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quarta-feira, 10 de abril de 2024

STF conclui julgamento e rejeita 'poder moderador' das Forças Armadas

Por José Higídio, no Conjur: Não está entre as atribuições das Forças Armadas atuar como "poder moderador", assim como não há na Constituição trecho que permita a interpretação de que militares podem se intrometer no funcionamento dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. 

www.seuguara.com.br/STF/Forças Armadas/poder moderador/

Este foi o entendimento unânime do Plenário do Supremo Tribunal Federal ao esclarecer os limites de atuação das Forças Armadas em uma ação ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT). A sessão virtual teve início no dia 29/03 e se encerrou às 23h59 desta segunda-feira (8/4).

O PDT contestava a interpretação de que as Forças Armadas podem intervir no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, de forma a atuar como "poder moderador".


Contexto

O partido pediu que o STF limitasse o uso das Forças Armadas, nas destinações previstas no artigo 142 da Constituição, aos casos de intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio.

O dispositivo em questão estabelece como funções das Forças Armadas a defesa a pátria, a garantia dos poderes constitucionais e a garantia da lei e da ordem (GLO) por iniciativa de qualquer um dos três poderes.


A legenda ainda questionou dispositivos da Lei Complementar 97/1999, que regulamenta o uso das Forças Armadas. Um deles é o artigo 1º, que define as Forças Armadas como "instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do presidente da República". 

O pedido do PDT foi para se fixar que a "autoridade suprema do presidente da República" se restringe às suas competências constitucionais: exercer a direção superior das Forças Armadas; emitir decretos e regulamentos; definir regras sobre sua organização e funcionamento; extinguir funções ou cargos ou promovê-los; nomear seus comandantes; promover seus oficiais-generais; e nomeá-los para cargos privativos.


Também foram apontados pelo partido trechos do artigo 15 da lei complementar, que atribui ao presidente da República a responsabilidade pelo uso das Forças Armadas nas suas funções constitucionais e traz regras para a atuação na GLO. 

A sigla pediu a restrição do emprego das Forças Armadas nas suas três funções. No caso da defesa da pátria, o pedido era para limitação às situações de intervenção para repelir invasão estrangeira e de estado de sítio para guerra ou de resposta a agressão estrangeira.


Na garantia dos poderes constitucionais, a sugestão foi a limitação aos casos de intervenção "para garantir o livre exercício de qualquer dos poderes nas unidades da Federação" e de estado de defesa "para preservar ou prontamente restabelecer a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e eminente instabilidade institucional". 

Quanto à GLO, a ideia era limitá-la a situações extraordinárias de defesa da autonomia federativa, do Estado e das instituições democráticas - justamente as hipóteses de intervenção, estado de defesa e de sítio -, sem possibilidade de aplicação a atividades ordinárias de segurança pública. 


Por fim, o PDT alegou a inconstitucionalidade do §1º do artigo 15 da lei complementar, que atribui ao presidente da República a competência para decidir a respeito do emprego das Forças Armadas - seja por iniciativa própria, seja em atendimento a pedido dos outros poderes. O argumento da agremiação foi que não há hierarquia entre os poderes.

A tese de que os militares podem ser empregados para moderar conflitos entre os poderes e conter um poder que esteja extrapolando as suas funções é definida pelo advogado e professor Ives Gandra da Silva Martins


Votos

Em seu voto, Fux repetiu os argumentos usados na sua decisão liminar de 2020, que concedeu parcialmente os pedidos do PDT de deu interpretação conforme a Constituição aos dispositivos trazidos pelo partido. Todos os ministros acompanharam sua tese. 

