes. E almejam para o Brasil uma agenda progressista, que tenha como objetivo o bem estar geral da população. Mas enquanto o egoísmo, a ganância e o preconceito subjugarem os sentimentos de solidariedade, igualdade e fraternidade não chegaremos a lugar nenhum. Regra universal, que deveria estar presente no cotidiano de todos nós.

Brasil: o País do “nem tanto”


Por Julio Gavinho, no Bem Paraná

No Brasil ninguém se assume de direita, mas somos quase todos de centro esquerda. Aqueles educados que se assumem de esquerda, acrescentam o "mas nem tanto." Queremos construir um país de estrutura moral sólida, curtindo as leis à risca, "mas nem tanto”.
 
Desejamos e protestamos pela prisão dos que tungam o erário porém assistimos, ansiosos pela novela, o massacre diário nas favelas do Rio. Vamos as passeatas, gritamos e dançamos juntos por um país melhor; desejamos uma revolução, "mas nem tanto." Queremos justiça na maioria das vezes, mas furamos a fila do supermercado, estacionamos em local reservado para idoso ou deficiente físico sem pudor e vivemos no país do Gerson, aquele que leva vantagem em tudo.

Não observamos que a corrupção se dá em níveis menores, todos os dias e não só nos grandes escalões, na operação lava-jato ou no mensalão da vida. Quando deixamos de emitir ou pedir uma nota fiscal estamos agindo a favor da corrupção. Quando falsificamos a carteirinha de estudante ou quando compramos produtos falsificados também. Furando fila, não denunciando o gato do vizinho para roubar energia elétrica ou TV a cabo, quando tentamos subornar o guarda para evitar uma multa de trânsito ou circulamos nossos pontos na carta de motorista da prima que sequer dirige, estamos voluntariamente contribuindo para um País pior, com menos qualidade de vida e respeito em todos os níveis.
 
Veja, estamos chocados com a tragédia da barragem em Minas, mas nem tanto. É incrível a posição de refugiados da população da grande Mariana. Embora vítimas do maior desastre ambiental da história do Brasil, os habitantes da região advogam pela volta da Samarco a plena operação, pois estão desempregados e necessitados. Os prefeitos e vereadores regurgitam os royalties reduzidos dramaticamente. Como resultado, queremos a punição exemplar a Samarco e da Vale, mas nem tanto. 

Quebrar a empresa ou impedir seu funcionamento, joga a população local na lama, se me desculpe o trocadilho enlameado. Vibramos com os novos indiciados das incontáveis operações da PF e do MPF, mas não temos a menor ideia do que vem a seguir. Nossa novela judiciária terá novos capítulos em breve, e com raras exceções, continuamos apaixonados pelos mesmos personagens tal qual um “Show de Truman” às avessas, com uns poucos controlando o destino de todos nós, sem que ao menos percebamos. Se não viu o filme, eu recomendo. Quem é o suplente do Dudu Cunha? Porque o Paulo Roberto devolveu sua lustrosa tornozeleira? Quem vai administrar o espaço comprimido entre o Oiapoque e o Arrio do Chuí?

Queremos mudar o Brasil, mas nem tanto. Não queremos sujar as mãos da tinta eleitoral, como se abstenção lhe garantisse um alvará de soltura prévio pelo crime de omissão à pátria que você acaba de cometer. Queremos mudar o Brasil, mas nem tanto. Por favor ponha o despertador para amanhã cedo e acorde, brasileirinho.
 
Vivemos em uma democracia monetarista: se você tem bastante do vil metal, tem escola boa, tem plano de saúde, tem segurança privada e carro blindado, escolhe não votar por que nenhum candidato lhe representa, certo? Entendi. Mas se por outro lado, se você não tem suficiente din-din para estudar, cuidar da saúde família, sofre com o genocídio diário das periferias e seu Mercedes é aquele de 78 lugares, você vota porque é sua obrigação. E vota naquele que comunica com você, amém irmão? Entendeu ou quer que eu desenhe?
 
Precisamos atentar mais e mais para a agenda política de cada um de nós como indivíduos, alternando nossos post diários nas redes sociais com e-mails para nossos representantes. Sim, representantes. Aquele em quem você votou da última vez, lembra? Você tem esta obrigação com seu voto. Aquele que vota ou se manifesta sem agenda política, está a serviço da agenda política de alguém.

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domingo, 30 de outubro de 2016

Lava jato x ‘times mistos’ dos corruptos: vai dar WO?

No enfrentamento à corrupção, a equipe da Operação Lava jato composta pelo intrépido juiz Sérgio Moro e os destemidos promotores federais, vem obtendo vitórias expressivas com goleadas homéricas. Por outro lado, os adversários com vários “times mistos” compostos por corruptos do poder público e privado, são golpeados sucessivamente por humilhantes derrotas.

Em uma comparação grotesca com o futebol, o time “Moro-promotores federais” representa a equipe do Palmeiras. Líder do Campeonato Brasileiro 2016, o Verdão paulista abriu diferença expressiva para os demais competidores. Faltando poucas rodadas para o término da competição, dizem os especialistas na arte do futebol que dificilmente o time do Palestra Itália deixa de conquistar o título de campeão. 

Porém, no mundo dos esportes coletivos, assim como no futebol, sempre existiram fatores inusitados e o surgimento de fatos novos que influenciam no resultado final de qualquer competição. De uma hora pra outra, a realidade pode mudar. Àquele que está acima dos outros, de repente pode cair. O time que tinha o favoritismo para vencer os demais competidores, de repente já não o tem mais.     

No comparativo que se tenta estabelecer, o embate “Moro-promotores federais” x “times mistos” dos corruptos isto está prestes a acontecer. E, certamente mudará todo o cenário, que tem como pano de fundo do espetáculo, o sistema político-midiático brasileiro. Até agora ninguém tinha conhecimento de um fato importantíssimo, até então mantido em obsequioso sigilo. Confirmando rumores, foi revelado recentemente que fazem parte de um dos “times mistos” dos corruptos, outros elementos pertencentes ao poder público. Leia-se políticos de alta envergadura, tidos como baluartes da ética e da moral. 

São os “craques” contratados diretamente do PSDB, que atuavam discretamente em um dos “times mistos” dos corruptos. Até então, sabia-se da participação efetiva nos “times mistos” somente elementos filiados à outras diversas agremiações políticas. Exclusivamente do PT e PP, jogadores que mereciam especial atenção e cuidado por parte dos representantes do time “Moro-promotores federais”. 

Com o “brilho” repentino dos “craques” do PSDB, este time vinha correndo por fora. Doravante, revela-se um dos principais concorrentes anular a vantagem da equipe em evidente liderança no embate. Os espectadores e telespectadores já a denominavam “os paladinos invencíveis”. Nas derradeiras disputas, “Moro-promotores federais”  podem bater de frente com o time dos “craques” do PSDB. 

Será que irão encarar de igual pra igual? Ou haverá apelação com WO, para não ficar mal perante a opinião pública? Afinal, eles sabem que esse time dos referidos “craques” sempre tiveram um Coringa na manga. Contam há muito tempo, com o suporte incondicional e disfarçado da grande mídia, que tem o poder de fazer a cabeça da torcida, por interesse exclusivo em levar vantagem em tudo. Façam suas apostas.



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sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Onde foram parar as multidões com camisetas da CBF?


Por Fábio Flora, Pasmatório – Via Pragmatismo Político – "Como impressiona o sumiço das multidões que, há alguns meses, saíam às ruas com camiseta amarela exigindo mais saúde e educação. Como impressiona o silêncio dos vizinhos que, há apenas alguns meses, iam às janelas bater panelas exigindo o fim da corrupção."



"Quem conta a história é o professor Clóvis de Barros Filho. Tinha levado a família inteira para almoçar fora. Comemorava a aprovação num concurso. Terminada a refeição, ele comentou com o garçom que achara a conta alta. Ouviu em troca: é mais do que eu tiro no mês. Provocado pela revelação, lançou então uma pergunta ao jovem: te parece justo que alguém gaste no almoço mais do que você tira no mês?

O funcionário respondeu que sim. Afinal, quem tinha estudado muito e se preparado tanto merecia ganhar mais do que alguém como ele, que não tinha podido frequentar uma escola. Clóvis não se satisfez: e te parece justo que uns possam frequentar uma escola e outros não? O rapaz devolveu: sim, eu vim do Nordeste para trabalhar, tinha que ajudar meus pais. O mestre insistiu: e te parece justo que alguns tenham que se deslocar de onde nasceram para conseguir trabalho?

Sim. E sim. E mais um sim. E assim foram trezentos te-parece-justos e trezentos sins. Até o sujeito levantar as mãos para o céu e agradecer a Deus o fato de o patrão dividir com ele e os outros empregados a carne que sobrava (quando sobrava) para que pudessem fazer um churrasquinho ao final do expediente.

Impressiona a resignação.

Como impressiona o sumiço das multidões que, há apenas alguns meses, saíam às ruas com a camisa amarela exigindo mais saúde e educação. Como impressiona o silêncio dos vizinhos que, há apenas alguns meses, iam às janelas bater panelas exigindo o fim da corrupção. Como impressiona – talvez o que mais impressiona – a aparente indiferença (aprovação?) das pessoas em relação ao presente e ao futuro do país.

A aparente cadeia de sins em que a maioria se acorrenta – como aquele garçom – sem oferecer resistência.

Há quem diga que eu ando pessimista demais. Que o momento é de esperança, já que a sociedade, ao afastar “aquele partido” de centenas de prefeituras e não reeleger vereador o filho do “comandante máximo da organização criminosa”, deu mostras de que não tolera mais corrupção e mau uso do dinheiro público.

