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segunda-feira, 11 de dezembro de 2023
As lições do campeonato brasileiro às profissões jurídicas
Por Vladimir Passos de Freitas, no Conjur: Sem qualquer pretensão de ser um especialista em futebol, ainda assim acompanhei e desfrutei o Campeonato Brasileiro da Série A, quiçá, de todos, o mais emocionante de toda a história desta competição. Desde logo esclareço que o clube de minha preferência saiu-se mal e, portanto, ao enaltecer algum, não revelo nenhum sentimento particular.
Estabelecidas as premissas, vamos ao campeonato e à sua relação com o mundo jurídico. Acompanhando o sucesso e o insucesso dos clubes que o disputavam, não pude deixar de compará-los às instituições e profissões jurídicas, percebendo que comportamentos poderiam ser aproveitados ou repudiados.
Começo pelo Palmeiras, o campeão. Vindo de um passado inglório, duas passagens pela Série B, investimentos que não deram certo (v.g., Parmalat), preparou-se com determinação, alcançando em 2023, pela 12ª vez, o título brasileiro. Administração eficiente, controle nos gastos, apoio às categorias de base, fornecedor e não consumidor de talentos, sem estrelas globais no time pouca conversa e muita ação. Além disto, um técnico diferente, Abel Ferreira. Fazendo jus à franqueza dos portugueses, ele nunca hesitou em "dizer poucas e boas". Líder nato, sempre protegeu o grupo. Em entrevista coletiva após a conquista do título, lembrou a importância da identidade e o caráter da equipe. Deixou claro que a vitória foi de todos, e não dele ou de algum jogador endeusado pela mídia.
Como o Tribunal pode utilizar tais lições para alcançar um patamar de excelência? A primeira dificuldade é que o presidente só dispõe de dois anos de gestão. Este é um problema a merecer correção. O ideal seria uma reforma constitucional, estendendo o prazo para três anos. Na impossibilidade, a saída é tomar providências, ouvindo e discutindo com o antecessor ou presumido sucessor, a fim de que haja continuidade. É preciso grandeza para deixar sentimentos pessoais antagônicos de lado, o que vale é a instituição. O sentimento de equipe é essencial. Não apenas com os magistrados da Corte, mas também com os servidores.
É preciso que todos participem das iniciativas e do sucesso. Mas isto não acontece por acaso. Tal qual a preparação do Palmeiras, será um longo processo de convencimento. E ao presidente cabe agir com inteligência, evitando aparecer como o único detentor de virtudes raras. Ao contrário, dividirá as glórias com terceiros, sempre citando nomes dos que o ajudaram, indicando-os para palestras, incentivando-os a assumir atribuições, designando-os para representar o Tribunal em atividades e outras medidas assemelhadas. Óbvio que sempre haverá opositores. A estes deve ser dedicado o mais absoluto silêncio, sem críticas, acusações ou vinganças.
Vejamos agora um exemplo a não ser seguido, o Botafogo. Liderando por 31 rodadas, 13 pontos na frente, o clube terminou em 5º lugar. Entre as causa, três se sobressaem: 1ª) a troca de técnicos, nada menos do que cindo. Sabidamente, o comando deve ser único, sereno e duradouro. Comparemos com uma operação policial que sob a condução de um delegado e depois mude duas ou três vezes de mãos, assumindo diferentes linhas de investigação. Dificilmente terá sucesso;
2ª) o ímpeto inicial e a certeza dos sucesso. Imagine-se na área da advocacia, um escritório que em pouco tempo adquire notoriedade. Seus sócios, guiados por inteligentes orientações de marketing, atuam forte na mídia e não perdem lançamento de livros e afins. No entanto, se aquelas condutas não se impõem ao respeito por forma correta e coerente de atuação, se não se lastreiam em sólidos conhecimentos jurídicos e não apresentam resultados, o sucesso não se sustentará.
3ª) maus resultados levando ao enfraquecimento de ânimo. Ninguém vence sempre, o insucesso faz parte da existência. Mas, se não houver resiliência, poderá tornar-se crônico e levar ao desastre. Imagine-se a decepção de um procurador da fazenda nacional que não consiga levar a leilão imóvel de grande devedor. Se desanimar, o resultado será o fracasso pessoal e institucional. Se procurar descobrir onde errou, onde lhe faltou astúcia e estratégia, poderá reagir com energia redobrada e não aceitar um segundo mau resultado.
