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quarta-feira, 29 de junho de 2016

Os sofistas ontem e hoje

Por Gilmar Zampieri (*), publicado no JornalJa - "Os sofistas foram geniais educadores da polis grega. Eles foram os primeiros mestres e pedagogos da cultura ocidental. Exímios debatedores. Afiadíssimos dialéticos e imbatíveis na arte de argumentar e contradizer. Eles arrebatavam multidões, num tempo de mudança cultural e política que exigia novos ensinamentos no âmbito político, jurídico e moral. Na democracia insipiente da Grécia antiga, em que o direito e a moral já não eram compreendidos como produto da natureza, típico da cultura aristocrática decadente, mas da sociedade, eles se apresentam como os defensores de uma nova ordem ancorada em um único soberano, o homem.



O homem é a medida de todas as coisas, diziam. Se o homem é a medida de todas as coisas, e não deus ou a natureza, então tudo é relativo ao homem e não existe a menor chance se levar a sério uma verdade que pretende ser universal e absoluta. Sem valores perenes, verdades universais e normas jurídicas absolutas, tudo vira uma questão de ponto de vista e de força suficiente para impor o seu ponto de vista, caindo inevitavelmente no ceticismo e no relativismo.

O bem comum, por exemplo, em política, é só uma aparência externa para fazer crer que os interesses próprios, dos mais fortes, tenha legitimidade. Por trás do discurso do bem comum, age-se com interesses escusos e inconfessos e quem é mais expert e mais bem articulado impõe o que para ele ou seu grupo parece ser interesse a todos.

Assim resumida a filosofia dos sofistas, que semelhança há com o que estamos vivendo hoje no Brasil? Estamos ou não reeditando os sofistas? Há laboratório melhor do que o Brasil para a ressurreição dos sofistas?

A disputa, a guerra de posições, o argumento e contra-argumento, a luta incessante de posições opostas, é a regra em política. Em uma sociedade desigual como é a brasileira, é natural que se leve para o âmbito político estatal os interesses em disputa na sociedade civil. A disputa na defesa de interesses é, portanto, legítima.

Na disputa legítima de interesses diversos, há os que defendem os empresários e ruralista e há os que defendem os trabalhadores e sem-terra, por exemplo. Há os que defendem os homens brancos e ricos e há os que defendem as mulheres pobres e os negros. Há os que são contra os homossexuais e há os que defendem os direitos dos homossexuais. Não há como ser diferente. Não há uma posição neutra e universalista em abstrato e nisso os sofistas tem razão.

Mas, não haverá um mínimo de bem comum, de interesse público, de direitos humanos elementares que tanto um quanto outro deveríamos defender? Não há um mínimo comum que não poderíamos recuar sob pena de comprometer a vivência pacífica e justa da sociedade? Ou não dá para almejar vida pacífica e justa na sociedade? Se não há, então a própria política vira uma guerra de todos contra todos como se estivéssemos em um estado de natureza.

Ora, a política é justamente a nossa capacidade de superar a natureza belicosa, interesseira e mesquinha, em nome de valores mais altos formulados por acordos humanos para nos tornar mais humanos.

Há nisso uma pequena dose de idealismo e de utópico, mas não custa sonhar e tentar acordos mínimos de interesse comum. Fora isso, a barbárie piscará seu olho grande e nos atrairá para seus braços logo aí adiante!…"

(*) Gilmar Zampieri, é graduação em Filosofia pela Universidade Católica de Pelotas, especialização em Filosofia Contemporânea pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, mestrados em Filosofia e Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Atualmente é professor titular da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Fransciscana e Professor assistente do Centro Universitário La Salle - Canoas.

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sexta-feira, 24 de junho de 2016

É a política, idiotas

Artigo de Mario Boeira, no Imagem Política - "Quem não é a favor da democracia? Todos são. Até mesmo os tiranos, que a negam na prática, dizem ser a favor. Episódio famoso, que confirma essa tese, se deve ao espírito crítico de Millôr Fernandes, que, convidado para um evento de escritores em Passo Fundo, no período mais negro da ditadura, fez um discurso inflamado sobre liberdade, democracia e direitos humanos. Foi ovacionado de pé pela plateia. Quando os aplausos cessaram, informou que acabara de ler o discurso de posse do general Garrastazu Médici como presidente do Brasil.


Vejam só, o que o dizia o homem que negou com mais veemência os princípios democráticos durante seu governo: “Homem do povo, conheço a sua vocação de liberdade, creio no poder fecundo da liberdade”.

Os gregos de Atenas, a quem a história reserva o direito de ser os inventores da palavra e da prática da democracia, só a permitiam a poucos na sua cidade-estado.

As decisões na grande reunião em praça pública – a Eclésia – eram tomadas apenas pelos homens livres, nascidos em Atenas. Delas, não participavam os estrangeiros (metecos), os escravos, os menores e as mulheres.

Foi somente após as grandes revoluções burguesas, a partir do século XVIII, principalmente na França e na Inglaterra, que este conceito foi parcialmente universalizado.

Surgia a república, com a ideia de representatividade, onde a comunidade através de um processo eleitoral escolhia seus líderes, embora ainda sujeita a restrições importantes, com a exclusão, em muitas sociedades, do voto das mulheres, dos analfabetos e dos despossuídos materialmente, sem contar com os escravos, que não dispunham de nenhum direito.

É sob esse sistema que, com mais eficiência em alguns lugares e menos em outros, vive hoje a maior parte da humanidade: a democracia representativa, onde cada pessoa é um voto e qualquer um – teoricamente – pode chegar ao poder, desde que seja escolhido pelos seus pares.

O poder de uma pessoa ou grupo é transitório e deve ser confirmado tempos em tempos por um processo eleitoral.

Diante desse sistema, se colocam hoje duas possibilidades. Negá-lo, com uma proposta de que alguns grupos – ou uma pessoa – se auto proclamem os representantes da vontade de todos e o exerçam o poder como se escolhidos fossem por outro processo que não o eleitoral.

Caso típico foi a ditadura militar brasileira iniciada em 1964.

A outra possibilidade, é o aprimoramento do atual sistema, retirando dele os entraves que hoje o maculam, como a influência exercida sobre os eleitores pelas mais variadas formas de alienação política.

Seria uma radicalização da democracia. Dentro dessa linha, Tarso Genro, é hoje o único político com representatividade no cenário nacional e intelectualmente preparado, que a defende com coerência e vigor essa linha.

Em seus artigos, infelizmente restritos à veiculação na imprensa alternativa, ele tem defendido a radicalização da democracia brasileira, extremamente ameaçada nos últimos meses pelo golpe desfechado contra o governo da presidente Dilma, pelo poder exagerado assumido pelo poder judiciário e pela corrupção endêmica do Congresso Nacional.

Como Tarso não defende uma revolução social que altere a divisão de classes no Brasil, nem o fim do regime capitalista, podemos dizer, correndo o risco de ser infiel ao pensamento do autor, que o processo de radicalização democrática que ele prega, precisará ser realizado dentro dos quadros políticos atuais, com a efetivação de pelo menos duas medidas: a reforma política, principalmente com fim da intervenção do poder econômico no processo eleitoral através do financiamento estatal das campanhas políticas e a regulação da mídia, com o estabelecimento de um sistema de responsabilidades, que impeça o que ocorre hoje, quando os veículos de comunicação se transformaram em partidos políticos, quase sempre a serviço de causas impopulares.

A grande questão é saber se existe realmente a possibilidade, dentro de uma democracia representativa como a nossa,  de se alcançar estes objetivos (para não falar de outros mais ousados como as reformas agrária e urbana) através dos mecanismos democráticos do chamado estado de direito em que vivemos.

Marx, e quando se fala em política é inevitável não voltar a ele, diz que o sentido verdadeiro da democracia se revela apenas quando ela se liberta do Estado e de toda forma de mediação política.
Para ele, não poderia haver democracia em uma sociedade de classes e a superação dela, começaria com uma proposta aparentemente contraditória, o estabelecimento de uma ditadura provisória de uma maioria da população.

Na visão dele, essa ditadura seria exercida durante algum tempo pelo proletariado, nascido com o advento da dominação burguesa dos meios de produção.

Seria essa classe revolucionária, a única capaz de desconstruir a sociedade capitalista, como a capitalista havia feito com a feudalista e essa, com a escravagista, num processo dialético de teses e antíteses, até se chegar a uma síntese, ainda que também precária, da sociedade comunista.

Todos nós sabemos que a tentativa de dar vida ás teses de Marx, acabaram por fracassar na União Soviética, depois de pouco mais de 70 anos de existência, mas suas teses – na falta de outra teoria – começam novamente a ser discutidas por filósofos e pensadores preocupados com o futuro da humanidade.

A ideia da ditadura do proletariado, proposta por Marx como ponto inicial de uma revolução democrática, parecer hoje superada até mesmo pelo esfacelamento do conceito de proletariado.

Mas, se o proletariado desapareceu como uma classe social homogênea, não desapareceram as incompatibilidades intrínsecas entre os grupos sociais e econômicos que hoje participam do jogo político.

Por isso, é fundamental que os principais jogadores se apresentem para a disputa e façam suas propostas, como está fazendo Tarso Genro.

Na disputa eleitoral entre Clinton e Bush, pai, James Carville, o principal assessor de comunicação de Clinton, explicando as razões para a derrota de Bush, lançou aquele famoso bordão: “ É a economia, idiota”.

Talvez hoje, o que precisa ser dito para todos que pretendem mudar o Brasil e sintam perdidos: o caminho é a política, idiotas."