Será? Não vejo essa intolerância toda (nem consigo ser otimista) quando constato que os dois partidos recordistas de barrados pela Lei da Ficha Limpa saíram ainda mais fortes das urnas. O PMDB [que dá as cartas no Congresso Nacional] – sócio com cadeira cativa na roubalheira nacional desde que meu tataravô batia ponto na porta da Colombo – continua a ser a legenda com mais prefeitos; já o PSDB – que pretende revolucionar a educação brasileira fechando escolas e superfaturando merenda – foi a que mais cresceu.

Há quem diga também que, agora que o impeachment passou e o período eleitoral está terminando, o presidente temerário poderá fazer as reformas de que o país tanto precisa, a começar pela lei que fixa um teto para os gastos públicos. Pasmem: tem gente toda alegrinha porque testemunhou deputados trabalhando em plena segunda-feira, até altas horas, a fim de aprovar a tal PEC 241. Estaria aí a prova de que, pelo bem do Brasil, Congresso e Planalto voltaram a se entender.

Posso lhes contar uma coisa, fofildos? Voltaram a se entender (leia-se: negociar cargos e vantagens) para congelar investimentos em saúde e educação por vinte anos, causando um baita prejuízo aos que mais carecem dos serviços públicos. Querem repassar a conta da crise apenas para a parcela mais vulnerável da população. Enquanto isso, nossos trumps e suas megafortunas – que proporcionalmente sempre foram menos taxados por estas bandas – se safam mais uma vez, protegidos pelos legisladores que eles mesmos ajudaram a eleger com suas doações de campanha.

Como nada é tão ruim que não possa piorar, amiguitos chegam a corroborar o neopentecostalismo de coalização que paira sobre nossa titubeante democracia ao rogarem a Deus que o pai do Michelzinho conclua, até o fim de seu mandato, a reforma da Previdência e a trabalhista. Dizem que só com a modernização de nossas leis – antigas e tão fascistas quanto um Mussolini, segundo eles – os empresários retomarão a confiança, a economia voltará a crescer e os pais de família recuperarão seus empregos.

Cá entre nós, estou tentando entender não só de onde vem tanta compaixão pelos senhores de engenho, essas vítimas da ditadura do proletariado, como também de que maneira cortar direitos – no lugar de investir em infraestrutura, qualificar a mão de obra e estimular o consumo – vai transformar recessão em retomada.

No caso das reformas, de novo são os mais pobres e a classe média – só eles, amores – os escolhidos para o abate. O que se planeja é um cenário que rivaliza com a mais cruel distopia: homens e mulheres trabalhando até a última idade, CLT “flexibilizada” (com a terceirização das atividades-fim e a prevalência do negociado sobre o legislado) e saúde ainda mais deficiente. Tudo isso justamente quando os estudos demográficos apontam para o envelhecimento dos brasileiros, contexto em que a demanda por médicos, remédios e hospitais só tende a aumentar. É a antecipação do Apocalipse (para usar um termo bíblico, tão caro a uma parcela cada vez maior do eleitorado).

Sério: o olhar encantado diante do engajamento decorativo da primeira-dama ou a expressão apática frente aos jornais pendurados nas bancas alimenta minhas melhores teorias da conspiração; entre elas, a de que uma novela das seis cujo protagonista (Candinho) tinha como lema “Tudo que acontece de ruim na vida da gente é pra meiorá” – e cuja exibição se deu nos meses imediatamente anteriores a essas PECs e picas no povo – não pode ter sido mera coincidência."

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quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Lula comandava esquema de corrupção identificado na Lava Jato, diz procurador

Daniel Isaia – Correspondente da Agência Brasil - "O procurador da República Deltan Dallagnol afirmou hoje (14) que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva era o "comandante máximo do esquema de corrupção identificado na [Operação] Lava Jato". Dallagnol fez a declaração durante entrevista coletiva em que a força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) responsável pela operação, detalhou a denúncia que envolve Lula, a esposa dele, Marisa Letícia, e mais seis pessoas.

Procurador-Deltan Dallagnol
O ex-presidente foi denunciado à Justiça Federal por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, crimes cujas penas, somadas, podem chegar a 32 anos e seis meses de prisão.
 
Segundo os procuradores, Lula recebeu vantagens indevidas das empresas envolvidas no esquema de corrupção da Petrobras, como a compra de um apartamento tríplex em Guarujá, no litoral paulista, a reforma e decoração do imóvel, além de contratos milionários para armazenamento de bens pessoais. Essas vantagens, somadas, totalizariam mais de R$ 3,7 milhões.

Dallagnol ressaltou que a corrupção identificada nas investigações é sistêmica e envolve diversos governos e partidos. De acordo com o procurador, existe uma "propinocracia" em curso no Brasil, no qual os poderes Executivo e Legislativo trocam favores, nomeações políticas e cargos, para obter "governabilidade corrompida, perpetuação criminosa no poder e enriquecimento ilícito".

Para Dallagnhol, o sistema é bancado por cartéis de empresas que se aproveitam do esquema para garantir a assinatura de contratos milionários com o Poder Público.

Lula-Lava Jato
Segundo a denúncia do MPF, existem 14 evidências de que Lula é o chefe do esquema de corrupção. O trabalho da força-tarefa remete a outros escândalos de corrupção, como o do mensalão, esquema de pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo, no primeiro mandato de Lula na Presidência da República.

"Mesmo depois da saída de José Dirceu [ministro-chefe da Casa Civil na época, 2005] e com a troca de tesoureiros no Partido dos Trabalhadores, o esquema prosseguiu através do petrolão. Isso demonstra que havia um vértice em comum, e esse vértice é o Lula", afirmou Dallagnol.

É a primeira vez que o ex-presidente é denunciado à Justiça Federal no âmbito da Lava Jato.
A denúncia inclui também o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, e o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro, além dos ex-executivos da empreiteira Agenor Franklin Magalhães Medeiros, Paulo Roberto Valente Gordilho, Fábio Hori Yonamine e Roberto Moreira Ferreira.

A denúncia segue agora para a 13ª Vara Federal de Curitiba, para apreciação do juiz Sérgio Moro. Caso seja acatada pelo juiz, Lula, Marisa e os outros denunciados se tornarão réus na operação."

Edição: Nádia Franco
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Política: Cunha vira "estrela" de vídeo global contra a corrupção

O atual sistema politico brasileiro, continuará a produzir e facilitar as ações de  impostores e corruptos, agindo contra o bem estar geral da nação. Enquanto não acontecerem as mudanças necessárias, seguirão determinados ao único objetivo de aglutinar poder e adquirir fortuna de forma ilícita, para si próprios e seus comensais. Eduardo Cunha, é apenas um a menos no mundo maléfico da corrupção. Sai de cena, mas torna-se um exemplo histórico. Outros, ainda virão.
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sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Política: O que diferencia o caso Banestado da Operação Lava Jato?

E por falar em crimes de corrupção política e privada, lavagem de dinheiro, contas no exterior, prisões, condução coercitiva, delações premiadas, onde os principais atores sempre foram grandes grupos empresarias, e claro, políticos igualmente oportunistas e gananciosos, vamos dar um pulo ao passado recente do Brasil. 

Nesta matéria escrita e publica em 03/11/2015 pelo repórter político Henrique Beirangê, no site da revista Carta Capital, vamos perceber qual é a diferença entre o Caso de corrupção que envolveu o Banco do Estado do Paraná na década de 90 e a atual Operação Lava Jato. Por coincidência ou não, o juiz Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato também atuou no caso Banestado. 

Além disso, nos desdobramentos das investigações relativas aos dois casos, se formos atentos, iremos observar no contexto da matéria, a seletividade e parcialidade na forma de como a justiça conduziu os dois casos. Uma marca que se tornou constante no procedimento da justiça brasileira, desde longo tempo. 

Obviamente, a matéria deve ser encarada com espírito crítico de quem busca a verdade dos fatos. Porém, livre das paixões partidárias e do preconceito contra fontes alternativas de informação e da influência comumente perniciosa dos tradicionais meios de comunicação no Brasil, que não raro  e infelizmente sempre agiu de forma tendenciosa, mais confundindo do que realmente informando.



Por Henrique Beirangê

Da Carta Capital

A semente dos escândalos

O juiz Sergio Moro arbitra uma operação que investiga um extenso esquema de corrupção e evasão de divisas intermediadas por doleiros que atuam especialmente no Paraná. Uma força-tarefa é montada e procuradores da República propõem ações penais contra 631 acusados. Surgem provas contra grandes construtoras e grupos empresariais, além de políticos.

Delações premiadas e acordos de cooperação internacional são celebrados em série. Lava Jato? Não! Trata-se do escândalo do Banestado, um esquema de evasão de divisas descoberto no fim dos anos 90 e enterrado de forma acintosa na transição do governo Fernando Henrique Cardoso para o de Lula.

Ao contrário de agora, os malfeitos no banco paranaense não resultaram em longas prisões preventivas. Muitos envolvidos beneficiaram-se das prescrições e apenas personagens menores chegaram a cumprir pena.

Essas constatações tornam-se mais assustadoras quando se relembram as cifras envolvidas. As remessas ilegais para o exterior via Banestado aproximaram-se dos 134 bilhões de dólares. Ou mais de meio trilhão de reais em valor presente. Para ser exato, 520 bilhões.

De acordo com os peritos que analisaram as provas, 90% dessas remessas foram ilegais e parte tinha origem em ações criminosas. A cifra astronômica foi mapeada graças ao incansável e inicialmente solitário trabalho do procurador Celso Três, posteriormente aprofundado pelo delegado federal José Castilho. Alguém se lembra deles? Tornaram-se heróis do noticiário?

Empreiteiras, executivos, políticos e doleiros que há muito frequentam o noticiário poderiam ter sido punidos de forma exemplar há quase 20 anos. Não foram. Os indiciamentos rarearam, boa parte beneficiou-se da morosidade da Justiça e a maioria acabou impune.

Quanto à mídia, não se via o mesmo entusiasmo “investigativo” dos tempos atuais. Alberto Youssef, Marcos Valério, Toninho da Barcelona e Nelma Kodama, a doleira do dinheiro na calcinha, entre outros, tiveram seus nomes vinculados ao esquema.