Com um resultado bom, ainda que não auspicioso, o Athletico Paranaense lacrou a 8ª colocação e reservou posição a Libertadores. Este também é um caso de administração bem conduzida. Inexpressivo há alguns anos, o clube mudou a imagem, o símbolo, criou um estádio moderno, que, inclusive, se presta à locação para espetáculos de grande afluência de público.
Dele se pode tirara a mensagem seguinte: o sucesso se conquista aos poucos, é fruto de boa condução por anos. Comparemos sua situação com a das Defensorias Públicas, que conquistaram forte espaço nos últimos anos. Mas, para alcançarem o reconhecimento máximo, precisam firmar-se como o órgão que realmente atende os milhares de carentes que a procuram.
Esta é sua vocação máxima e não as teses midiáticas que já têm outros atores. Para alcançar seu objetivo, devem as DPs facilitar ao máximo o acesso aos interessados. Por exemplo, a DP não deve ter uma plataforma na internet que, para marcar uma consulta, contenha tantas exigências burocráticas, que leve o interessado a desistir de reivindicar seus direitos. Ao contrário, deve ser feita de forma simples, informal, por pessoas especializadas em comunicação e psicologia social.
Na ponta de baixo da tabela do campeonato, exemplo máximo do que não fazer, temos o Santos Futebol Clube. Impossível não lembrar o seu sucesso no passado, que vai muito além do icônico Pelé. Basta recordar que foi duas vezes campeão mundial e três vezes venceu a Copa Libertadores da América. Recentemente, por duas vezes escapou do decesso no último momento, mas agora foi surpreendido por dois resultados positivos de seus rivais (Bahia e Vasco da Gama) e pela derrota diante do Fortaleza, na Vila Belmiro. Causas? Sete trocas de treinador, administrações incompetentes, salários de jogadores elevados e uma torcida que mais atrapalha que ajuda, costumeira praticante de atos de selvagem violência.
Estes exemplos negativos de condutas servem para tornar um fiasco qualquer gestão de um Tribunal. Por exemplo, trocas de gestores administrativos, com substituição de experientes funcionários por pessoas ligadas ao novo presidente, administrações rotineiras, falta de força e coragem para enfrentar os problemas mais graves (p. ex., um desembargador com Alzheimer progressivo, que não pede aposentadoria), falta de apoio e confiança da comunidade jurídica (OAB, MP, DP, AGU, etc). Tudo isto pode levar a instituição a ter um destino semelhante ao do Santos Futebol Clube, no caso ser considerado Tribunal da Série B, ou seja, de segunda categoria.
Finalmente, vejamos o caso do Cruzeiro, a Raposa de Belo Horizonte. Após uma campanha sofrível, somando maus resultados e até correndo risco de rebaixamento, reagiu ao final, arrancou um empate do Palmeiras e conseguiu entrar na Copa Sul-Americana de 2024. Seu exemplo pode ser útil ao Ministério Público Federal. A instituição passou por inusitada perda de relevância nos últimos quatro anos. Basta apenas um exemplo para se ter certeza disto: o inquérito das Fake News, instaurado no STF, no qual o MPF não tem o menor protagonismo, mesmo sendo o dono da ação penal. No entanto, tal como o Cruzeiro, a instituição tem uma nova chance. É que agora, com a indicação de Paulo Gonet para Procurador-Geral da República, pessoa que não conheço, mas de quem sé ouço elogios, terá o MPF a oportunidade de voltar à cena como um dos atores principais do sistema de Justiça, evitando seguir no rumo da Série B.
A estes exemplos, muitos outros poderiam somar-se. A tenacidade do Grêmio conquistando o vice-campeonato, a luta do Cuiabá, representante de um estado sem tradição futebolística, e a combatividade do Vasco da Gama, lutando e alcançando a permanência na série A no último minuto. Toso estes exemplos podem ser aproveitados na área jurídica. Basta ser observador e não ter vergonha de imitar o que é bom.
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