O relator estabeleceu quatro pontos sobre o assunto: 

  1. A missão institucional das Forças Armadas não envolve o exercício de um poder moderador entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário;
  2. Não é possível qualquer interpretação que permita o uso das Forças Armadas para "indevidas intromissões" no funcionamento dos outros poderes; 
  3. A prerrogativa do presidente da República de autorizar o emprego das Forças Armadas "não pode ser exercida contra os próprios poderes entre si";
  4. O uso das Forças Armadas para a GLO não se limita às hipóteses de intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio, mas é voltado ao "excepcional enfrentamento de grave e concreta violação à segurança pública interna" e deve ser aplicado "em caráter subsidiário, após o esgotamento dos mecanismos ordinários e preferenciais de preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio", por meio da atuação colaborativa entre as instituições estatais e sujeita ao controle permanente dos demais poderes.   


O ministro explicou que a garantia dos poderes constitucionais, prevista o artigo 142 da Constituição, "não comporta qualquer interpretação que admita o emprego das Forças Armadas para a defesa de um poder contra o outro". 

Segundo ele, a atuação dos militares se refere à proteção de todos os poderes "contra ameaças alheias". Ou seja, é uma forma de defesa das instituições democráticas contra "ameaças de golpe, sublevação armada ou movimentos desse tipo".

Por isso, o relator rejeitou a interpretação de que a atribuição de garantia dos poderes constitucionais permite a intervenção das Forças Armadas nos demais poderes ou na relação entre uns e outros. Isso violaria a separação de poderes. 


Na visão do magistrado, a tese do poder moderador das Forças Armadas pressupõe que elas têm neutralidade, autonomia administrativa e distanciamento dos três poderes. Na verdade, a própria Constituição define o presidente da República como o "comandante supremo" das Forças Armadas.

Ou seja, considerá-las um poder moderador seria o mesmo que reconhecer o Executivo como um superpoder, acima dos demais. Essa interpretação está "dissociada de todos os princípios constitucionais estruturantes da ordem democrática brasileira".


Fux explicou que a Constituição prevê as medidas excepcionais que podem ser aplicadas para soluções de crises. Segundo ele, "não se observa no arcabouço constitucionalmente previsto qualquer espaço à tese de intervenção militar, tampouco de atuação moderadora das Forças Armadas". 

Quanto à "autoridade suprema" do presidente, o ministro destacou que isso está relacionado à hierarquia e à disciplina da conduta militar. Mas essa autoridade não pode  superar a separação e a harmonia entre os poderes.


Pedidos negados

Por outro lado, o relator não viu razão para limitar o exercício das missões constitucionais das Forças Armadas aos casos de intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio. Caso aceitasse esse pedido do PDT, o STF faria um "recorte interpretativo que a própria Constituição não pretendeu efetuar", segundo Fux.

Da mesma forma, a restrição do alcance da defesa da pátria aos casos elencados pelo partido "esvaziaria a previsão constitucional do artigo 142 e reduziria a eficácia dos dispositivos constitucionais que tratam a atuação internacional do país".


Fux entendeu que tais limitações impediriam a atuação dos militares em outras missões relevantes para o interesse nacional. Ele lembrou que, dentro conceito de defesa da pátria, existem diversas possibilidades de uso das Forças Armadas para proteção das faixas de fronteiras e dos espaços aéreos e marítimo, mesmo em períodos de paz. As missões de controle do fluxo de migração na fronteira com a Venezuela são exemplo disso.


De qualquer forma, o ministro considerou importante ressaltar que o emprego das Forças Armadas fora das hipóteses de intervenção, estado de defesa e estado de sítio "deve estar inscrito em limites constitucionais e legais que não poder ser desconsiderados".

Tanto em cenários de normalidade quanto em situações de guerra e defesa da soberania, o presidente da República não tem poderes absolutos sobre as Forças Armadas, explicou o magistrado.

O presidente se submete a "mecanismos de controle explicitamente delineados no texto constitucional". Por exemplo, só pode declarar guerra ou celebrar a paz com autorização prévia do Congresso. Ou seja, os outros poderes não são submissos ao Executivo.


O relator também não viu inconstitucionalidade no dispositivo que atribui ao presidente a competência para decidir a respeito do emprego das Forças Armadas.