Salvo raras exceções, CartaCapital entre elas, a mídia ignorou o caso. Há um motivo. Os investigadores descobriram a existência de contas CC5 em nome de meios de comunicação. Essa modalidade de conta foi criada em 1969 pelo banco para permitir a estrangeiros não residentes a movimentar dinheiro no País.

Era o caminho natural para multinacionais remeterem lucros e dividendos ou internar recursos para o financiamento de suas operações. Como dispensava autorização prévia do BC, as CC5 viraram um canal privilegiado para a evasão de divisas, sonegação de imposto e lavagem de dinheiro.

Em seu relatório, o procurador Celso Três deixa claro que possuir uma conta CC5, em tese, não configuraria crime, mas que mais de 50% dos detentores não “resistiriam a uma devassa”.  Nunca, porém, essa devassa aconteceu. A operação abafa para desmobilizar o trabalho de investigação começou em 2001. Antes, precisamos, porém, retroceder quatro anos a partir daquela data.

A identificação de operações suspeitas por meio das CC5 deu-se por acaso, durante a CPI dos Precatórios, em 1997, que apurava fraudes com títulos públicos em estados e municípios. Entre as instituições usadas para movimentar o dinheiro do esquema apareciam agências do Banestado na paranaense Foz do Iguaçu, localizada na tríplice fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina e famosa no passado por ser uma região de lavagem de dinheiro.


Das agências, os recursos ilegais seguiam para a filial do Banestado em Nova York. Informado das transações, o Ministério Público Federal recorreu ao Banco Central, à época presidido por Gustavo Loyola. Os procuradores comunicaram em detalhes ao BC as movimentações suspeitas.

Em vez de auxiliar o trabalho do Ministério Público, o Banco Central de Loyola preferiu criar dificuldades para o acesso dos procuradores às contas suspeitas. Segundo Celso Três, as informações eram encaminhadas de forma confusa, propositadamente, diz, com o intuito de atrasar as investigações. Diante dos entraves causados pelo BC, a Justiça Federal tomou uma decisão sem precedentes. Determinou a quebra de todas as contas CC5 do País.

Uma dúvida surgiu de imediato: se havia formas regulares, via Banco Central, de enviar dinheiro ao exterior, qual a razão de os correntistas optarem por essas contas especiais que não exigiam autorização prévia nem estavam sujeitas à fiscalização da autoridade monetária?

Pior: antes do alerta da CPI dos Precatórios, o BC parece nunca ter suspeitado da intensa movimentação financeira por agências de um banco estatal paranaense, secundário na estrutura do sistema financeiro. Até então, nenhum alerta foi dado pelo órgão responsável pela fiscalização dos bancos. Vamos repetir o valor movimentado: 134 bilhões de dólares.

Editada em 1992, uma carta-circular do Banco Central determinava que movimentações acima de 10 mil reais nas contas CC5 deveriam ser identificadas e fiscalizadas. Jamais, nesse período, as autoridades de investigação foram comunicadas pelo BC de qualquer transação incomum.


Com a quebra de sigilo em massa determinada pela Justiça, milhares de inquéritos foram abertos em todo o País, mas nunca houve a condenação definitiva de um político importante ou de representantes de grandes grupos econômicos. Empresas citadas conseguiram negociar com a Receita Federal o pagamento dos impostos devidos e assim encerrar os processos contra elas.
 
O Ministério Público chegou a estranhar mudanças repentinas em dados enviados pelo governo FHC. Em um primeiro relatório encaminhado para os investigadores, as remessas da TV Globo somavam o equivalente a 1,6 bilhão de reais.

Mas um novo documento, corrigido pelo Banco Central, chamou a atenção dos procuradores: o montante passou a ser de 85 milhões, uma redução de 95%. A RBS, afiliada da Globo no Rio Grande do Sul e atualmente envolvida no escândalo da Zelotes, também foi beneficiada pela “correção” do BC: a remessa caiu de 181 milhões para 102 milhões de reais.

A quebra do sigilo demonstrou que o Grupo Abril, dono da revista Veja, fez uso frequente das contas CC5. A Editora Abril, a TVA e a Abril Vídeos da Amazônia, entre outras, movimentaram um total de 60 milhões no período. O SBT, de Silvio Santos, enviou 37,8 milhões.

As mesmas construtoras acusadas de participar do esquema na Petrobras investigado pela Lava Jato estrelavam as remessas via Banestado. A Odebrecht movimentou 658 milhões de reais. A Andrade Gutierrez, 108 milhões. A OAS, 51,7 milhões. Pelas contas da Queiroz Galvão passaram 27 milhões. Camargo Corrêa, outros 161 milhões.


O sistema financeiro não escapa. O Banco Araucária, de propriedade da família Bornhausen, cujo patriarca, Jorge, era eminente figura da aliança que sustentava o governo Fernando Henrique Cardoso, teria enviado 2,3 bilhões de maneira irregular ao exterior.

Nunca foi possível saber quais dessas contas eram e quais não eram regulares. Para tanto, teria sido necessário aprofundar as investigações, o que nunca aconteceu. Ao contrário. O BC não foi o único entrave. No fim de 2001, o delegado Castilho foi aos Estados Unidos tentar quebrar as contas dos doleiros brasileiros na filial do Banestado.

O então diretor da Polícia Federal, Agílio Monteiro, determinou, porém, que Castilho voltasse ao Brasil. Apegou-se aos “altos custos das diárias” para interromper o trabalho de investigação. Valor da diária: 200 dólares.

Os agentes da equipe de Castilho perceberam o clima contra a operação e a maioria pediu para ser desligada do caso. A apuração seguiu em banho-maria até o começo de 2003, no início do governo Lula, período em que Castilho voltou a Nova York.

Naquele momento, as novas quebras de sigilo permitiram localizar um novo personagem, Anibal Contreras, guatemalteco nacionalizado norte-americano, titular da famosa conta Beacon Hill. Descobriu-se uma estrutura complexa: a Beacon Hill era uma conta-ônibus, recheada por várias subcontas cujo objetivo é esconder os verdadeiros donos do dinheiro. Sob o guarda-chuva da Beacon Hill emergiu uma subconta de nome sugestivo, a Tucano.

Em anotações feitas por doleiros e algumas siglas foram identificadas transações que sugeriam a participação do senador José Serra e do ex-diretor do Banco do Brasil, tesoureiro do PSDB e um dos artífices das privatizações no governo Fernando Henrique, Ricardo Sérgio de Oliveira. Só novas quebras de sigilo permitiriam, no entanto, comprovar as suspeitas. Adivinhe? Elas nunca aconteceram.

Castilho conseguiu acessar o que se poderia chamar de quarta camada das contas. Antes de descobrir os beneficiários finais do dinheiro, os reais titulares, o delegado acabou definitivamente afastado da investigação pelo então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Anos mais tarde, o inquérito seria arquivado.

A CPI do Banestado teve o mesmo destino melancólico. Até hoje, é a única comissão parlamentar a encerrar seus trabalhos sem um relatório final. O PT e o PSDB disputaram para ver quem enterrava primeiro e melhor os trabalhos. O petista José Mentor, relator da CPI, foi acusado de receber dinheiro de um doleiro para excluí-lo do texto final. Mentor nega.

O tucano Antero Paes de Barros, presidente, tentou proteger os próceres do partido e aliados citados na investigação. Uma conveniente briga entre Mentor e Barros marcou o encerramento da apuração no Congresso em dezembro de 2004. No ano seguinte, um novo escândalo, o “mensalão”, sepultaria de vez o interesse pelas contas ilegais no exterior.

Desde então, mudanças na legislação penal e a ampliação de acordos de cooperação internacional passaram a dificultar as tentativas de abafar esses casos. Foram criadas e aperfeiçoadas nos últimos anos as unidades de recuperação de ativos no Ministério da Justiça e no Ministério Público Federal.
Por conta dos ataques às Torres Gêmeas de Nova York em 11 de setembro de 2001, os paraísos fiscais foram pressionados a repassar informações sobre contas suspeitas. Os bancos suíços, notórios por sua permissividade, criaram mecanismos de autofiscalização para a identificação de dinheiro com origem suspeita, algo impensável há 20 anos.

No Brasil, a lei do crime organizado de 2013 foi aprimorada e a lei de lavagem de dinheiro, alterada em 2012, ampliou o cerco contra os sonegadores. Diante dessas mudanças, as investigações não finalizadas do Banestado poderiam ser exumadas? Para investigadores que atuaram no caso, a resposta é sim.

As movimentações finais no exterior dessas contas podem ter ficado ativas após a instituição dessas novas leis, o que daria vida a novos inquéritos. Dependeria da vontade do Ministério Público e da Polícia Federal.

As duas instituições têm sido, no entanto, reiteradamente conduzidas a fazer uma seleção bem específica de seus focos de interesse. Sem o apoio da mídia e setores da Justiça e do poder econômico, mexer em certos vespeiros só produz ferroadas em quem se mete a revirá-los.
O MP e a PF tentaram, a partir da apuração do Banestado, avançar nas investigações por outros caminhos. Daquele esforço derivaram operações como a Farol da Colina, Chacal, Castelo de Areia e Satiagraha.

Em todas elas, o destino foi idêntico. Em alguma instância da Justiça, os processos foram anulados. Bastaram, em geral, argumentos frágeis. A Castelo de Areia, que investigou a partir de 2009 o pagamento de propina de empreiteiras a políticos, acabou interrompida no Superior Tribunal de Justiça por supostamente basear-se em “denúncia anônima”, embora o Ministério Público tenha provado que a investigação se valeu de outros elementos.

O episódio mais notório continua a ser, no entanto, a Satiagraha. Até um falso grampo no gabinete do ministro Gilmar Mendes serviu de pretexto para melar a operação contra o banqueiro Daniel Dantas, que, aliás, operava uma das contas-ônibus no escândalo do Banestado.