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terça-feira, 14 de junho de 2016

Golpe contra liberdade de imprensa

Por Breno Altman (*) - "A Secretaria de Comunicação Social do governo interino de Michel Temer resolveu, no final de maio, cancelar verbas publicitárias para sites e blogs considerados simpáticos ao Partido dos Trabalhadores. Não foram os únicos procedimentos destinados à degola dos setores de imprensa confrontados com o novo bloco de poder. A demissão ilegal do presidente da EBC (Empresa Brasileira de Comunicação), suspensa liminarmente pelo STF, também integra o portfólio de providências para minar veículos de informação críticos ao impeachment.

São igualmente sintomáticas, desta escalada antidemocrática, sentenças judiciais promulgadas por magistrados paranaenses, a pedido de agentes da Polícia Federal, censurando artigos do jornalista Marcelo Auler que denunciavam irregularidades na Operação Lava Jato.

Não estão a salvo nem sequer repórteres do diário Gazeta do Povo, de orientação antipetista, do mesmo Paraná: vários profissionais, em dezenas de cidades, estão sendo processados por denunciarem supersalários de juízes e promotores.

Poucas são as vozes, contudo, a se erguerem contra tais arbitrariedades, com o vigor necessário, para barrar tamanho retrocesso em nossa esfarrapada democracia.

A administração provisória se refastela com a possibilidade de esmagar qualquer dissidência jornalística que conteste sua legalidade ou defenda o retorno da presidente afastada, sob intensos aplausos das facções mais sórdidas do reacionarismo.

As correntes conservadoras, aliás, sempre trataram de estigmatizar os partidos de esquerda como inimigos da liberdade de imprensa. Salta aos olhos, no entanto, a ironia dos governos petistas terem continuado a encher as arcas dos grupos corporativos de mídia, mesmo quando vários desses já estavam envolvidos na ofensiva golpista.

As velhas elites, porém, ao recuperarem a direção do Estado, varrem o pouco de pluralidade que, a duras penas, havia sido conquistado.

Os fatos são escandalosos: o segmento de veículos progressistas recebeu, em 2015, menos de 1% do orçamento publicitário da União e das estatais, faturando menos de 15 milhões sobre um total de 1,87 bi. Não alcançou 8% do valor de anúncios na internet, ao redor de 235 milhões.

Falar em favoritismo ou abuso, portanto, não passa de escárnio.

As principais democracias do mundo, além de regras antimonopolistas, adotam políticas capazes de expandir o direito de expressão para todas as correntes de opinião, através de garantias legais, compras governamentais, cotas de anúncios e créditos estatais.

Um dos maiores entulhos herdados da ditadura é o regime de oligopólio da comunicação, com algumas famílias controlando quase 80% dos meios impressos, eletrônicos e audiovisuais, apesar de determinação constitucional em contrário.

Seus laços com grandes anunciantes privados e agências de publicidade, obedecendo tanto interesses comerciais quanto alinhamentos ideológicos, tornam praticamente inviável, apenas por mecanismos de mercado, o desenvolvimento de uma imprensa independente.

A diversidade editorial e informativa, assim, sem a salvaguarda de mecanismos públicos, fica a mercê da orientação corporativa de controladores privados.

As decisões excludentes e vingativas do presidente em exercício, neste sentido, mais que reiteração de antiga chaga autoritária, representam agressão à liberdade de imprensa e à própria democracia.

Ao tentar amordaçar financeiramente a comunicação divergente, o senhor Michel Temer acaba por expor as entranhas mais pútridas do processo que até agora comanda."

(*) *Breno Altman, 54, é jornalista e fundador do site Opera Mundi. Este texto foi publicado originalmente na página 3 da Folha de S.Paulo, no dia 13 de junho de 2016.


VIA

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sábado, 4 de junho de 2016

A definição de democracia em uma era de confusão democrática

Por Rafael Tomaz de Oliveira e Lenio Luiz Streck, no Conjur - "No livro Teoria Democrática, Giovanni Sartori discutia o significado da democracia em um mundo politicamente polarizado pela Guerra Fria[1]. Nesse trabalho, Sartori avaliou a importância — talvez o melhor seria dizer: a necessidade — de uma definição que satisfizesse certas exigências analíticas do conceito de democracia. Entendia ele que, no chamado “mundo livre”, vivia-se em uma era da “confusão democrática”. E, de fato, ele estava certo ao afirmar que nenhum termo-chave do universo político-jurídico prestava-se a interpretações tão controversas quanto a palavra “democracia”. Basta lembrar que muitas das ditaduras do cone-sul (senão, todas elas) insistiam em se anunciar como “democráticas”, sendo que seus governos de exceção, geridos por juntas militares ou assemelhados, justificavam-se como uma necessidade justamente para a defesa da democracia e da liberdade contra o fantasma do comunismo.

Em 1989, o maior símbolo desse mundo polarizado ruiu, e a guerra fria acabou enterrada pelo entulho e pela poeira de sua destruição.
Porém, isso não significou uma alteração nas coordenadas conceituais equívocas que caracterizavam a era da “confusão democrática”. A aparente generalização da democracia como fórmula mundial de governo não contribuiu para que o mar de interpretações divergentes ou contraditórias sobre o seu significado ficasse, digamos assim, um pouco mais calmo. Ao contrário, à exceção daqueles que, precipitadamente, viram a dissolução da União Soviética como uma manifestação do fim da história, é possível afirmar que essa pretensa universalização da fórmula democrática de governo aumentou — em vez de diminuir — esse estado de embaraço semântico-conceitual.

No cone-sul, as ditaduras que queriam ser chamadas de democracias foram se esfarelando uma a uma. Em alguns casos, antes mesmo que a queda do muro de Berlim estabelecesse o marco definitivo do crepúsculo soviético. E, no lugar da pseudodemocracia, anunciava-se a era da efetiva democracia. Na África do Sul, o regime do apartheid foi derrotado e, em seu lugar, erigiu-se um governo que se dizia inclusivo, não racial e democrático. No Leste Europeu, na Ásia, na Oceania, cada vez mais, apareciam nações que adotavam a democracia e suas instituições como fórmula de governo. Porém, não tardou muito para que cientistas políticos e sociólogos começassem a perguntar: serão mesmo, todas essas “novas democracias”, democracias?

Novamente, então, a questão da definição conceitual, posta por Sartori anos antes, voltava a ser um problema importante para a avaliação critica do regime político, efetivamente praticado, nessas nações que pretendiam se reinventar politicamente a partir da fórmula democrática. Ou seja: o que existe entre o nome e a coisa; entre o rótulo e aquilo que, de fato, encontramos nas vivencias dessas comunidades.

Alguns autores, como é o caso de Guilhermo O’Donnell, procuravam recuperar Robert Dahl e seu conceito de poliarquia para se livrar do embaraçoso problema de ter que chamar de democracia um regime político que não parecia satisfazer às expectativas projetadas pelo conceito, que envolvem um regime de inclusão, com igualdade política universalizada e efetiva participação do povo nas deliberações públicas fundamentais (importante considerar que, na fórmula de Dahl, ou mesmo na discussão de Sartori, essa situação não representa uma peculiaridade de países periféricos, mas se aplicam, também, à modelos políticos experimentados na modernidade central).

Desse modo, em vez de perguntar se um determinado regime político satisfaz as exigências conceituais da democracia, cria-se um termo novo que pode ser atribuído a todas as realidades que, preenchendo certos requisitos, façam jus a ele. Trata-se de um conceito, poder-se-ia dizer, menos exigente que o de democracia. Porém, Sartori, já ao tempo em que escreveu Teoria Democrática, não aceitava essa solução. Dizia ele que as dificuldades em torno de definir o que seja a democracia não poderiam ser solucionadas de uma forma simples: criando-se um termo novo que se apresentasse como um rótulo mais adequado para a realidade encontrada nos Estados que se pretendem “democráticos”. Até porque, dizia Sartori, é exatamente em regimes precários, “onde a democracia é desafiada”, que “respostas provisórias não servem”.

Para Sartori, é impossível abrirmos mão da dimensão deontológica do conceito de democracia. Ou seja, uma democracia só existe quando determinados ideais e valores podem ser transformados em realidades. Isso significa que, quando se pretende falar em democracia, não é possível aceitar a máxima de que “qualquer coisa serve”. Não basta simplesmente observar a existência de instituições que funcionem dentro de certa normalidade e que possuem espaços ocupados por pessoas legitimadas pelo voto popular, colhido em eleições periódicas e regulares, sem que nelas se observem embaraços ou interferências indevidas. O conceito de democracia exige certo compromisso com uma dimensão de dever ser: deve haver na realidade analisada níveis aceitáveis de concretização de direitos fundamentais, com inclusão e projeção universal de igualdade política entre os cidadãos.

No entanto, criar uma definição de democracia não representa tarefa fácil. Os manuais que usamos nos cursos de Direito, nas disciplinas de Teoria do Estado ou Direito Constitucional, que o digam. Parcela considerável desse material opta por enfrentar o problema da definição conceitual de democracia a partir da tática mais elementar e que, de plano, é rejeitada por Sartori: a etimológica. Todo estudante de Direito já ouviu ou leu, em algum estágio do curso, que democracia significa “poder do povo” (ou, de forma ainda mais vulgarizada, governo do povo). Ora, essa é uma definição vazia e absolutamente imprecisa. Além de soar paradoxal com relação àquilo que efetivamente encontramos na prática política de diversos Estados, pesa ainda contra ela o fato de apontar de forma muito transparente para o ideal de autogoverno que, em termos contemporâneos, exige uma construção bastante complexa.

Sartori propõe, então, que busquemos uma definição que, sem perder de vista os elementos deontológicos/normativos da democracia, seja também consciente da necessidade descritiva que esse conceito deve possuir. Vale dizer: é preciso que essa definição nos permita analisar aquilo que a política realmente “é”. Assim, uma definição adequada deve ser, ao mesmo tempo,descritiva e prescritiva.