Para ele, não há "razão jurídica" para reduzir esta prerrogativa, uma vez fixado que o líder do Executivo "exerce o poder de supervisão administrativo-orçamentária desse ramo estatal" e que ele e os chefes dos outros poderes não podem usar as Forças Armadas "para o exercício de tarefas não expressamente previstas na Constituição".

Assim, aceitar o pedido do PDT significaria admitir que o chefe de qualquer poder tem "ascensão e hierarquia" sobre as Forças Armadas, o que "não coaduna com a disciplina constitucional".


Ressalvas

Flavio Dino concordou com as conclusões de Fux, mas acrescentou a determinação para que o acórdão do STF seja enviado ao ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, para ser difundido a todas as organizações militares, incluindo escolas de formação e aperfeiçoamento.

Embora não tenha obtido maioria de votos, esse acréscimo foi incorporado também aos votos dos ministros Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli.


Segundo Dino, o objetivo dessa medida é eliminar "desinformações que alcançaram alguns membros das Forças Armadas - com efeitos práticos escassos, mas merecedores de máxima atenção pelo elevado potencial deletério à pátria".

Assim como Dino, Gilmar Mendes entendeu que a íntegra do acórdão deve ser enviado ao ministro da Defesa, a fim de que seja efetivada a sua devida divulgação para todas as organizações militares.

 

Em seu voto, Gilmar afirmou que não há na Constituição previsão que permita a interpretação de que as Forças Armadas poderiam intervir no Executivo, Legislativo e Judiciário.

"O texto do art. 142 da Constituição não impõe ao intérprete nenhuma espécie de dificuldade hermenêutica. A hermenêutica da baioneta não cabe na Constituição. A sociedade brasileira nada tem a ganhar com a polarização dos quartéis e tampouco a Constituição de 1988 a admite", disse o decano da Corte.

Segundo o ministro, a função institucional da Forças Armadas não acomoda o exercício de poder moderador, nem admite qualquer interpretação que permita a indevida intromissão de militares nos poderes.


De acordo com o decano, a utilização exagerada de missões de garantia da lei e da ordem deu às Forças Armadas protagonismo político, o que serviu de sustentáculo para a "despropositada construção teórica" de que a Constituição autorizaria que os militares atuassem como "poder moderador".

"A tentativa abjeta e infame de invasão das sedes dos três poderes em 8 de janeiro de 2023 não será devidamente compreendida se dissociada desse processo de retomada do protagonismo político das altas cúpulas militares", prosseguiu o ministro.


[Clique aqui para ler o voto de cada ministro do STF, no final da matéria]


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sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

Minuta golpista na casa de ex-ministro de Bolsonaro - e agora?

Redação Migalhas: A polícia Federal encontrou, em busca e apreensão na residência de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, uma proposta de decreto (veja a íntegra abaixo) para que Bolsonaro instaurasse estado de defesa na sede do TSE. O documento de três páginas, feito em computador, foi encontrado no armário do ex-ministro durante busca e apreensão realizada na última terça-feira, 10.
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sábado, 25 de setembro de 2021

STF reagiu à altura de sua missão constitucional, diz Fux

Do Conjur: Ao enfrentar comportamentos antidemocráticos, o Supremo Tribunal Federal "reagiu à altura da sua missão constitucional, que é a defesa intransigente da democracia", afirmou o presidente da Corte, Luiz Fux, que completou seu primeiro ano de gestão no último dia 10.
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segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Política: 'STF confirma que recondução na Câmara e no Senado é inconstitucional'

www.seuguara.com.br/Rodrigo Mais/Davi Alcolumbre/Câmara/Senado/

Por Rafa Santos e Emerson Voltare, no Conjur - A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal decidiu, no final da noite deste domingo (6/12), barrar a possibilidade de reeleição dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado.
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terça-feira, 2 de junho de 2020

Entidades pedem defesa das instituições e da democracia

Seis entidades da advocacia publicaram nesta terça-feira (2/6) nota em defesa do estado democrático de direito e do respeito às instituições da República. Nesta segunda (1/6), diversas associações de classe e professores uniram-se para pedir equilíbrio e sensatez para garantir o diálogo e manter a harmonia e independência dos Poderes.
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sexta-feira, 22 de maio de 2020