Pressionado, o juiz Fausto De Sanctis viu-se obrigado a aceitar a promoção para a segunda instância. Hoje cuida de processos previdenciários. O delegado e ex-deputado Protógenes Queiroz foi perseguido e tratado como vilão. Em agosto, acabou exonerado da Polícia Federal.

Não foi muito diferente com Celso Três e José Castilho. O procurador despacha atualmente em Porto Alegre. O delegado foi transferido para Joinville, em Santa Catarina, e nunca mais chefiou uma operação.

Nenhum deles foi elevado ao pedestal como o ex-ministro do STF Joaquim Barbosa e o juiz Sergio Moro, que agora colhe as glórias negadas durante o caso Banestado. Teria o magistrado refletido sobre as diferenças entre uma e outra investigação?

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VIA

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terça-feira, 16 de agosto de 2016

Política e corrupção: ‘A roubalheira contida e a privataria liberada’

Por Geraldo Hasse*, no JornalJá - "A palavra “roubalheira” sempre esteve na boca do povo como alusão genérica a algo corriqueiro nas altas esferas do Poder, mas nunca como agora ela se tornou tão verazmente aplicável a um número expressivo de administradores públicos, empresários, executivos de estatais e parlamentares. Em seu penúltimo artigo, o comentarista político Elio Gaspari apresentou o mais recente balanço da Operação Lava Jato: 57 pessoas condenadas a 680 anos de prisão. Todas elas muito bem situadas nos altos escalões dos poderes econômico e político.

Por obra da Operação Lava Jato, iniciada em março de 2014 pelo Ministério Público Federal e a Polícia Federal, desvendou-se finalmente o esquema de corrupção que sustentava os partidos políticos e suas práticas eleitorais. Tornou-se enfim explícito o que antes se mantinha escondido sob apelidos diversos: “maracutaia”, “panamá”, “quiprocó”, “mamata” e, claro, “roubalheira”. O aspecto mais tragicômico dessa história é que o partido mais afetado pelas investigações é o PT, a sigla mais bem sucedida eleitoralmente na esfera federal no século XX. Como cabeça dos quatro últimos governos nacionais, o petismo transfigurou-se no principal culpado da roubalheira descoberta na Petrobras, a maior empresa nacional, fundada em 1953. Ainda que nenhum partido reste incólume após tamanha devassa, já está eleito o bode expiatório da temporada.

Com as evidências colhidas, mais as delações de empresários e executivos, a Justiça ficou com a faca e o queijo na mão para dar um novo conteúdo às relações entre empresas e partidos. Só lhe falta iniciativa, pois o Judiciário só opera se for acionado. Todas as investigações, processos e sentenças se concentraram até agora numa única vara do Paraná, sob o martelo do juiz Sergio Moro, a celebridade nacional do momento, tal como aconteceu com o ministro Joaquim Barbosa no final do processo do Mensalão no Supremo Tribunal Federal, que condenou à cadeia membros da cúpula do PT e de alguns partidos aliados.


Embora tenha se tornado um ícone da moralidade, Moro não é uma unanimidade. Ele tem sido criticado por: 1) procurar incriminar sobretudo o PT; 2) abusar do instituto da prisão preventiva para obter confissões dos acusados; 3) aceitar com gosto paparicações de grandes corporações da mídia e outras organizações sociais; 4) não ligar para as consequências da paralisação de contratos e obras no âmbito da Petrobras, com o que estaria favorecendo a fragilização de empresas nacionais e abrindo caminho para a desnacionalização de ativos estatais e privados. Dessa maneira, a Lava Jato seria uma nova edição da privataria tucana, agora pela via judicial (o termo privataria foi difundido por Elio Gaspari, que viu na privatização de estatais nos anos 1990 a prática da pirataria).

Hora de perguntar: quem vai herdar o país que sobrar da Lava Jato? Não há partido que possa se sobressair nessa parada. Nenhumas das 32 siglas vigentes no universo partidário brasileiro tem cacife ou envergadura para reconstruir o edifício da austeridade administrativa. A esta altura do processo, não se sabe sequer quantos partidos restarão depois que a Lava Jato chegar ao fim. A primeira prova será em outubro próximo. A menos de dois meses da corrida às urnas para eleger prefeitos e vereadores, não se ouvem os clarins da campanha eleitoral. Durma-se com um silêncio desses. Falta dinheiro para acionar as gambiarras eleitorais. A prova seguinte para a sobrevivência dos partidos será em 2018 com as eleições para presidente, governador e parlamentares.

Hora de perguntar novamente: que país resultará da limpeza em andamento por iniciativa do MPF com apoio da PF e o respaldo (algo constrangido) do STF?

Ainda é cedo para uma resposta ou até mesmo para um prognóstico calcado na esperança em algo melhor ou, pelo contrário, baseado na observação da realidade de maio para cá, quando o vice-presidente Michel Temer substituiu a presidenta Dilma, mas a mudança em curso sinaliza um retrocesso à época do presidente José Sarney (1985-1990), cujo governo foi marcado pelo fisiologismo e a mediocridade. Afinal, do PMDB não se pode esperar ousadia alguma, pois está na cara que o maior partido brasileiro está atolado em roubalheiras imemoriais."

*Geraldo Hasse é jornalista, escritor e colunista do JornaJá

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terça-feira, 2 de agosto de 2016

Lava Jato - PF deflagra Operação ‘Resta Um’: o alvo é construtora que deu R$ 10 milhões a ex-presidente do PSDB

Segundo reportagem de Ricardo Brandt, Fábio Serapião, Fausto Macedo, Julia Affonso, Mateus Coutinho e Constança Rezende para o Estadão/RIO, "a Polícia Federal deflagrou nesta terça-feira, 2, a Operação Resta Um, etapa 33 da Lava Jato. Cerca de 150 policiais cumprem 32 mandados. O alvo é a construtora Queiroz Galvão, suspeita de ter pago R$ 10 milhões ao ex-presidente do PSDB Sérgio Guerra, que morreu em 2014. Os executivos ligados à construtora Ildefonso Colares e Othon Zanoide foram presos."

"O engenheiro Ildefonso Colares Filho chegou na sede da Polícia Federal do Rio, na zona portuária, por volta das 10h30.

Sérgio Guerra-PSDB
São 23 mandados de busca e apreensão, 2 de prisão preventiva, 1 de prisão temporária e 5 de condução coercitiva em cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Goiás, Pernambuco e Minas Gerais.

Os executivos da Queiroz Galvão são investigados, segundo a PF, ‘pela prática sistemática de pagamentos indevidos a diretores e funcionários da Petrobrás’.

Na 33.ª fase da Operação da Lava Jato, são cumpridos pela Polícia Federal mandados com a finalidade de obter provas adicionais de crimes de organização criminosa, cartel, fraudes licitatórias, corrupção e lavagem de dinheiro, relacionados a contratos firmados pela empreiteira Queiroz Galvão com a Petrobrás. Os alvos são dirigentes e funcionários da Queiroz Galvão e do consórcio Quip S/A, do qual a empreiteira mencionada era acionista líder.

As investigações indicam que a Queiroz Galvão formou, com outras empresas, um cartel de empreiteiras que participou ativamente de ajustes para fraudar licitações da Petrobras. Esse cartel maximizou os lucros das empresas privadas e gerou prejuízos bilionários para a estatal. Além dos ajustes e fraude a licitações, as evidências colhidas nas investigações revelam que houve corrupção, com o pagamento de propina a funcionários da Petrobras.

Segundo a Lava Jato, executivos da Queiroz Galvão pagaram valores indevidos em favor de altos funcionários das diretorias de Serviços e de Abastecimento. Em sua parte já rastreada e comprovada, as propinas se aproximam da cifra de R$ 10 milhões. Esses crimes estão comprovados por farta prova documental que corroborou o depoimento de, pelo menos, cinco colaboradores, sendo três deles dirigentes de empreiteiras.

Para além disso, a investigação também objetiva se aprofundar sobre os fortes indícios existentes de que milhões de dólares em propinas foram transferidos em operações feitas por meio de contas secretas no exterior. As evidências apontam que os pagamentos foram feitos tanto pela Queiroz Galvão quanto pelo consórcio Quip. A hipótese tem por base depoimentos de colaboradores e comprovantes de repasses milionários feitos pelo trust Quadris, vinculado ao Quip, para diversas contas, favorecendo funcionários da Petrobras.

Por fim, as medidas deflagradas buscam colher provas adicionais do delito de obstrução à investigação de organização criminosa pela então realizada Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras, em 2009. Há indícios, que incluem a palavra de colaboradores e um vídeo, de que 10 milhões de reais em propina foram pagos pela Queiroz Galvão com o objetivo de evitar que as apurações da CPI tivessem sucesso em descobrir os crimes que já haviam sido praticados até então.


A procuradora da República Jerusa Viecili destacou a importância para a investigação dos acordos de colaboração e de leniência firmados pelo Ministério Público, “pois iluminam o caminho a percorrer para a obtenção de provas, quando não são acompanhados já pela apresentação de evidências consistentes dos crimes praticados”. Afirmou ainda que chama a atenção “a ousadia da empresa investigada, traduzida pela atuação profissional e sofisticada no pagamento de propinas em contratos públicos durante longo período de tempo, mediante a utilização de expedientes complexos de lavagem de dinheiro, inclusive no exterior”.

O Grupo Queiroz Galvão foi identificado, durante a Lava Jato, como o terceiro com maior volume de contratos celebrados com a Petrobras, alcançando um total superior a R$ 20 bilhões. O histórico de envolvimento do grupo com grandes esquemas de corrupção não é inédito, já figurado nas operações Monte Carlo, Castelo de Areia e Navalha, e tendo sido as duas últimas anuladas nos tribunais superiores. Segundo o procurador Diogo Castor, a banalização das anulações de provas representa um alento para os criminosos que já tiveram participação em esquemas criminosos provados. “Infelizmente se essas operações tivessem um mínimo de efetividade, talvez a Lava Jato nem precisasse existir” assinalou.