Esse texto de Sartori mostra-se de grande validade para quem busca compreender o conturbado momento político que vivemos por aqui, em terras brasileiras. Cabe-nos perguntar: nossa “democracia” pode mesmo ser chamada de democracia? E isso vem à tona não apenas porque estamos vivenciando um processo de impeachment. Mais do que isso, os primeiros dias do governo interino deram amostras de que o modelo de governo de coalizão — nomeado, ainda na década de 1980, por Sérgio Abranches comopresidencialismo de coalizão — encontra-se mais vivo do que nunca. Desde a redemocratização, essa fórmula de estabilização da governabilidade foi uma espécie de bênção mista: permitiu o avanço de algumas necessárias reformas, a conquista da estabilidade econômica e a expansão dos direitos sociais, incrementando nossos índices de inclusão; por outro lado, é nela que se encontra a raiz dos principais escândalos de corrupção das últimas décadas, além de contribuir para elevação do nível de fisiologismo na política.

Portanto, precisamos começar rapidamente a construir as condições para deixar de lado a perspectiva do combate — que acirrou e ainda acirrará os ânimos em razão dos desdobramentos do processo de impeachment — para fomentar um debate sobre o que podemos dizer sobre a nossa democracia. Nessa discussão, o presidencialismo de coalizão estará no banco dos réus. Se é possível afirmar que nele se encontra uma forma de explicação do funcionamento de nosso sistema político, falta-lhe, por outro lado, a necessária dimensão deontológica e normativa que está presente no conceito de democracia. Sem falarmos amplamente sobre isso, não avançaremos. Continuaremos a vivenciar, a cada novo governo que se forma — seja ele interino ou não — um eterno retorno ao mesmo. E, por isso, mais do que dizer que queremos democracia, precisamos saber responder qual democracia queremos!

[1] SARTORI, Giovanni. Teoria Democrática. São Paulo: Editora Fundo de Cultura, 1965, passim."

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sábado, 28 de maio de 2016

'Para escapar da barbárie e do colapso da política, vai ser necessário ir além'

Por Renato Rovai, em seu blog - "O momento atual é de colapso do sistema político brasileiro. O movimento de  junho de 2013 já havia deixado claro que estávamos num processo muito perigoso, porque de um lado havia uma juventude insatisfeita com as políticas públicas de Estado e do outro se consolidava um movimento de direita com viés fascista, que ao mesmo tempo que pedia menos Estado propagandeava o justiçamento para tudo aquilo que considerava crime.


Nas mesmas ruas de junho esses movimentos, que são duas pontas do espectro político, caminharam muitas vezes juntos defendendo bandeiras absolutamente distintas, mas que tinham algo em comum, o questionamento do atual sistema político e uma crítica forte aos seus representantes.

Por isso a palavra de ordem pelo fim da corrupção foi a que mais aglutinou a todos que em junho marcharam. Mas curiosamente, se bem investigado, uns pediam menos corrupção para ter saúde e educação padrão Copa. E outros para que a carga tributária fosse menor.

Desde junho de 2013, o condomínio político brasileiro teve tempo para debater o significado daqueles recados das ruas e de tentar sair de uma encalacrada anunciada, que era ver ruir tudo de uma vez e de repente ver no chão não apenas partidos e lideranças, mas o alicerce democrático.

É verdade que não se pode imaginar que as soluções para essa crise seriam as mesmas para todos e muito menos que a todos interessava pensar uma solução que protegesse a nossa democracia imperfeita.

Mas ao menos a presidenta Dilma e o PT deveriam ter buscado ouvir mais aqueles recados, não apenas pensando na eleição de 2014, mas olhando para o processo como um todo.

E o fato é que não se fez isso. A presidenta até propôs uma constituinte exclusiva para propor a reforma política que foi bombardeada pela mídia, pelo vice Michel Temer e também pelo seu então ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso. A ideia não fez aniversário de 24 horas.

E foi-se para a eleição de 2014 deixando embaixo do tapete toda aquela insatisfação que pasmou boa parte dos analistas políticos. Ali, a disputa fratricida deu mais combustível a um tipo de comportamento autocrático dos militantes. E o vencer ou vencer passou a ser um mantra. Começava a ficar claro que quem perdesse não iria aceitar a derrota com armas abaixadas.

E aí cresceu a Operação Lava Jato, entrou na cena principal Eduardo Cunha e suas chantagens, aprofundou-se a crise econômica e o país embicou ladeira abaixo, perdendo empregos, tendo que limitar direitos e não conseguindo dialogar com a expectativa de futuro tanto das classes baixas como dos setores médios.

O impeachment de Dilma que é um golpe, também é ao mesmo tempo fruto desta tempestade perfeita que foi produzida tanto por falta de ação quanto por incapacidade política de buscar entender o que acontecia.

A ampliação do discurso e das práticas da barbárie foi se dando neste terreno fértil. Sei que alguns vão achar absurdo este tipo de análise, mas tanto o estupro celebrado e postado em redes sociais por 30 garotos quanto o do ódio e do justiçamento para eles, são as duas faces de uma mesma moeda.
E tem relação com os rumos que tomaram as disputas políticas no Brasil.

Vale lembrar que o germe dessa crise não está apenas em como se lidou com 2013, mas também com a forma como se deu a disputa presidencial de 2010, quando um José Serra apavorado com a derrota no segundo turno, decidiu radicalizar, beijar os compromissos de Malafaia e trazer o tema do aborto para o centro do debate.

Naquele momento, deixou-se de debater questões centrais para os rumos do país e só se passou a falar de aborto e terrorismo. E ali, o PT e Dilma ao invés de enfrentar o debate chamando a cidadania ativa brasileira a não aceitar a chantagem, preferiu recuar na defesa de temas importantes e que poderiam dar força a um avanço civilizatório no país preferiu se render ao beijo a bispo e pastores.

Mesmo com a derrota de Serra, aquele recuo foi fundamental para ampliar a força desses segmentos que hoje clamam por pena de morte e castração de estupradores. E que ao mesmo tempo justificam o estupro dividindo a responsabilidade do ato com as vítimas, que usam, por exemplo, roupas curtas.

Ali produziu-se o ovo da serpente que fez com que parte de junho de 2013 fosse de direita e extrema direita. Porque, ao contrário do que alguns imaginam, quando o movimento começou as páginas desses grupos no Facebook já eram imensas e maiores do que as dos setores progressistas. Quem quiser ter mais mais informações sobre isso dever ler a dissertação de mestrado da Adriana Delorenzo.

O estupro da menina de 16 anos da Zona Oeste do Rio de Janeiro, infelizmente, não é um caso isolado. Muitas outras meninas são vitimas dessas festas macabras e em muitos casos, depois são assassinadas.

Esses eventos apontam para uma deterioração total dos valores. E, evidentemente, por mais que se queira fazer de conta que não, a qualidade da mídia brasileira tem muito a ver com isso. Mas o aspecto central é que o colapso da política enquanto um arranjo para construir maiorias e buscar saídas institucionais é o que está abrindo espaço para Bolsonaros e suas teses que nos levarão à barbarie.

E por isso não há solução possível com Temer, que já nasceu com a tatuagem de golpista e com prazo de validade vencido. Por exemplo, sua solução de menos Estado não nos ajudará a ultrapassar este momento, muito pelo contrário.

Temer é um puxadinho de péssima qualidade. Além de ser fruto de um Congresso medonho e que é uma das partes relevantes da crise atual. Com esse Congresso não se vai até a esquina, até porque quase todo ele é fruto do jogo político mais mesquinho e corrupto.

Num momento tão duro e onde mesmo a volta de Dilma Rousseff não traz alento para além da proteção das regras democráticas, o que, diga-se, não é pouco, talvez seja o caso de se buscar nos temas transversais um pacto anti-barbárie. E ao mesmo tempo dialogar sobre como sair desse arcabouço político institucional e caminhar para um outro, onde amplie-se a participação cidadã e crie-se instrumentos de diálogos para além da representação parlamentar e o Executivo.

É fato que com Temer na presidência isso não se realizará. Mas começar a pensar nisso urgentemente é fundamental. Ainda vamos viver momentos muito complicados, mas se alguns setores conseguirem olhar e oferecer saídas para o depois de amanhã, há uma pequena chance de se sair melhor deste processo do que se pode imaginar hoje.

E isso não será feito sem a participação de alguns fiadores do pacto político vigente. Por mais absurdo que possa parecer, neste momento entre os construtores dessa ponte para o futuro, que não tem a ver com um programa político ou com acordos de como gestar o Estado, mas com uma construção de um novo arranjo democrático, terão de estar Lula e FHC. Não só eles. E de maneira alguma só eles. Mas também eles."

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sexta-feira, 13 de maio de 2016

Política: Temer, Cunha, o golpe do impeachment e a democracia

O vice-presidente da República Michel Temer, desde longa data é uma das mais gordas raposas que existem nos labirintos do Congresso Nacional. Profundo conhecedor do jogo político, tanto no Poder Executivo quanto no Legislativo, sabe quem são os principais atores de maior influência nas duas casas. Alimenta-se de suas ganâncias e ambições. E sabe a hora oportuna de onde e quando apostar pesado para levar vantagem. Michel Temer, sempre esteve à frente do maior e mais influente Partido político no cenário da política brasileira. Acima do PT e do PSDB, as duas forças antagônicas que disputaram o comando da nação nos últimos anos, o PMDB é quem na verdade distribui as cartas (marcadas) de tal forma que o jogo pareça ser justo, sem trapaças.
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quarta-feira, 20 de abril de 2016

Comandante-geral do Exército refuta possibilidade de intervenção militar

Heloisa Cristaldo - Repórter da Agência Brasil - O comandante-geral do Exército, general Eduardo Villas Bôas, refutou hoje (19) a possibilidade de intervenção das Forças Armadas no país em decorrência da atual crise política. A declaração foi feita em palestra sobre o Dia do Exército, no Centro Universitário de Brasília (UniCeub).