Já o coordenador da força-tarefa Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, ressaltou a gravidade da obstrução dos trabalhos de apuração de 2009, porque “a investigação da CPI era como um guardião da Petrobras. As evidências indicam que o ladrão roubou a casa e, em seguida, matou o vigia”. Sublinhou, ainda, na mesma linha de Castor que “a corrupção que colhemos é fruto da impunidade dos crimes passados. Esses crimes investigados hoje são filhos de um sistema de justiça criminal disfuncional, o qual falhou em punir casos pretéritos em que as mesmas empresas da Lava Jato eram investigadas” Para o procurador, “sairemos da Lava Jato sem aprender a lição se não aprovarmos reformas nesse sistema, como as 10 medidas contra a corrupção”.

“Precisamos disso para que os crimes sejam alcançados pela ação da Justiça como regra, e não como exceção”, completou o procurador."

Fonte:  http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/pf-deflagra-etapa-33-da-lava-jato/

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domingo, 31 de julho de 2016

A literatura do “golpe”: o embate político também se trava nos livros

Por Rodolfo Borges, no EL PAÍS - A maior investigação contra a corrupção da história brasileira é na verdade a base para um complexo golpe de Estado comandado nas sombras pelo mercado financeiro. Mas também pode ser o símbolo do esforço de corajosos e destemidos investigadores que começam a fazer do Brasil um país melhor. Depende do livro que você ler. E não faltam nas prateleira das livrarias tentativas de explicar o que está acontecendo no Brasil desde a reeleição da presidenta Dilma Rousseff, em 2014.


Lançado pela editora Boitempo graças à colaboração voluntária de 30 autores,Por que gritamos golpe? (2016) "representa um esforço para se entender a atual crise porque passa o Brasil e ajudar no combate ao que se convencionou chamar, dentro e fora do país, de Golpe de Estado de 2016", nas palavras de Ivana Jinkings, que assina a apresentação do livro. A obra conta com artigos de políticos e intelectuais historicamente ligados ao PT ou à esquerda, como a deputada federal Jandira Feghalli (PCdoB-RJ) e o ex-porta-voz do Governo Lula André Singer, e apresenta uma série de argumentos para criticar o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

A filósofa Marilena Chauí, por exemplo, atribui a crise do Governo petista ao sucesso propagandeado pelo próprio do partido: a ascensão de uma classe média consumidora "ideologicamente conservadora e reacionária" e exposta à "absorção ideológica pela classe dominante". Os artigos do livro são escritos em tom de desencanto com o futuro do país, que estaria condenado a retrocessos nas mãos de Michel Temer. Os textos tratam de temas variados, que vão de suspeitas sobre as origens do Movimento Brasil Livre, que encampou as maiores manifestações contra o Governo Dilma, até uma análise sobre a influência dos maiores jornais e veículos de comunicação do Brasil na crise.

Menos diversificado e mais direto ao ponto, A outra história da Lava-Jato (Geração Editorial, 2015), do jornalista Paulo Moreira Leite, pretende abordar o lado mais controverso da operação. Sob o pretexto de analisar a Lava Jato de um ponto de vista que não teria sido considerado pelo noticiário, Moreira Leite — que publicou o livro antes da abertura do processo de impeachment no início de dezembro do ano passado — conta apenas um lado da história. O jornalista não chega a acrescentar informações às polêmicas levantadas ao longo dos dois anos da investigação conduzida a partir de Curitiba, mas, apesar de destacar apenas os aspectos negativos da operação, condenando a conduta dos procuradores, é possível garimpar no livro bons argumentos para questionar a investigação — como o fato de a Lava Jato seguir em Curitiba apesar de a maioria dos crimes investigados ter ocorrido em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Outro que analisa a crise política em livro a ser lançado nas próximas semanas é o sociólogo Jessé Souza, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) no Governo Dilma e autor de A tolice da inteligência Brasileira. Em A radiografia do golpe: entenda e como e por que você foi enganado (Leya), Souza faz menção ao seu trabalho pregresso para denunciar que a elite financeira nacional articulou a derrubada do Governo Dilma ao se aproveitar do discurso da moralidade para confrontar o combate à desigualdade encampado pelos governos petistas. "Eu decidi fazer esse livro em um ato de desespero pessoal, para lidar com a minha frustração e com a minha impotência. Decidi contar o que aconteceu, porque isso não vai ser debatido em canais de tevê. Não é só o grande público que foi enganado, mas a esquerda, que está atônita e segue aprisionada pelo discurso econômico da direita", diz Souza.

Lava Jato

Se o "outro lado" se apoia no discurso da moralidade, como diz Souza, um dos exemplo mais eloquentes é Sérgio Moro - a história do homem por trás da operação que mudou o Brasil (Universo dos Livros, 2016), da jornalista Joice Hasselmann. A jornalista confunde sua própria história com a da Lava Jato e começa o livro dando mais atenção a seus sentimentos em relação à operação e aos vídeos que posta em sua página no Facebook do que propriamente às ações da polícia. Hasselmann sai do foco à medida que o livro avança — apesar de manter um intenso tom laudatório à ação que levou à cadeia dezenas de corruptos confessos e não dispensar oportunidades de criticar os governos petistas e os jornalistas que se posicionaram a favor do partido nos últimos anos —, mas não chega a entregar o que o título promete: "a história por trás da operação que mudou o Brasil".

Outro livro que esbarra na discrição do juiz responsável pelo caso é Sérgio Moro - o homem, o juiz e o Brasil, do advogado Luiz Scarpino (Novas Ideias, 2016). Mais equilibrado que a publicação assinada por Hasselmann, o livro de Scarpino destaca a importância da operação para o combate à corrupção no país, mas aborda sem posicionamentos taxativos algumas das controvérsias que rondam a Lava Jato desde seu início, como a intensa utilização de prisões preventivas pelas autoridades. O autor não vai além, contudo, do que já foi publicado no noticiário ao tentar decifrar a figura de Sérgio Moro. Nesse sentido, Lava Jato - o juiz Sergio Moro e os bastidores da operação que abalou o Brasil (Primeira Pessoa, 2016), do jornalista Vladimir Netto, é a obra que vai mais longe.

Entre os livros avaliados pelo EL PAÍS, o de Netto é a que mais acrescenta ao perfil de Moro, e ganhou ares de versão oficial quando os procuradores da Lava Jato e até o juiz compareceram ao lançamento da obra, em Curitiba. Mais do que descrever o juiz como bom aluno, que não tirou menos de 8,6 no colégio — como faz Scarpino — e o bom moço que, segundo Hasselmann, ficou conhecido como "o juiz dos velhinhos, por ajudá-los na vara presidenciária contra o INSS", Netto conta detalhes da intimidade do magistrado, como a forma como ele conheceu a mulher, Rosângela Wolff Moro — todos os perfis destacam, diga-se, o apreço do juiz por heróis de histórias em quadrinhos e seus hábitos simples e caseiros.

Com acesso direto e entrevistas exclusivas com figuras chave da Lava Jato, como o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, Netto revela bastidores da operação que já dão o tom de thriller que o diretor José Padilha deve atribuir à série baseada na Lava Jato, que o Netflix anuncia para 2017. Padilha comprou os direitos do livro, que conta como a polícia quase perdeu o rastro de Youssef no dia programado para sua prisão e expõe mensagens íntimas trocadas entre condenados pela operação. Essa é a obra mais descritiva com informações e detalhes que expõem a complexidade da Operação Lava Jato. Pode não consolar o leitor incomodado com os rumos político do país, mas ajuda a entender o que está acontecendo.

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sábado, 30 de julho de 2016

Lava Jato: Delação premiada da Odebrecht atinge todo o sistema político brasileiro

Começou oficialmente nesta sexta-feira (29), a delação premiada  de 50 executivos da Odebrecht com a Operação Lava jato, em todo o país. E atingirá cerca de 100 políticos brasileiros. Entre os alvos, estão além do ex-presidente Lula e da presidente eleita Dilma Rousseff, líderes da oposição, como senador Aécio Neves (PSDB). Ao menos 10 governadores e ex-governadores, também são citados. Dentre eles, o tucano Geraldo Alckmin (SP), Fernando Pezão e Sérgio Cabral (PMDB), do Rio.



247 - "Nas negociações de delação premiada com a Lava Jato, executivos da Odebrecht, incluindo o ex-presidente Marcelo Odebrecht, apontaram mais de cem deputados, senadores e ministros como beneficiários direto do esquema de corrupção ou por vantagens, como repasse de verbas para campanhas.

Segundo reportagem de Jailton de Carvalho, na lista, há pelo menos dez governadores e ex-governadores, incluindo o tucano Geraldo Alckmin (SP) e Fernando Pezão, do Rio (PMDB). Entre os ex-governadores, o nome de Sérgio Cabral (PMDB) também foi citado.

Os depoimentos estão previstos para começar hoje e são os mais temidos desde o início da operação. A empresa atua em contratos com administração pública dos três Poderes. Só ano passado, faturou mais de R$ 130 bilhões no Brasil e no exterior.

Segundo o colunista Merval Pereira, conjunto de delações implicará tanto o ex-presidente Lula e a presidente Dilma Rousseff, como líderes da oposição, com o senador Aécio Neves (PSDB)."

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quarta-feira, 20 de julho de 2016

Como a Suécia evita a corrupção em empresas estatais

Por Cláudia Wallin (*) para o Diário do Centro do Mundo – "O auditor sueco me ouve com aquela expressão de quem tenta medir o QI do seu interlocutor. A pergunta é – como evitar a corrupção em empresas estatais, e impedir sua utilização como pólos de transferência de recursos públicos para grupos privados bem conectados com o poder político? A resposta, ele diz, é elementar.

sede do Serviço Nacional de Auditoria da Suécia
“É para isso que servem auditorias independentes, regulares e transparentes sobre as operações das estatais. E quero dizer auditorias verdadeiramente independentes, que façam não apenas um trabalho de fiscalização, mas também de promoção da eficiência”, observa Dimitrios Ioannidis, um dos chefes responsáveis pela fiscalização das estatais da Suécia.