“As Forças Armadas não existem para fiscalizar governo nem para derrubar governos. Temos que contribuir para a legalidade, dar condição para que as instituições continuem trabalhando e encontrem caminhos para superar o que estamos vivendo. Vimos que os embates [políticos] têm sido acirrados, mas as instituições estão funcionando”, disse.

Villas Bôas disse que a intervenção militar de 1964 foi um erro das Forças Armadas. “O Brasil da década de 30 a 50 foi o país do mundo que mais cresceu, com Getúlio [Vargas], Juscelino [Kubistchek]. Nos governos militares nas décadas de 70 e 80, nós cometemos um erro, nós permitimos que a linha da Guerra Fria nos atingisse e o país que vinha num sentido de progresso, perdeu a coesão”, analisou.

O golpe militar de 31 de março de 1964 levou o Brasil ao mais longo período de interrupção democrática durante a República. Lembrados como “os anos de chumbo”, o período da ditadura foi marcado pela cassação de direitos civis, censura à imprensa, repressão violenta das manifestações populares, torturas e assassinatos.

União para sair da crise

Sobre o momento atual, Villas Bôas defendeu a união nacional para o enfrentamento da crise. “Temos que recuperar a coesão nacional, colocar o interesse de país, da nação, acima de todas essas querelas que dominam o dia a dia hoje. Em relação a 64, houve duas diferenças básicas, primeiro era o período de Guerra Fria, com posições extremadas, e em 1964 o país não contava com instituições democráticas definidas. Hoje, o nosso país tem instituições desenvolvidas, com instituições com pesos e contrapesos que dispensam a necessidade de serem tuteladas”, ressaltou o comandante-geral do Exército.

O general também negou boatos de que a presidenta Dilma Rousseff teria cogitado decretar Estado de Defesa no país. “No Congresso, alguns deputados falaram sobre esse assunto. De parte da presidenta não houve essa iniciativa. Seria uma situação preocupante, mas difícil de ser implementada. Dificilmente ela conseguiria implementar, se cria uma situação extrema. [O Estado de Defesa] impediria manifestações, designaria que o Exército fosse empregado nas atividades onde as forças públicas não têm condições de fazer segurança”, explicou.

Ao encerrar o debate, Villas Bôas disse que é preciso encontrar caminhos para superar a crise política do país. “Estamos seguros de que a sociedade tem toda condição de superar essa crise, que é de natureza econômica, política e ética. Nós vemos que todos os parâmetros estão se esgarçando para baixo e estamos perdendo as nossas referências éticas, estéticas e me preocupam as discussões que se vê em busca dos caminhos para superar a crise. Essas discussões não têm profundidade, ficam no campo econômico. Me preocupa que coisas mais profundas, o alicerce de nosso país, não estão sendo considerados.”

Durante a palestra, o comandante-geral do Exército destacou a atuação dos militares em áreas como a Amazônia e o Haiti, além do envolvimento da inteligência da força em questões de segurança nacional e projetos estratégicos desenvolvidos de ciência e tecnologia.

Edição: Luana Lourenço
 
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sábado, 9 de abril de 2016

Governo desmente boatos sobre compra de votos em processo do impeachment

Jornal do Brasil - "Neste sábado (9), o governo federal divulgou comunicado em que desmente os boatos de que o Executivo estaria oferecendo dinheiro para conquistar apoio na votação do processo de impeachment.



Confira o comunicado na íntegra:



"É absolutamente falso o boato de que o governo federal tenha “comprado” deputados para que eles votem contra o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

Essa informação falsa começou a ser espalhada por parte da oposição e chegou a ver veiculada pela imprensa, mas não tem nenhum fundamento. Ninguém apresentou qualquer prova de que isso aconteceu. Portanto, em nenhum momento, as conversas conduzidas pela equipe de governo envolveram qualquer tipo de oferta de dinheiro para deputados.

O governo tem, sim, conversado com parlamentares indecisos para apresentar os argumentos jurídicos contra o impeachment. Assim como, a oposição também dialoga com os deputados para convencê-los a votar favoravelmente a um impeachment.

As conversas do governo têm sido pautadas pelo argumento da Advocacia-Geral da União de que não foi cometido nenhum crime de responsabilidade. Inclusive, para que cargos não fossem usados como moeda de troca, foi anunciado que nenhuma reforma ministerial será feita antes da votação."
 
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sábado, 26 de março de 2016

'Editorial: Quem são os inimigos da democracia'

O DIA - Hoje deve-se observar pelo país tradição tão antiga quanto a Páscoa: a malhação de Judas. A cada ano, no Sábado de Aleluia, elegem-se personagens da República que, no julgamento popular — e com um pouco de galhofa —, merecem uma surra que inclui pauladas, pontapés e até mesmo o fogo.

Inimigos da democracia
Hoje, muitos são os ‘Judas’ no Brasil. Boa parte deles merecedora da ‘homenagem’ de erguer o boneco alusivo nos postes e derrubá-los num linchamento, como numa catarse livradora dos pecados da nação. Mas, como este espaço vem ponderando nas últimas semanas, o ódio e a intolerância vem guiando discursos e ações.

Não é exagero afirmar que a atitude de muitos brasileiros acabará por malhar — no sentido literal ou bíblico — não políticos corruptos ou governantes impopulares, mas a própria democracia. Ao defender com virulência o silêncio do discordante, proibindo-o até de usar dada cor, caminha-se a passos largos para o totalitarismo. E a democracia pode não ressuscitar se a exceção explodir.

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terça-feira, 22 de março de 2016

"SOS, democracia, salve o Brasil do novo autoritarismo"

Por Marcus Ianoni (*), no Jornal do Brasil - "A ofensiva golpista de direita despiu-se de toda a máscara e expôs nua e desavergonhadamente sua ousadia. Enquanto a ideia de que a cor da bandeira nacional corre o risco de se tornar vermelha não corresponde aos fatos, sendo um dos absurdos da emersão do novo autoritarismo, o movimento de subversão da ordem democrática é real. O golpe parte de algumas elites burocráticas de instituições do Estado responsáveis pela defesa da ordem jurídica e da lei penal: juízes, procuradores, policiais federais e um ministro do STF explicitamente partidarizado.

Tais atores da superestrutura jurídica não estão sozinhos, mas aliados a forças posicionadas nos partidos de oposição e na estrutura socioeconômica, visando subverter o regime democrático brasileiro, convertendo-o, pelo golpe político do impeachment sem base jurídica, em uma democracia-autoritária, irmã gêmea de um capitalismo excludente, que tornará perene a instabilidade social.


O objetivo do golpe é amplamente antipetista: depor a presidente Dilma, condenar Lula, para inviabilizar sua candidatura em 2018, e criminalizar o PT. O combate à corrupção é ou foi a farsa.

Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados e um dos maiores líderes do partido golpista, cujo mandato está para ser cassado há vários meses, é aliado do PSDB e demais partidos de oposição na defesa do impeachment. Caso fosse concretizada, o que não é fácil, a marginalização de Lula e do maior partido de trabalhadores do mundo da política nacional não excluiria suas bases da sociedade brasileira, mas acirraria as lutas sociais.

A divulgação ilegal para a grande mídia de escutas telefônicas envolvendo Dilma e Lula foi, até agora, o ápice da violência golpista contra a ordem jurídica, autorizada e defendida pelo juiz Sergio Moro, para atingir os líderes petistas. Tal abuso gravíssimo contra o Estado da Lei ocorreu às vésperas da posse de Lula como novo titular da Casa Civil, com o objetivo de influenciar a opinião pública e instigar a oposição social e institucional contra o governo eleito por 54,5 milhões de votos.

Por trás da máscara do combate à corrupção, ocultava-se e hoje explicita-se plenamente uma intensa ofensiva política das forças capitaneadas pelo conservadorismo de direita, liberal apenas na economia, contra as transformações implementadas pelos governos federais encabeçados pelo PT, de 2003 a 2014, que estavam promovendo, também, o fortalecimento das instituições do Estado Democrático de Direito.

O retrocesso real e virtual embutido na ofensiva de direita é imenso. Começa pela política econômica, já capturada pelos interesses neoliberais, que impuseram ao governo Dilma 2 a austeridade fiscal e monetária. Prossegue nas políticas trabalhista (como a lei da terceirização), previdenciária, social, racial, de gênero e por aí vai. Contudo, pior é o mecanismo de reversão dos ganhos na cultura política democrática desde 2003, acionado pela emergência de um novo autoritarismo em instituições do Estado e na sociedade.

A estratégia golpista da direita tem produzido e disseminado na sociedade civil, via grande mídia, uma protoideologia de massa autoritária, intolerante, justiceira e mobilizadora contra o PT e o governo Dilma, que instrumentaliza seletivamente a corrupção como meio de ignição política. O ódio antivermelho dos protestos de rua opera como fator de legitimação da violência material contra as normas do Estado de Direito no plano institucional para, de modo irresponsável e inconsequente, tentar massacrar a “raça” petista, com respaldo da “lei” e do “povo”.

Por outro lado, o enfoque sensacionalista e justiceiro da corrupção também tem gerado uma rejeição à política em geral, que, para alguns, se faz acompanhar da demanda por um regime autoritário e, provavelmente para um número maior de pessoas, por um salvador da pátria ilusoriamente apolítico, acima dos partidos, puramente verde e amarelo, uma espécie de alto clérigo de um poder teocrático ascético, popular e nacional. Na perspectiva política dessa ofensiva conservadora, se algum gigante acordou, foi o Leviatã, monstro evocado por Thomas Hobbes para defender o Estado absolutista.

Moro, apesar de sua investidura burocrática, racional-legal, vem ascendendo, nessa onda autoritária, ao posto simbólico de liderança carismática do sectarismo de massa. Enquanto a ditadura militar não foi mobilizadora e a Operação Bandeirantes se deu na sombra dos porões da ditadura, o novo autoritarismo emanado da jurídico-midiática Operação Lava Jato, que se vale do regime democrático para subvertê-lo, arregimenta, com propaganda política obscurantista, rebanhos do eleitorado conservador e de outros matizes de opinião como suporte fundamental de sua estratégia política de poder.

Há semelhanças com o fascismo, como a propaganda e a mobilização de massas contra um inimigo construído arbitrariamente. Trata-se de um protofascismo, que a grande mídia incentiva sua manifestação de baixo para cima e os justiceiros da Lava Jato, no que depende de seu poder institucional, promovem de cima para baixo, por meio de abusos na implementação de prisões preventivas, delações premiadas e conduções coercitivas, vazamentos seletivos de informações, escutas telefônicas duvidosas e ilegais e assim por diante.

Diante do avanço do golpe, a principal reação das forças democráticas da sociedade civil foi a presença massiva nas manifestações do dia 18, reunindo centenas de milhares de participantes nos centros urbanos de todo o país. Outra grande manifestação nacional está, a princípio, agendada para 31 de março, data que, em 1964, os golpistas de então partiram para a ofensiva militar. Obviamente, a resistência democrática escolheu essa data para afirmar o valor da liberdade, que os liberais oligárquicos brasileiros, na verdade, desprezam.

A restrição jurídica à posse de Lula na Casa Civil, arbitrada liminarmente por Gilmar Mendes muito com base em escutas telefônicas tornadas públicas ilegalmente por Sergio Moro, é um atentado contra o Estado da Lei. Enquanto isso, a oposição parlamentar acelera a tramitação do impeachment. Ocorrerá aqui o que houve no Paraguai contra Fernando Lugo? SOS, democracia e todas as gerações de direitos!"

(*) Marcus Ianoni é cientista político, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), pesquisador das relações entre Política e Economia e Visiting Researche Associate da Universidade de Oxford

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sábado, 12 de março de 2016

Política: para aqueles que irão na manifestação de amanhã, e para os que não irão

Quem se convenceu do propósito de protestar contra o atual governo, contra o PT, pelo impeachment da atual presidente do Brasil, ou simplesmente contra a corrupção seja lá de quem for, decidiu por opção própria participar da manifestação marcada para amanhã, domingo (13). Certamente, essa pessoa tem plena consciência dos seus direitos previstos na Constituição Federal. Dentre eles, aqueles que asseguram a todos os cidadãos e cidadãs, o exercício da livre expressão do pensamento e de opinião.

Membros de diversos grupos organizadores dessas manifestações, divulgaram através das redes sociais o que seria recomendável levar para uso durante o trajeto do protesto. Como, por exemplo, uma garrafa d'água para a devida hidratação, um celular para registro de cenas inusitadas, ou para captar ações de possíveis hostilidades entre os participantes, dentre outras coisas. 

Por outro lado, é salutar a lembrança de fundamental importância, também levar para as ruas o equilíbrio pessoal, que neste momento  é de extrema necessidade. E se for participar efetivamente, com um propósito firme, é recomendável colocar a razão acima das paixões partidárias. Levar uma dose generosa de tolerância, é imprescindível. E como acompanhamento, a consciência do pleno conceito de democracia, regime de governo pelo qual muitos deram sua própria vida. E que permitiu a escolha da primeira mulher como presidente do Brasil em sufrágio universal.

Igualmente importante, é estar consciente dos verdadeiros conceitos de amor à Pátria, no lugar do egoísmo e dos interesses estritamente pessoais e particulares. Difícil, mas um pouco de sentimentos nobres também pode acrescentar sabor especial ao objetivo do propósito. 

Além disso, leve a consciência de que o único lado que tem real importância, é o lado do bem estar geral da nação, e não apenas de uma parte dela. Independente da escolha pessoal, feita sob a ótica do grande jogo político que hoje travam as grandes agremiações políticas existentes no país. Aliás, pense na possibilidade de que essas exerçam o poder em benefício próprio e de seus comensais, em detrimento daqueles que acreditam que elas possam mudar a realidade daqueles que mais precisam.

Certifique-se estar consciente da existência de milhões de outras pessoas, que pesam de modo diferente. E de estar ciente de que, é das diferenças que nasce o bem comum, que traz benefícios para a grande maioria.

Afinal, existem milhões que não comungam com suas idéias, com suas opiniões,  e com objetivos pré-determinados. E outros tantos que querem distância de protestos e quaisquer tipos de manifestações, que no final acabam em dar em nada. Quanto muito, por satisfazer uma minoria.        

Uh, rapaz! Eu não vou… (Cartilha para quem quer distância dos protestos)



Por Luís Fernando Praga, no Carta Campinas – Prefácio: 

 - "Uns amigos me chamam de: “Seu Bosta!”, “Burro!”, “Petralha!” e “Mentiroso!”. Parecem ter raiva de mim…

Eles acham normal transformar uma discordância política em ofensa pessoal e ofendem a meu pai, minha mãe, a maioria de meus amigos, além de milhões de pessoas das quais divergem politicamente, mas de quem dependem no seu dia a dia.

Acreditam que o xingamento seja um bom argumento para defenderem suas ideias e fazem isso como quem diz “bom dia”.

Mas penso diferente e eles consideram difícil conviver com quem se sente bem, mesmo sendo diferente deles. Porém conviver com as diferenças é essencial para a coexistência.

Eles parecem não ligar muito pra coexistência. Me ofendem como se o alcance de seus raciocínios lhes desse o direito de gritar comigo e xingar, mas todos somos apenas humanos.

Tais amigos acreditam que, se o PT continuar, o país vai explodir. No mínimo, desde os protestos de 15 de março de 2015, há um ano, eles já estavam exaltados e pediam a saída do PT, com um medo insano e um ódio que só tem aumentado. O PT não saiu e nada de acontecer aquela coisa tão terrível, que nem sequer poderia esperar a próxima eleição, mas, segundo creem, vai acontecer se o PT continuar.

Estes amigos sentem “uma coisa ruim no corpo” quando leem a sigla PT ou os nomes Lula ou Dilma. Eles acham muito estranho que eu não seja como eles e que minha inteligência não acompanhe sua ampla visão política.

Realmente não acompanho. Não penso como eles, penso como eu! Prefiro estar onde eu estou e não onde eles estão.

Mas não devemos ter apenas diferenças. Sou favorável à justiça e contrário à corrupção. Amo meu país e a gente que vive nele. Acho que podemos melhorar o mundo. Gostaria que as pessoas não precisassem de leis, como tantas que não funcionam, para fazerem uma opção pela honestidade.

Sou contrário à truculência e ao prejulgamento. Sou contrário ao poder nas mãos de poucos, aos privilégios políticos, ao poder dos partidos e contrário aos segredos que eles nos escondem.

Mas eles estão querendo arrancar o poder de mãos legitimas e entregá-lo ilegalmente nas mãos de outro partido com muitos segredos e líderes cheios de malícia e cobiça.

Não defendo a santificação do PT nem de ninguém. Investigar a corrupção é essencial, mas de forma imparcial. Condenar sem julgamento é covardia, prepotência e abre precedentes para injustiças ainda mais terríveis do que as já praticadas pela “justiça” brasileira.

Não desejo me aliar a quem me chama de “Canalha!”, “Mau caráter!”, “Corno!”, “Pombo jogador de xadrez!” e “Ignorante!”, se há juristas como Celso Antônio Bandeira de Mello, Dalmo Dallari, Fábio Konder Comparato, entre tantos outros, que pensam mais como eu do que como eles.

Já pensaram que podem estar sendo manipulados para odiarem? Nenhum povo cria uma guerra; para isso é preciso um bom incitador, frio, calculista, que visa ao lucro com a nossa guerra e que não sofrerá com nossas perdas.

É legítimo protestar. É natural não gostar de um governo, mas ninguém precisa aceitar imposições de intolerantes. Ninguém tem que aplaudir o ódio! Ninguém tem que desejar o bem do país na base de xingamentos, exclusão e arbitrariedades.

Talvez um dia nos unamos e deixemos de alimentar nosso inimigo comum: no dia em que aprenderem a conversar; mas até lá…

Não, “amigos”, eu não quero pensar como vocês!

Eu estou entre os milhões de brasileiros que se orgulham das transformações sociais promovidas pelo operário que virou presidente e que vocês odeiam. Fico feliz em ver essas transformações levadas adiante e tenho orgulho de termos uma mulher (a quem vocês ofendem de forma triste e rasteira) ocupando a Presidência da República.

Eu não vou aos protestos! Estou feliz em me posicionar, por vontade própria, ao lado de milhares de personalidades admiráveis, de amigos que me entendem, de gente da paz, honesta e que não vai!

Dito isto, foi pensando nas pessoas que pensam diferente e desejam fazer qualquer outra coisa no domingo, que criei esta cartilha. Ela traz dicas e macetes práticos que nos pouparão de uma conversa longa, desgastante e infrutífera com aqueles para os quais não adianta explicar e contrariá-los pode ser perigoso.

A Cartilha

Não precisam ter receio nem constrangimento, é só seguirem a cartilha. Uma lição para cada tipo de “amigo” que os for convidar a protestar nesse domingão. Façam bom uso!
*Para evitar qualquer viés machista, o “Uh, rapaz!” pode ser substituído, sem prejuízo do conteúdo, por: “Menina, nem te conto!”, a critério do(a) usuário(a).