“Se você não faz isso, só pode ficar perplexo com os resultados. E quando descobre a magnitude do problema, vai dizer, ‘oh, isso aconteceu? Mas como isso pôde acontecer?'”

“Ora, aconteceu porque fizeram aquele mau negócio, ou tomaram aquela má decisão, ou realizaram práticas corruptas. E todas essas atividades precisam ser fiscalizadas regularmente, na medida do possível, para tentar conter tais práticas”, conclui o auditor, neste exótico país onde cargos nas empresas públicas não são rifados entre partidos políticos.

Estamos na sede do Serviço Nacional de Auditoria da Suécia (Riksrevisionen), o órgão responsável pela fiscalização das empresas públicas do país. Seus duzentos auditores vigiam com mil olhos um portfolio considerável: são 49 estatais, com valor estimado em mais de 500 bilhões de coroas suecas (cerca de 60 bilhões de dólares).

Mas no modelo sueco de controle das estatais, a mesma mão que abre a ferida também previne e cura: é um sistema que dá ênfase particular a políticas de boa governança, e não apenas ao chicote.

Os auditores do Riksrevisionen têm assim a dupla missão de produzir relatórios de fiscalização, e também de eficiência – que apontam, com regularidade, correções de curso e práticas de boa gestão para melhorar o desempenho das estatais, promover seu crescimento e evitar aberrações  evitáveis.

São as chamadas auditorias de performance. Seu objetivo primeiro não é usar a lupa para caçar deslizes – e sim colaborar para o aprimoramento da gestão das empresas públicas.

Em outras palavras, o que se quer é não ter que punir.

“Não somos um tribunal”, pontua Ioannidis, assessor especial da unidade de governança de estatais no Riksrevisionen e Ph.D no tema.

“Em essência, o que fazemos é refletir. Uma constante reflexão crítica sobre a forma como as empresas estatais estão sendo administradas. Nas auditorias de performance, trabalhamos em um nível mais estratégico, por uma questão de eficiência. De manter a casa em ordem.”

De que forma?

“Fazemos perguntas como, ‘o governo nomeou um conselho de administração relevante, e verdadeiramente profissional, para esta estatal? Os investimentos da estatal das ferrovias estão sendo planejados e organizados como devem? Os riscos estão sendo considerados com prudência?”

“Porque quando as empresas públicas têm muito dinheiro, por exemplo, muitas vezes elas se tornam pouco cuidadosas na tarefa de fazer análises sérias e contundentes sobre cálculos de risco. E estamos falando de dinheiro público. Ou seja, de dinheiro dos contribuintes, que precisam ter confiança no sistema.”

Metas definidas pelo poder político para as estatais são acompanhadas de perto.

“Por exemplo, o Parlamento disse que queria ver a (estatal sueca de energia) Vattenfall se posicionar entre as empresas líderes do mercado. Mas em nossas análises, verificamos que a Vattenfall não tinha uma estratégia satisfatória de longo prazo a fim de poder alcançar aquele objetivo, e apontamos recomendações”, conta Dimitrios Ioannidis.

Os relatórios produzidos pelo Riksrevisionen são submetidos ao Parlamento, que por sua vez envia os documentos ao governo, que tem por obrigação comentar os resultados. Se o relatório recomendar correções de curso, as autoridades têm prazo de quatro meses para informar que medidas já foram ou estão sendo tomadas a fim de aumentar a eficiência de suas operações. O comitê parlamentar responsável analisa então as medidas relatadas, e o Parlamento toma uma decisão final sobre cada caso.

A prevenção da corrupção nas empresas públicas também passou a ocupar um tempo generoso nas reflexões dos auditores suecos.

“Concluímos há alguns anos este amplo estudo sobre o risco da corrupção nas estatais”, ele diz, batendo o indicador sobre o relatório de mais de cem páginas que me entrega.

“Isto não é o resultado de uma auditoria pós-fato, que acusa – “nossas estatais estão sendo corruptas”. É um estudo feito com profundidade, e que contém recomendações sobre como estar alerta para a possibilidade de ocorrência de práticas corruptas. Trata-se de um trabalho preventivo, que tem a finalidade de assegurar que nossas estatais tenham firmes regras institucionais para evitar a corrupção”.

O relatório advertiu que a prevenção da corrupção não estava sendo entendida como prioridade para as autoridades e empresas públicas suecas. E demandou a criação de diretrizes explícitas para conscientizar o comando das estatais e afiar o controle.  

“O fato de a Suécia ser o terceiro país menos corrupto do mundo não significa que o risco da corrupção seja zero”, pondera o auditor. “E corrupção na esfera pública é prejudicial para a democracia e o Estado de Bem-Estar Social”.

Dimitrios Ioannidis

Sem Cargos Comissionados e sem Interferência Política

Não há cargos comissionados nas estatais suecas: a direção, os conselhos de administração e toda a cadeia executiva é formada por profissionais da indústria, sem vinculação partidária. O que reduz o risco de ocorrência de fraudes com a conivência de altos executivos das empresas.

“A ambição do governo sueco é que as empresas públicas sejam geridas de forma estritamente comercial, nos moldes de uma empresa privada. Os diretores e conselheiros das estatais não podem ser, portanto, políticos ou amigos de políticos. São profissionais do setor, todos eles. Têm que saber o que estão fazendo”, ressaltaIoannidis.

Nas holdings em que o Estado detém o controle acionário, em geral o governo nomeia um representante para o conselho de administração.

“Mas não é o governo que decide diretamente quem vai dirigir as estatais. A nomeação dos executivos e dos conselhos de administração é uma das mais importantes tarefas desempenhadas por uma unidade autônoma do poder executivo, que é responsável pelas estatais e que sabe que suas decisões são controladas e escrutinizadas”, acrescenta o auditor.

É particularmente interessante, no modelo sueco, o princípio chamado de “Ministerstyre”: trata-se de um código de conduta que proíbe os ministros, assim como o primeiro-ministro, de interferir nas operações das empresas estatais, assim como das agências governamentais.

Quem quebra a regra, é diligentemente reportado ao Comitê de Constituição do Parlamento (Konstitutionsutskotet, ou KU), para uma vergonhosa sabatina pública transmitida pela TV sueca. Porque a lei que protege as estatais contra a interferência política está gravada na Constituição sueca.

“A lei que rege as estatais determina de maneira clara qual é o papel do governo e qual é o papel do conselho de administração, e estabelece princípios muito claros que protegem as empresas públicas de qualquer tipo de ingerência por parte do poder”, diz o auditor.

Freios e Contrapesos

O Riksrevisionen é parte de um robusto sistema de “checks and balances”, os freios e contrapesos que fazem da Suécia um dos países menos corruptos do mundo.

“Se identificamos um mau negócio ou uma má decisão, reportamos o problema e apontamos soluções. Se identificamos uma suspeita de crime, chamamos a polícia e os promotores”, diz o auditor Dimitrios Ioannidis.

A partir da suspeita de alguma prática ilegal, o caso passa a ser investigado pela Agência Nacional Anti-Corrupção (Riksenheten mot Korruption) e pela temida Ekobrottsmyndigheten, a Autoridade para Crimes Financeiros.

A maior investigação em curso é o caso da Telia Sonera, a gigante sueco-finlandesa de telecomunicações na qual o governo sueco detém participação de 37% – e que diante da pressão pública decidiu retirar-se inteiramente dos mercados da Ásia Central, a partir de suspeitas de que teria pago suborno a autoridades de países reconhecidamente corruptos, como o Uzbequistão, a fim de obter licenças de operação naqueles mercados.

Casos como o da Telia Sonera surpreenderam um país pouco habituado a denúncias de corrupção, e que agora aperta seus controles.

Maus investimentos das estatais também estão na mira dos auditores: o Riksrevisionen fez recentemente uma ampla auditoria das práticas de cálculo de risco das estatais, diante da ocorrência de casos em que os investimentos realizados pelas empresas públicas tiveram um impacto negativo nas finanças.

O resultado foi um ácido relatório.

“O governo não está tomando medidas suficientes em suas diretrizes para garantir um eficiente cálculo de risco nas operações das empresas estatais, levando-se em consideração a importância destas empresas para as finanças públicas”, diz o relatório.

Na sequência, os auditores listam uma série de recomendações a serem implementadas. Uma delas é a introdução de critérios rigorosos para a realização das análises de risco, a serem seguidos pelos conselhos de administração das estatais. Outra é a exigência de que os conselhos de administração informem o Parlamento, com regularidade, sobre os riscos envolvidos em atividades que possam afetar o valor das empresas e futuros dividendos para o Estado.

“Fazemos recomendações tanto às empresas como ao governo, ou ao Parlamento. Como por exemplo, sugerindo a complementação de uma lei. Desta maneira, podemos ser parte de um processo de aprimoramento das estatais”, diz o auditor.

Os critérios de supervisão das estatais são os mesmos aplicados às empresas privadas. Como é de praxe, todas passam por auditorias internas e também externas, estas conduzidas por grandes empresas internacionais como a PricewaterhouseCoopers e a Ernst & Young – que já foram alvo, aliás, de vários processos por barbeiragens. Em 2001, o escândalo contábil da distribuidora de energia americana Enron chegou a levar a gigante Arthur Andersen à falência.

Os auditores independentes do Sistema Nacional de Auditoria da Suécia completam, assim, o ciclo da fiscalização financeira das empresas públicas. E cobram resultados:

“Normalmente, dois anos depois de termos auditado uma estatal e identificado problemas, voltamos a fazer uma nova auditoria para averiguar: a empresa adotou as correções de curso recomendadas? Melhorou suas rotinas de gestão? Em seguida, publicamos o resultado na internet.’

Independência e Transparência

A independência dos auditores do Riksrevisionen é a pedra angular do sistema.

“Somos um órgão independente, que fiscaliza não só as estatais como toda a cadeia do poder executivo, e que responde ao Parlamento com o objetivo de fortalecer os princípios democráticos”, diz Dimitrios Ioannidis.

Não era assim: há pouco mais de uma década, tanto o Parlamento como o governo tinham seus próprios órgãos de auditoria, que fiscalizavam as empresas públicas e agências governamentais.

“Houve então um grande debate, e concluímos que aquele não era um sistema verdadeiramente independente de fiscalização. Porque um auditor do Parlamento, por exemplo, tinha o poder de iniciar investigações que podiam atender apenas aos interesses dos membros do Parlamento. Foi então que decidimos criar o Riksrevisionen, em 2003, como um órgão essencialmente independente. Porque até governos precisam ser supervisionados, e a supervisão deve ser imparcial”, aponta Ioannidis.

A independência do Riksrevisionen é garantida pela Constituição sueca. Os três auditores-gerais que comandam o Serviço Nacional de Auditoria são nomeados pela Comissão de Constituição do Parlamento, cumprem mandatos de sete anos de duração e não podem ser re-eleitos.

“Pode-se presumir que ter três auditores-gerais no comando, em vez de apenas um, tem o potencial de reduzir eventuais interferências externas. E são três auditores-gerais que não podem ser facilmente destituídos, e que têm independência para fiscalizar”, observa o auditor.

E destaca: a transparência é o elo fundamental que rege todo o sistema sueco.

“E quando falo em transparência, quero dizer uma transparência ampla e funcional, que garanta acesso irrestrito a informações e documentos. Para que tanto o Parlamento como os cidadãos tenham informações efetivas sobre o que acontece dentro das estatais.”

Os auditores atuam como uma espécie de farol para os contribuintes, no revolto mar de balanços e balancetes produzidos por cada autoridade pública. Seus veredictos sobre a atuação de cada órgão são publicados regularmente na internet, fortalecendo assim o controle social.

“Sem dúvida. Os cidadãos podem acompanhar o que se passa nas estatais, a mídia pode reportar sobre a situação das empresas com dados fundamentados. O governo também responde aos nossos relatórios, e faz comentários. Às vezes o governo discorda de alguma recomendação, e faz uma argumentação contrária. Dá-se então um diálogo público, que é a forma saudável de comunicação quando se trata de interesses públicos”, diz  Ioannidis.

Os auditores do Riksrevisionen se debruçam agora sobre um vasto projeto de análise comparativa sobre as práticas e o desempenho de todas as 49 estatais suecas, incluindo oito sociedades de economia mista.

“A regra número um para fiscalizar as estatais são as regras da lei. Leis são feitas para serem cumpridas. E em nossa Constituição, a Lei do Orçamento manda que o patrimônio público deve ser administrado com eficiência e boa governança. Porque trata-se do dinheiro dos contribuintes”, completa o auditor sueco.

O próprio Riksrevisionen é, por sua vez, fiscalizado por empresas internacionais de auditoria: a auditoria interna do órgão sueco é realizada pela Price Waterhouse Coopers, e a auditoria financeira é feita pela BDO, uma das maiores do mundo no setor.

”A idéia é garantir a total confiança da sociedade nas autoridades públicas”, diz Claes Norgren, que acaba de encerrar seu mandato de sete anos à frente do Serviço Nacional de Auditoria sueco."

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(*) A jornalista brasileira Claudia Wallin, radicada em Estocolmo, é autora do livro Um país sem excelências e mordomias.

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sexta-feira, 15 de julho de 2016

A delação compensa

Por Henrique Beirangê e Rodrigo Martins - no Carta Capital, em 13/07/2016 - "Todos os que fizeram seu dever aos olhos de Sergio Moro encaminham-se para a vida boa de tornozeleira eletrônica. Só Léo Pinheiro paga pelo silêncio."

Delaçao

"A Lava Jato e suas infindáveis fases são desdobramentos involuntários de investigações contra um núcleo de quatro doleiros responsáveis por esconder e movimentar dinheiro criminoso de políticos e até mesmo de traficantes.

Nesse novelo, abriu-se uma das frentes de apuração, batizada oportunamente de Dolce Vita, alusão à ostentação da doleira Nelma Kodama. Acostumada a dirigir seu carro Porsche Cayman e andar com grandes quantias de dinheiro, ficou famosa após ser presa com 200 mil euros na calcinha, quando tentava embarcar para a Itália.

La Dolce Vita é o nome de um célebre filme italiano de 1960, dirigido por Federico Fellini, no qual critica os excessos e a superficialidade da sociedade romana do pós-Guerra, antes que a Itália realizasse seu “milagre” econômico. Uma doce vida, como a dos delatores beneficiados com os acordos de colaboração premiada firmados em Curitiba.

Residindo em casarões à beira-mar, eles foram fundamentais para desbaratar a quadrilha que assaltou a Petrobras. Os denunciantes entregaram os principais nomes ligados ao PT e a seus aliados. É sabido que as apurações só chegam às profundezas das organizações criminosas quando algum ex-integrante decide contar o que sabe.

E quando elas servem, porém, para fazer um expurgo parcial e bem seletivo? Na Lava Jato, há histórias mal contadas de personagens sem a mesma sorte quando optaram por falar de menos, ou “demais”, em alguns casos.

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Que o diga Fernando Moura, lobista e réu confesso. Aliado do ex-ministro José Dirceu, acompanhou de perto as nomeações em estatais no governo Lula. Informou que o então deputado Aécio Neves, hoje senador e presidente do PSDB, manteve uma diretoria na Hidrelétrica de Furnas.

Mais: o tucano seria beneficiário de um terço da propina na estatal. O juiz Sergio Moroentendeu que parte do depoimento teve “idas e vindas” e houve violação do acordo por não pagamento de multa. Caso único na operação, o delator voltou a cumprir pena em regime fechado.

A mesma “má sorte” de parte dos investigados de Curitiba não para por aí. De acordo com o jornal Folha de S.Paulo, a delação de Léo Pinheiro, executivo da OAS, está paralisada. Motivo: o empreiteiro disse desconhecer ilegalidades na conduta de Lula com relação aos contratos com a Petrobras, o sítio de Atibaia e o triplex no Guarujá.

CartaCapital apurou que outro delator, próximo ao doleiro Alberto Youssef, também firmou acordo de colaboração e tem detalhes dos bastidores dessas negociações premiadas. Ao citar Aécio, ouviu que a informação interessava, “mas não agora”. Os depoimentos tiveram continuidade com nomes ligados ao governo e seus aliados.

Enquanto isso, o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco comemora sua vida de delator. Flagrado em Angra dos Reis, litoral do Rio de Janeiro, ao lado de duas mulheres, em julho de 2015, saboreando uma dose de scotch, parece ter entregado os “nomes certos”.

Ao informar que a quadrilha instalada dentro do PT recebeu 200 milhões de dólares entre 2003 e 2013, só com relação a contratos na Diretoria de Serviços da Petrobras, Barusco apontou o então tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, e o ex-diretor Renato Duque como intermediários do esquema. Ambos continuam encarcerados em Curitiba.



Barusco firmou acordo para devolver 97 milhões de dólares. A descapitalização não impediu sua vida de mimos em Angra dos Reis, assim como não deve atrapalhar o conforto do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.

O primeiro afirma que atuou no esquema desde 1997, ainda no governo FHC, enquanto Cerveró diz que a gestão tucana levou 100 milhões de dólares da compra de uma petrolífera argentina.

Embora relacionados ao esquema pelos delatores, os tucanos e seus aliados não têm do que reclamar da força-tarefa de Curitiba. Ninguém foi incomodado até o momento. E muito provável, nunca sejam.

A menção de Cerveró à gestão FHC foi um ponto fora da curva. Talvez por isso tenha demorado tanto tempo para a delação ser concluída. Curiosamente, somente após as gravações feitas por seu filho, revelando os planos do ex-senador petista cassado, Delcídio do Amaral, para lhe dar fuga, é que o ex-diretor da Petrobras conseguiu finalizar seus depoimentos.

Cerveró tem motivos para estar satisfeito. Comprometeu-se a devolver “apenas” 18 milhões de reais e vai poder, com sua tornozeleira eletrônica, ter sua vida de volta. Saiu da carceragem de Curitiba para regressar a seu sítio, em um condomínio fechado em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Mora perto do ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa, residente no distrito de Itaipava, distante 35 quilômetros.

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Após entregar a existência do funcionamento do esquema envolvendo o PP, políticos do PT, do PMDB e do PSB, e as empreiteiras participantes do cartel, Costa foi o primeiro delator a se ver livre da prisão. PRC, como é identificado nos inquéritos, vive em uma casa portentosa, às margens das montanhas.

Também possui outra mansão no Rio de Janeiro, na Barra da Tijuca. Em Itaipava, a adega recheada de vinhos caros revela que seu padrão de vida continua às mil maravilhas, mesmo após ter negociado uma multa de 23 milhões de dólares com a força-tarefa.

O patrimônio pode, assim como dos demais delatores, ser maior do que o declarado à Lava Jato. Segundo o lobista Fernando Baiano, o ex-diretor da Petrobras omitiu outros 3 milhões de reais que estariam em poder de um sobrinho de sua esposa.

A investigação não deverá mexer nesses vespeiros, embora uma das cláusulas das delações afirme que, caso sejam descobertos recursos escondidos, a colaboração pode vir a ser anulada.
Já PRC falou bastante, talvez até demais. Em sua delação, citou os nomes dos senadores Renan Calheiros e Romero Jucá, flagrados em conversas com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado maquinando “alternativas” ao fim da Lava Jato.