1)      “Amigo” católico reacionário:

Atenda a porta com a bíblia na mão, faça o sinal da cruz e diga:

_  Uh, rapaz! Não vai dar! Se fosse em abril eu podia.

_ Como não vai dar?! O protesto é agora!

_ É quaresma, esqueceu?

_ Mas vai todo mundo, vamos! Fora Dilma, fora PT!

_ Olha, eu adoraria, mas pra mim a quaresma é sagrada.

Ele vai ficar um pouco constrangido por ser menos fiel que você, então dê um “up” no moral do amigo:

_ Vai lá! Coloque a bruxa na fogueira por mim! Conto com você, amigão! Vai com Deus!

_ Está bem, reze por nós! Fique com Deus! E morte à escória!!

E ele partirá feliz.

2)      “Amigo” neonazista:

Atenda a porta com o braço direito estendido acima da altura do ombro, cara de mau e diga:
_ Uh, rapaz! Justo hoje? Não era amanhã? Nossa, te juro, se eu pudesse eu ia, mas meu pai me chamou pra bater nuns nordestinos pretos lá no sítio do meu avô e sabe como é, não dá pra desmarcar, compromisso familiar. Mas vai lá, amigão!

Seu amigo passará a te respeitar e partirá tranquilo ou vai pedir pra ir junto ao sítio. Reitere que é uma tradição só da família.

3)      “Amigo” crente na Globo:

Atenda a porta dizendo “ô pissiti, tudo em riba?” e quando ele disser: “ô da poltrona!” e te convidar, diga:

_ Uh, rapaz! Olha que fantástico, loucura, loucura, loucura! Estou indo para o protesto que vai ter na frente da casa do chefão, uma mansão construída ilegalmente em área de proteção ambiental, lá em Paraty. Vou protestar muito!

Como ele só vê a Globo, não vai saber do que se trata, vai achar que é contra o Lula, te dar o maiorrr apoio e te deixar em paz. Despeça-se com um soquinho no ombro dizendo: “É cilada, Bino!”.

4)      “Amigo” bolsonarista:

Atenda a porta apenas com uma toalha na cabeça e outra na cintura e diga:

_ Uh, rapaz! Ain, tô atrasado, é? ÓOOLIVER!! Ô ÓOOLIVER!!! Você espera o Óliver sair do banho e eu vestir uma roupinha? A gente vai sim! Você tá sabendo do Óliver, né? Veio do Haiti e a gente tá junto, o máximo! Acha que devo ir de shorts ou legging? Tô perdido E você vai assim? Tá tão sério! Ain, me dá um minuto pra me pentear?

Dê as costas e deixe a toalha da cintura cair; quando se virar novamente, seu amigo bolsonarista já terá partido. Pode ser que ele volte um dia para apedrejar sua casa ou tentar te seduzir, mas do mico do protesto você está livre.

5)      “Amigo” evangélico irado e fundamentalista:

Atenda a porta com a bíblia nas mãos e diga:

_ Uh, rapaz, na paz do Senhor! Irmão, não ficou sabendo? Já me comprometi com de ir ao templo, para um retiro de orações contra o Lula e a Dilma, o irmão entende? Aleluia?

_ Ah, irmão, contava tanto com a sua presença lá conosco! É tanto ódio dessa gentalha! E se a gente não fizer nada o diabo toma conta, irmão, vem comigo! Aleluia!

_ Uh, rapaz! Eu até ia, irmão, mas o pastor disse que vocês vão precisar de um respaldo de oração à distância, porque o mal que vocês vão enfrentar é muito grande, aleluia! E outra: alguém tem que pagar o dízimo, imagina se for todo mundo pra rua, se Deus vai gostar de ficar sem receber. Aleluia!

_ Está certo, irmão, se o pastor te convocou… Então eu vou sozinho, mas com um ódio redobrado dessa gente; quero que morram! Aleluia!

_ Sozinho não, irmão, Jesus vai com você pra te amparar no seu ódio, aleluia! Ele está sempre conosco, acha que Ele ia deixar de participar de um evento desse porte? Aleluia?

_ Tem razão, irmão, mas que ódio! Paz do Senhor, irmão!

_ Paz do Senhor! E fora Dilma, fora PT, morre, Lula! Aleluia!

6)      “Amigo”  capitalista selvagem:

Atenda a porta descalço, de shorts surrados, sem camisa e espere que ele se pronuncie:
_ Poxa, mas você ainda não está pronto?

Então diga:

_ Uh, rapaz! Que bom que você veio! Tô pronto sim, vamo que vamo! CREISU, JADSU, WELITU, DAYANY, JENIFI, TICO!! Vem, gente, o tio chegou e tá com o carro novo, vamos! Os filhos do vizinho vão também, é caminho, aí você só deixa eles no shopping. O pai os deixou gastar um pouquinho do que sobrou do bolsa família indo ao cinema hoje. Na volta do protesto, FORA PT!, os pegamos novamente. Onde é que estão essas crianças?!

Vire-se como se fosse procurar e, quando olhar de novo, magicamente seu amigo não estará mais lá e sumirá definitivamente da sua vida.

7)      “Amigo”  defensor da ditadura:

Atenda a porta fazendo “sentido!”, com a camisa generosamente lambuzada de ketchup e diga:
_ Uh, rapaz! Estava me preparando pra guerra, ops, pro protesto e sofri este acidente enquanto limpava minha escopeta. Foi no tórax, mas acho que dá pra ir! Uhh, uhhhh, rapaz!! A nação precisa de você! Senta a pua neles! Cadeia neles! Censura neles! Tortura neles! Uh, rapaz, tá doendo, acho que terá que ir sem mim… vá, soldado, vá!

Caia e espalhe um pouco de ketchup no coturno de seu amigo, olhe nos olhos dele como se fosse um adeus e simule um desmaio ou a morte.  Ele partirá e honrará seu compromisso com a pátria.
8)   “Amigo” PSDBista de carteirinha:

Atenda a porta portando um pixuleco e uma vuvuzela (quem diria que um dia eles seriam úteis) e diga:

_ Uh, rapaz! Tô um pouco atrasado, mas vou sem falta! Sabe se o Aécio vai mesmo?

_ Ainda não confirmou, mas ele não é homem de faltar a compromisso!

_ Isso, deve chegar de helicóptero. Homem de bem tá ali!

_ Um guerreiro!

_ Gênio!

_ Honesto!

_ Limpo!

_ Em todos os sentidos!

_ Generoso, macho!

_ … é mesmo!

_ E bonito, ainda, não é não? É o homem que o Brasil precisa! Vamos colocar o Aécio de presidente e o Moro de vice, já pensou?! Fora Dilma!

_ Claro, é pra isso que lutamos! Fora PT!

_ É, vamos lá! Fora PT! Corja de vagabundo! Cadeia pro Lula! Oh, vai indo na minha frente que só vou colocar a camiseta da CBF, a gente se encontra lá; vai esquentando pra mim. Pra me achar, eu vou com o pixuleco, a vuvuzela, a camiseta, minha bandana 45 e vou estar gritando muuuuito!! Vai me encontrar fácil, à direita do povão!

_ Ok, nos vemos lá. Fora PT! *Nossa, esqueci meu pixuleco! (*talvez ele não diga isso se tiver levado o pixuleco dele).

E deixe que ele vá se divertir…

Pronto! De uma forma simples, amigável e sem ofender ninguém, você pode ter um domingo sem ódio e ainda poupar uma série de bons argumentos para gastar com quem não estiver cheio de certezas ou muito nervozinho.

Finalmente, que ninguém se machuque e que deixemos de nos ferir mutuamente: está em nossas mãos, não nas dos políticos."

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sábado, 19 de dezembro de 2015

O deficit democrático

Wanderley Guilherme dos Santos, em Segunda opinião – “Não pertence ao entendimento decantado a opinião de que o sistema político brasileiro faliu. Amplificadores de emoções, os sentidos registram automaticamente os estímulos do ambiente, incapazes, porém, de discriminar entre aparência e realidade. Be-a-bá filosófico que, nem por isso, deixa de ser frequentemente esquecido no dia a dia da urgência ou do interesse. Panelas e palavrões dificultam a percepção de que há um ano a democracia brasileira vem sendo convocada diuturnamente a administrar conflitos de grande magnitude.


Com andamento simultâneo de processos criminais de inédita envergadura, não sossegam os sentidos e as emoções da população, provocados por lances de cinema mudo envolvendo policiais federais – a ultrapassagem aérea dos portões da casa de um indiciado foi um deles – e quase sempre surpreendentes, mas autorizados pelo Supremo Tribunal Federal. Aos trancos e barrancos, o Legislativo legisla, ora agradando, ora dessagrando, ora se omitindo, ora se atrevendo onde não lhe compete, o Executivo não arranha sequer suavemente os limites legais de sua competência, e vai extraindo decisões relevantes para a administração pública. A última foi a que aprovou o orçamento para o ano vindouro incorporando receitas com origem em matéria a ser digerida pelo Legislativo.

As sessões de quarta e quinta desta semana de dezembro do Supremo Tribunal Federal ofereceram memorável exemplo de discernimento, erudição profissional e argúcia lógica de encantar a qualquer espectador de boa fé. Não é de hoje, aliás, que o STF presenteia o País com desempenhos irretocáveis, sempre que os ministros se mantêm nos autos. Não quero esparramar os elogios que faria sem timidez, mas solicito a atenção para o seguinte fato: quando se imaginou, na história do Brasil, que Legislativo e Judiciário entrariam em recesso por dois meses, estando em pauta um pedido de impedimento da Presidenta da República? Sem falar que nem mesmo simples delegacias de polícia entraram em prontidão?

A turma de sempre, com o oportunismo de sempre, volta ao ramerrão da falência do sistema político, à necessidade de substituição do sistema eleitoral e de dar fim a umas duas dezenas de legendas partidárias. Já se deram conta que entre os partidos envolvidos nos processos em andamento não se encontram membros dos pequenos partidos? Que estão em cena o PT, o PMDB, o PP e o PSDB?

A tensão dos sentidos e emoções não são indicadores de deficit das instituições políticas. Ao contrário, são sintomas de profunda vitalidade. Falta só um pouco mais de entendimento, isto é, de juízo.

VIA

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domingo, 6 de dezembro de 2015

Nossos meninos, passarinhos do Capitólio contra a intolerância

Luis Nassif no Jornal GGN – “No pequeno palco da Vila Pompéia, quase um subterrâneo, Anna Luiza e Luiz Felipe Lima iniciaram o show de lançamento de seu CD. Trabalho de fôlego, de um casal excepcional. Ele, um pianista e compositor dos maiores. A qualidade do seu piano, as melodias lógicas, mas fugindo totalmente do convencional, indicam o enorme compositor que não se tornou prisioneiro da técnica excepcional do pianista. Ela, uma cantora das mais completas, com uma capacidade notável de intercalar uma interpretação quase narrativa com entonações intensas. No final do show, subiu ao pequeno palco o convidado, o grande Zeca Baleiro para apresentar duas parcerias com Luiz Felipe.



Atrás da pilastra do salão, sozinho em uma mesa pequena, fiquei curtindo o show e elucubrando sobre esses momentos de escuridão que acometem o país.

Tudo caminhava para ser “apenas” um show de excepcional musicalidade, quando Luiz Felipe desandou a falar. E começou a falar da molecada, dos estudantes que tomaram as ruas em defesa da “nossa escola”.

Uma emoção intensa tomou conta do ambiente.

No dia anterior havia almoçado com um político de peso e sua esposa. Quando o assunto derivou para a rapaziada, os olhos da jovem senhora encheram-se de lágrimas. Naquele momento, compadecida da agressividade com que aqueles meninos, da idade dos seus, foram tratados pela Polícia Militar.


São curiosos esses momentos. Na imagem do rapaz sendo arrastado pela PM, naquele corpo retorcido, no rosto expressando dor, o que me tocou foi a imagem dos tênis. O mesmo ocorreu na tragédia de Santa Maria, os jovens corpos estendidos no chão, também com seus tênis e calças cortadas, o uniforme dessa rapaziada informal, dos nossos filhos e netos.

Os tênis me lembram o ritual das mães chegando em casa com o tênis, presenteando os filhos. É como se os tênis simbolizassem o carinho materno, o aconchego, a segurança quando saírem pelo mundo pisando nos terrenos mais inóspitos. Por onde passarem, a benção de mãe está nos tênis que os conduzem. A agressão ao menino de tênis soava como um sacrilégio contra os sentimentos que ajudaram a construir a civilização.

Ali, no pequeno porão, o sentimento já era outro. E Luiz Felipe, de discurso tão transbordante quanto seu piano, ia definindo o momento. Era a emoção de perceber que havia vida na cidade. Debaixo daquele solo aparentemente infértil, da sequidão de deserto, da paisagem desolada, habitada apenas por animais pré-históricos, em meio às botas dos dinossauros, tiranossauros, pterodátilos, havia pequenas sementes que foram semeadas, como estão sendo semeadas por todo o Brasil. Delas, nasceram meninos e meninas que, confrontados com a escuridão, brotaram do solo como soldados de luzes, encarando a grande batalha precocemente, antes mesmo de se tornaram adultos, mas já devidamente preparados para a vida.

Já vi de tudo na vida, as passeatas de 64, de 68, a marcha das diretas, a campanha do impeachment. A lembrança que levarei para sempre será a da molecada que ocupou as ruas em defesa da “nossa escola”.

Sua imagem tomando as escolas, organizando-se espontaneamente para varrer o chão, limpar os banheiros, preparar a comida, a maneira como falavam com orgulho da “nossa escola”, o cuidado de quem cuida delas como do próprio quarto. Mais que isso, a serena atuação de registrar antecipadamente a maneira como estavam cuidando das escolas desmontou as armações de adultos idiotas, de imputar-lhe atos de vandalismo claramente montados por agentes do Estado.

Os olhares indignados da molecada encarando PMs musculosos, sua convicção de que estavam do lado certo, sua jovem indignação de quem já absorveu os sentimentos da cidadania, tudo isso passou a convicção de que, por mais barulhento que seja o discurso da intolerância, por mais ruidosa que seja a campanha do ódio, eles não passarão. Como os cisnes do Capitólio, o alerta será dado pelos nossos passarinhos.”

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quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Dilemas da atual luta de classes


Escrito por Wladimir Pomar(*), publicado no Correio da Cidadania – “As principais palavras de ordem das manifestações foram ostensivamente antidemocráticas. Impeachment, prisão para petistas, cadeia e fuzilamento de petistas e comunistas, atacados como traidores da pátria, andaram misturadas a outras motivações menores, indicando que à frente da organização e realização dessas manifestações estão os setores mais reacionários e trogloditas da sociedade brasileira.

Nesse sentido, o governo erra ao passar uma mensagem acrítica sobre o verdadeiro sentido das manifestações. Elas não foram democráticas. Foram antidemocráticas.

Luta de classes
É provável que muitos dos participantes nas manifestações não comunguem com aquelas palavras de ordem fascistas e nazistas. Porém, algo idêntico ocorreu com grande parte dos milhares de manifestantes em defesa de Deus, da Família e da Propriedade, que foram às ruas em 1964. Eles, provavelmente, também não comungavam com as mensagens golpistas daquela época, iguais em gênero e grau às atuais. Mas serviram de massa de manobra indispensável para dar um ar de legitimidade ao golpe militar. Depois, tarde demais, arrependeram-se pelos mais de 20 anos de ditadura militar.

Portanto, a esquerda, as forças progressistas e democráticas, aí incluído o governo, não podem ficar calados diante da natureza antidemocrática que marcou as manifestações de 16 de agosto. Manifestações democráticas não são, nem podem ser, utilizadas para fins antidemocráticos. É preciso dizer isso, abertamente e em alto som, para a alta classe média e para o conjunto da sociedade brasileira.

Por outro lado, as manifestações da alta classe média foram uma expressão do atual nível a que sua luta chegou. Foram menores do que as de março. A participação da juventude foi pífia. E a presença de qualquer representante das camadas populares foi zero, ou quase zero. Portanto, estão em descenso, e cada vez mais reduzidas à elite da classe média.
Em termos de comparação, o PT poderia dizer que possui mais militantes do que os cerca de um milhão de manifestantes que a direita colocou nas ruas. Poderia, mas não pode, porque também teria que reconhecer que perdeu a capacidade de mobilizar integralmente sua própria militância, como demonstraram as manifestações de 20 de agosto.

Apesar disso, essas manifestações da esquerda foram maiores do que suas mobilizações anteriores. Correm, porém, o perigo de perder o empuxo. Um enorme número de militantes petistas, e também de outros partidos de esquerda, compreende que deve ir às ruas contra rupturas antidemocráticas, mas não comunga com a direção do PT de que isso signifique apoiar o ajuste econômico antipopular do governo Dilma. Porém, como a crise econômica está se agravando e as conquistas dos anos anteriores estão escorrendo pelos ralos do ajuste fiscal e monetário, as manifestações populares podem ganhar impulso contra a política governamental.

Dizendo de outro modo, a luta de classes no Brasil começa a ficar escancarada, depois de anos de descenso. As classes populares engrossarão as manifestações da esquerda e irão para as ruas lutar contra aquilo que as prejudica e as incomoda. Não irão à luta contra seus próprios interesses e demandas, embora o combate à quebra de seus direitos democráticos seja vital. No entanto, tão ou mais vital é lutar contra as medidas que causam desemprego, cortes dos direitos trabalhistas e previdenciários, e retiram investimentos para a melhoria dos transportes urbanos, da saúde, da educação e da moradia.

Em outras palavras, ou o governo muda sua política econômica e apoia uma agenda popular, permitindo que a luta em defesa da democracia esteja associada à luta em defesa das medidas governamentais, ou o governo apoia a Agenda Renan (que também é a Agenda Levy) e coloca a ascensão da mobilização popular diante de um dilema, por falta de coesão entre as demandas populares e a política do governo.

Se a crise econômica continuar se agravando, a ascensão da mobilização popular pode assumir um caráter nitidamente contrário às políticas do governo. Nessas condições, independentemente dos esforços do PT e de outras correntes de esquerda, a mobilização popular pode ser apropriada pela direita e criar uma situação política totalmente nova e imprevisível. Os sábios do Planalto podem não acreditar nessa hipótese, mas depois não digam, como o general Assis Brasil, em 1964, chefe do “dispositivo militar de Jango”, que “ninguém avisou”.

(*)Wladimir Pomar é escritor e analista político.

VIA
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sábado, 23 de maio de 2015

‘Carta em Defesa da Democracia e da República’

Sul21- “(*) Um grupo de lideranças de diversas posições político-partidárias, intelectuais, produtores da área cultural e profissionais liberais divulgaram na quinta-feira (21) um manifesto em defesa da Democracia e da República, condenando as manifestações de ódio e violência que vêm se verificando na sociedade brasileira nos últimos meses. Os signatários propõem um “compromisso público com o esforço coletivo de que as controvérsias políticas, que o país atravessa, sejam resolvidas dentro da Carta de 88, fortalecendo os partidos e as instituições políticas do Estado, com respeito e diálogo a todos os movimentos legítimos dentro da ordem democrática”.