A partir de tais gravações, o procurador-geral, Rodrigo Janot, pediu a prisão dos dois por tentativa de obstrução da Justiça. Diferentemente do destino do ex-senador petista, os dois caciques do PMDB, além do ex-presidente José Sarney, não foram presos.

O ministro Teori Zavascki, desta vez, indeferiu os pedidos. Talvez não seja por acaso que o antes adulado pela imprensa Janot passou a ser crucificado pelo “exagero” nos pedidos de prisões dos próceres do PMDB.

Colunistas dos maiores órgãos de imprensa nacionais chegaram a sugerir que empresários estariam “contrariados” com a postura do procurador-geral e sugeriram até mesmo “trégua” à Lava Jato. Pedidos esdrúxulos de impeachment contra ele chegaram ao Senado – curiosamente, por partidários do afastamento de Dilma Rousseff.

Quanto a Machado, que nunca passou um dia atrás das grades, mesmo após confessar repasses de propinas que ultrapassam os 100 milhões de reais, descansa em sua bela mansão em bairro nobre de Fortaleza, no Ceará. Multado em 75 milhões de reais, conseguiu estender os benefícios aos demais filhos envolvidos nas falcatruas.

E a lista de delatores com vida edulcorada não para por aí. Um dos primeiros beneficiários dos acordos foi o empresário Júlio Camargo. Ganhou notoriedade após relatar o pagamento de 5 milhões de dólares ao presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, do PMDB.

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Camargo concedeu entrevista exclusiva a CartaCapital no início do ano, e revelou que pouco mudou em sua rotina. O empresário foi multado em 40 milhões de reais pela Lava Jato, mas nada próximo dos cerca de 100 milhões que teve de pagar de propina no período em que atuou juntamente com políticos e partidos ligados aos contratos na estatal.

Júlio não chegou a ser preso, não teve nenhum tipo de cerceamento de liberdade, seus bens não foram bloqueados e mantém sua participação na Toyo Setal, uma das empresas envolvidas no cartel da Petrobras. Quem ainda amarga cadeia, destoando dos demais delatores, é por estar negociando sua colaboração, recusa-se a falar ou é peça-chave na organização.

É o caso do doleiro Alberto Youssef. Embora esteja preso no Paraná desde março de 2014, o operador é antigo beneficiário de delações premiadas. Durante o Caso Banestado, escândalo de evasão de divisas do fim dos anos 1990 que mandou ilegalmente meio trilhão de reais para os confins do planeta, Youssef ganhou o prêmio, também pelas mãos do juiz Sergio Moro, magistrado responsável pelo caso na época.

Em uma das cláusulas do acordo, era previsto que, caso o doleiro voltasse a reincidir na prática criminosa, perderia os benefícios da delação. Dito e feito. Youssef não só voltou a operar a lavagem de dinheiro dos políticos na Petrobras como foi novamente agraciado com outra colaboração premiada.

Com previsão de ser solto em 17 de novembro, Youssef deve ganhar o Green Card do Departamento de Estado Americano. Com a condição de depor em ações do governo contra a Petrobras, por conta de prejuízos de fundos de pensão americanos com o escândalo na petrolífera, ele e família poderão vivenciar o sonho americano.

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Enquanto isso, no Brasil, o pesadelo da crise sobrará para os nativos por muitos anos. Não por acaso, a legislação que regula a delação virou alvo de discussão no Congresso, onde tramitam ao menos oito propostas de mudança.

O mecanismo está previsto na Lei dos Crimes Hediondos desde 1990. Depois disso, foi incluído em leis específicas sobre Crimes Contra a Ordem Tributária, Lavagem de Dinheiro e Extorsão Mediante Sequestro.

A colaboração premiada consolidou-se, porém, com a Lei nº 12.850, sancionada por Dilma em 2013, a prever redução de até dois terços da pena privativa de liberdade de quem colaborar “efetiva e voluntariamente” em investigações contra organizações criminosas.

Encerrada em outubro do ano passado sem indiciar nenhum parlamentar, a CPI da Petrobras é autora de três desses projetos para modificar a lei. Um deles veda “a colaboração premiada daquele que ostenta maus antecedentes ou que tenha rompido colaboração anterior”.

Outra proposta impede que um mesmo advogado represente dois ou mais delatores no mesmo inquérito ou processo judicial “para se evitar combinações entre depoimentos”. O colegiado apresentou, ainda, um projeto para obrigar a gravação das reuniões de preparação de delações.

Dois projetos de 2014, um do deputado petista Marco Maia, outro do ex-senador Vital do Rêgo (PMDB), hoje ministro do Tribunal de Contas da União, têm o mesmo objetivo: permitir que as CPIs tenham acesso às informações sigilosas de delações.

A mais recente proposta é do deputado petista Wadih Damous, ex-presidente da OAB do Rio de Janeiro. Apresentado no início de março, o PL nº 4.372/16 restringe a celebração desse tipo de acordo apenas a quem “estiver respondendo em liberdade ao processo ou investigação instaurados em seu desfavor”. O projeto também fixa pena de 1 a 4 anos de reclusão a quem divulgar informações sigilosas das delações.

“Ao contrário do que parte da mídia tem alardeado, o projeto visa justamente preservar a Lava Jato. O juiz Sergio Moro é campeão de nulidades, basta ver o resultado do Caso Banestado, em que todo o processo acabou anulado por uma série de irregularidades”, diz Damous. “O uso da prisão preventiva para forçar delações é flagrante violação.”

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No início de 2016, um grupo de 105 advogados e juristas, parte deles defensores de réus da Lava Jato, redigiu um manifesto com duras críticas à operação, no qual também reprovam o desvirtuamento da prisão cautelar, “indisfarçavelmente utilizada para estimular a celebração de acordos de delação premiada”.

Antes disso, o advogado Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça de FHC e um dos autores do pedido de impeachment de Dilma, havia criticado o expediente em artigo publicado na Folha de S.Paulo em dezembro de 2014. “Transformar a prisão, sem culpa reconhecida na sentença, em instrumento para forçar a delação é uma proposta que repugna ao Estado de Direito”, escreveu à época.

Impedir a delação de presos divide a opinião de especialistas. Durante a Lava Jato, o emprego da prisão processual fundamentou-se, em várias oportunidades, na “resistência” de empresas e de seus executivos em não colaborarem, observa Geraldo Prado, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Rio e professor de Direito Processual Penal da UFRJ.

“A mera viabilidade da coerção, que desapareceria na hipótese de colaboração premiada, funciona como instrumento de violação de garantias básicas, como a presunção de inocência e a proteção contra a autoincriminação compulsória, porque afeta a autonomia da vontade.”

Na avaliação do advogado Eduardo Carvalho Tess Filho, presidente da Comissão de Direito Internacional da OAB de São Paulo de 2003 a 2012, não se pode falar em coação pelo simples fato de o delator estar preso.

“Se o juiz tiver razões para achar que um investigado pode pressionar testemunhas, destruir provas ou mesmo fugir do País, ele está correto em mantê-lo preso. Se passa a colaborar com a Justiça, deve ser solto.”

Tão antiga quanto as 30 moedas de prata recebidas por Judas Iscariotes para entregar Cristo aos seus captores, colaboração premiada faz parte do ordenamento jurídico de numerosas nações. O instituto ganhou popularidade, sobretudo, após a exitosa experiência americana no combate ao crime organizado em meados do século XX.

Na Itália, começou a ser adotada nos anos 70 para combater atos terroristas, e consolidou-se duas décadas depois com famosa Operação Mãos Limpas. Lá, no entanto, não houve solturas em massa ao custo de delações forçadas. Muito menos como a que exige de Léo Pinheiro o nome de Lula a qualquer preço. E houve delatores, bem como incriminados que se suicidaram.

Nos EUA, as organizações criminosas começaram a ganhar força com a venda ilegal de bebida alcoólica durante a Lei Seca (1920-1933). Após a liberação do produto, boa parte desses grupos permaneceu ativa e prosperou com a exploração de outras práticas ilícitas, a exemplo da prostituição, dos jogos de azar e do narcotráfico.

É nesse contexto, especialmente a partir dos anos 1960, que as autoridades americanas passam a utilizar largamente o plea bargaining, com benefícios aos mafiosos “arrependidos” e dispostos a delatar seus chefes e comparsas.

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Tess Filho observa, porém, algumas diferenças na comparação do modelo brasileiro com o dos EUA. “Os benefícios costumam valer apenas para o primeiro que se dispõe a colaborar com a Justiça americana. Além disso, dependendo do grau de cooperação e dos resultados obtidos, o réu pode ter a pena perdoada integralmente.”

A colaboração agiliza os inquéritos, evita a prescrição de crimes e reduz custos de pessoal e de equipamentos envolvidos na investigação. O grande nó, no Brasil, reside no uso político das versões apresentadas pelos delatores.

“As delações são compostas de verdades absolutas, meias-verdades e algumas mentiras escancaradas, portanto devem ser acolhidas com critério e prudência, exigindo-se a comprovação dos fatos revelados”, pondera o senador Álvaro Dias, ex-líder do PSDB, hoje abrigado no PV.

O parlamentar opõe-se às propostas que visam restringir delações de presos ou de quem rompeu acordos anteriores, mas vê com simpatia a proposta de criminalizar vazamentos. Para Dias, também seria bem-vinda uma punição aos delatores flagrados em mentiras ou que não comprovem as acusações feitas. Considera, porém, a colaboração premiada imune às pressões para reduzir sua força. “Haveria forte reação popular.”

De fato, não parece haver ambiente político para grandes alterações. O presidente do Senado, Renan Calheiros, do PMDB, chegou a defender mudanças na legislação durante as embaraçosas conversas gravadas pelo delator Sérgio Machado.


Em público, o peemedebista recuou. “Para não parecer que o presidente está desbordando do cumprimento do seu papel, eu acho que a lei precisa ser modificada, sim, mas não será enquanto eu for presidente do Senado."

VIA

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