Carta em Defesa da Democracia e da República

Carta em Defesa da Democracia e da República

Os debates sobre os caminhos da construção democrática e republicana do Brasil são saudáveis e historicamente necessários. Somos uma nação em construção e uma democracia inconclusa. Alcançamos um bom patamar de liberdades políticas e de reorganização do Estado, mas ainda não alcançamos níveis de Justiça Social condizentes com a utopia democrática da Carta de 88. Os debates, portanto, e as disputas políticas que lhes informam, são bem vindos, mesmo que às vezes eles possam descambar para excessos.

Nós, líderes políticos de diversas formações ideológicas e partidos, acadêmicos, líderes de movimentos de diversos setores sociais, intelectuais, profissionais liberais de diversas áreas, líderes da nossa juventude, queremos publicamente assumir um compromisso de civilidade democrática e responsabilidade republicana, manifestando a nossa opinião -sobre este processo- aos nossos concidadãos, por cima das nossas divergências ideológicas e convicções programáticas.

Em outros momentos da História, nosso Rio Grande deu exemplos, não somente com seu espírito de luta, mas também com a sua capacidade de unificar-se na defesa da democracia e da Federação. Com isso, não renunciamos nem aos nossos compromissos políticos nem escamoteamos divergências, como no Pacto de Pedras Altas, em 1923, e no Movimento da Legalidade, em 1961.

Primeiro, queremos firmar um compromisso público com o esforço coletivo de que as controvérsias políticas, que o país atravessa, sejam resolvidas dentro da Carta de 88, através das instituições que esta carta elegeu, fortalecendo os partidos e as instituições políticas do Estado, com respeito e diálogo a todos os movimentos legítimos dentro da ordem democrática.
É conhecido o risco que estão correndo os Direitos Humanos Fundamentais e Sociais do nosso povo, por novas tentativas pouco dissimuladas de se violar, mesmo de forma indireta, cláusulas pétreas dessa mesma Constituição. A nossa tão sonhada quanto prorrogada Reforma Política, portanto, necessita pensar a hipótese de convocar o nosso povo para um plebiscito capaz de ouvi-lo sobre a conveniência, ou não, de se instituir uma nova Assembleia Constituinte, exclusiva e soberana, com poder suficiente para impedir qualquer retrocesso social sobre conquistas legais e históricas da nossa gente.

Segundo, um apelo a respeito da linguagem do debate. A fala, a linguagem, a palavra, traduzem na História, o ânimo, o conteúdo, a expressão humana emotiva ou racional, que desenha, não somente a ideia de quem diz, mas prepara a consciência de quem ouve. A linguagem de guerra, de controvérsia sem volta esconde, não somente a falta de ideias reitoras, mas também tendem a transformar adversários em inimigos e inimizades em violência sem razão.

Temos observado que o processo político em curso -rico e produtivo para democracia e para a luta contra corrupção- tem sido cercado por uma linguagem radicalizada -mormente difundida como verdades absolutas por analistas políticos das mais diversas origens- que tem transformado julgamento penal e o devido processo legal num elemento secundário de apuração de responsabilidades. Elas são fabricadas por uma forma inescrupulosa de julgamento sumário, através de uma linguagem virulenta e taxativa, tanto nas informações como nos debates que sucedem as informações. É o caminho da radicalização e da substituição do argumento pela violência, substituição da política pela imposição de ritos sumários alienados da controvérsia democrática.

Em todos os países que passaram por regimes de exceção ou por experiências totalitárias, foi necessário um grande esforço para fazer imperar o Estado de Direito e processar, de maneira nova e respeitosa, -sem que as pessoas inclusive abdiquem da radicalidade das suas posições- a transformação da democracia, não somente num processo político suportado pela liberdade, mas também num ritual educativo das novas gerações.

O presente Manifesto em prol de uma cultura política Republicana, ao criticar o autoritarismo nas mídias políticas e sociais, apoia também uma autocrítica do radicalismo político-partidário que pode obstruir,em casos muito importantes, a construção da democracia e da coisa pública em prol de toda sociedade, a res-pública.


(*) Participaram da elaboração do documento: Carlos Frederico Guazzelli, Celi Pinto, Cléber Prodanov, Flávio Koutzii, Giba Assis Brasil, Jacques Alfonsin, Jorge Furtado, Luís Augusto Fischer, Luiz Antonio de Assis Brasil, Manuela D’Ávila, Mauro Knijnik, Mercedes Cánepa, Montserrat Martins, Roberto Davis, Rodrigo Azevedo e Tarso Genro.


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sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Baderna é contra a democracia


- As lideranças que condenaram Lula depois que ele disse que o tratamento agressivo dispensado a Dilma Rousseff e ao PT por seus adversários poderia ser comparado aos crimes do nazismo merece uma reflexão. Não ouvimos reações tão enfáticas quando o ministro Gilmar Mendes aproveitou uma votação no Tribunal Superior Eleitoral para comparar o trabalho do marqueteiro João Santana ao desempenho de Joseph Goebbels, o ministro na propaganda de Adolf Hitler. O candidato Aécio Neves fez a mesma comparação e nada se ouviu. Idem para Fernando Meirelles, o cineasta engajado na campanha de Marina Silva.
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quinta-feira, 3 de julho de 2014

Wanderley: Dilma não promoveu um sistema democrático de informação

Por Miguel do Rosário, no Cafezinho

- O artigo do professor Wanderley Guilherme, reproduzido abaixo, chega em boa hora.
Chega no momento em que os jornalões tentam remover à força, do texto final de programa de governo, qualquer menção à “democratização da mídia”.
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quarta-feira, 4 de junho de 2014

Caçando blogueiros

Paulo Moreira Leite, na Istoé *

- Quem impede o debate sobre a democratização dos meios de comunicação força o jogo na sombra de verbas públicas - Vamos falar da substância das coisas. A caçada a blogueiros simpáticos às conquistas criadas no país depois da posse de Lula, em 2003, iniciada com a investigação sobre um suposto “bunker” do PT na prefeitura de Guarulhos, deve ser visto como aquilo que é.

Uma tentativa autoritária de silenciar vozes que divergem do monopólio político da mídia.

Sei que essa frase parece panfleto esquerdista mas não é.

Num país onde 141 milhões de eleitores foram transformados em reserva de mercado de uma midia monopolizada pelo pensamento conservador,  a internet tornou-se um espaço de resistência de uma sociedade contraditória e diversificada. Todo mundo – direita, esquerda, centro, nada, tudo, xixi, cocô – está ali.  

Vamos combinar. Hipocrisia demais não funciona. Truculência também não.

Até para ter um pouco de credibilidade, sem traços claros de ação eleitoral, a  denúncia contra blogueiros deveria ser acompanhada pela exposição pública da contabilidade dos grupos de mídia que loteiam cada minuto de sua programação e cada centímetro quadrado de suas páginas com milionárias verbas de publicidade federal, estatual, municipal – sem falar em empresas estatais.

Estamos falando de serviços  de mendicância publicitária, de caráter milionário.

Seguido o método empregado em Guarulhos, seria didático exibir cada cifrão ao lado de cada pacotão de texto e fotos, concorda? Teriamos bom circo por meses e meses.

Tentar criminalizar blogueiros pela denuncia de gastos públicos – uns caraminguás, pelos padrões de mercado  -- é um esforço que apenas trái uma visão contrária à liberdade de imprensa, típica de quem não aceita   diversidade nem contraponto, mas apenas elogios e submissão. É o pensamento único em método linha dura e capa de falso moralismo. Apesar do escândalo, é uma denuncia verbal-investigativa. Nada se provou de ilegal.

Nós sabemos qual é a questão de fundo.

Enquanto não se aceitar o debate sobre democratização dos meios de comunicação, que poderia permitir uma discussão pública, às claras, expondo imensos interesses econômico e politicos em conflito, como se fez em vários países avançados do capitalismo, o jogo nas sombras será inevitável. Isso porque as pessoas precisam receber informações, falar, conversar, dar opiniões. Elas concordam, discordam, rejeitam e querem mais.

Não adianta adiar a chegada de um novo grau de democracia e  civilização. Ela transborda. Na agonia do regime de 1964, quando a imprensa amiga dos generais chegava a proteger a ditadura por todos os meios -- inclusive derrotas eleitorais eram transformadas em vitória -- os governadores de oposição financiavam nova publicações, sem ranço e sem comprometimento. Enquanto isso, até jornais alternativos, de faturamento menor do que a quitanda da esquina, eram alvo de uma devassa permanente por parte da ditadura. Empresários privados eram pressionados a saber quem ajudar -- e a quem negar ajuda.
Aparelhismo?

Os últimos anos mostraram – e os blogueiros expressam isso -- que o país não cabe nos limites mentais, políticos, culturais, do ideário conservador. Quer mais, quer diferente e por três vezes disse isso nas urnas. A internet e os blogueiros expressam isso. Têm este direito.

Alguma dúvida?

Este é o debate.


*Paulo Moreira Leite, é Diretor da Sucursal da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".


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terça-feira, 8 de abril de 2014

Documentário resgata política, futebol e rock and roll na ditadura

Por Xandra Stefanel, em Rede Brasil Atual - 

“Pra todos aqueles que lutaram desde 1964, que morreram, que sumiram, que foram torturados, presos e exilados, a Democracia Corintiana bateu o pênalti”, afirma o ex-jogador e hoje comentarista Walter Casagrande no documentário Democracia em Branco e Preto, que será exibido na edição de 2014 da mostra competitiva do Festival É Tudo Verdade nos dias 5 e 6 de abril, no Rio de Janeiro, e 10 e 11, em São Paulo.
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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

O grande perigo está de volta

Algumas palavras sobre a manifestação ocorrida ontem em São Paulo e suas consequências. Antes, uma observação importante. Defendo manifestações democráticas. Não venham me chantagear com esse papo de “criminalizar” movimentos sociais. Mas já aprendi uma coisa, de uns tempos para cá. Manifestações com presença de mascarados não são democráticas.
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