Política: 'Se não cassar Bia Kicis, Câmara pavimenta caminho da ditadura. Por Jeferson Miola

Por Jeferson Miola, em seu blog - No dia em que o Brasil alcançou o recorde tétrico de 1.188 perdas humanas pelo coronavírus, a bolsonarista Bia Kicis/PSL-SP subiu na tribuna da Câmara dos Deputados não para se condoer e se solidarizar com as milhares de famílias brasileira dilaceradas pelo luto, mas para apregoar mais morte: a morte final da democracia; a morte do pouco que ainda resta de ordem jurídica e de Direito no estado de exceção.
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segunda-feira, 27 de abril de 2020

Juíza manda ministro da Defesa excluir nota que defendeu golpe de 1964

Por Danilo Vital, no Conjur: A utilização de um site oficial de um órgão do Executivo federal para enaltecer o golpe de 1964 desvia-se das finalidades da Constituição de 1988, que rechaça regimes autoritários, sobreleva os direitos humanos e exige caráter educativo e informativo da publicidade institucional.
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domingo, 28 de julho de 2019

Portaria sobre deportação viola direitos e a Constituição, diz DPU (Defensoria Pública da União)

Por Gabriela Coelho, no Conjur - É preocupante constatar a criação, por portaria ministerial, de um conceito jurídico indeterminado chamado "pessoa perigosa", que remete às piores lembranças autoritárias do Direito Migratório brasileiro, afirmou a Defensoria Pública da União, ao comentar a Portaria 666, publica pelo Ministério da Justiça nesta sesta-feira (26/7).
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terça-feira, 26 de março de 2019

Por que Lula, a exemplo de Temer, ainda não teve suas garantias constitucionais asseguradas? Por Carlos Fernandes

Por Carlos Fernandes, no DCM - O desembargador do TRF-2 Antônio Ivan Ithié revogou as prisões preventivas do ex-presidente Michel Temer, do ex-ministro Moreira Franco e de outros seis investigados detidos por decisão do juiz federal Marcelo Bretas. A decisão do desembargador resgata da vala comum do justiciamento em série posto em voga pela Operação Lava Jato os mais básicos conceitos das garantias constitucionais previstas em nossa Carta Magna.
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quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Sobre a polêmica 'Escola sem Partido'

A estudante de Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e assessora de conteúdo do Politize, Isabela Souza, publicou no site uma importante matéria que nos ajuda a entender melhor a polêmica criada em torno do assunto "Escola sem Partido". "O que está em jogo é o modelo de educação escolar em vigência no Brasil. Afinal, a Escola sem Partido garante a imparcialidade ideológica na educação pública ou cria uma lei da mordaça para os professores?"
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domingo, 7 de maio de 2017

“Se é para fazer economia, é com as aposentadorias mais altas que ela precisa ser feita”


Por Beatriz Sanz, no El País/Brasil - "Marcelo Medeiros, professor da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), além de pesquisador visitante da Universidade de Yale, está muito atento ao debate sobre a reforma da Previdência. Para ele, a reforma é necessária, mas não pode ser feita às pressas, nem deixar de lado as pessoas mais vulneráveis. Ele acredita que o Governo precisa rever algumas concessões, pensar em longo prazo e corrigir medidas como excluir estados e municípios da reforma.

Marcelo Medeiros na UnB - ARQUIVO PESSOAL
Pergunta. A reforma da Previdência é necessária?

Resposta. Esta reforma não vai ser definitiva. O Brasil precisa de uma reforma da Previdência agora e, provavelmente, de outra em um futuro não muito distante. Mas ser a favor de reforma não significa aceitar qualquer reforma. Não dá para ignorar que o país é muito desigual e que a Previdência reflete isso. Uma fatia pequena das aposentadorias e pensões é responsável pela maior parte do gasto previdenciário. Se é para fazer economia, é nessas aposentadorias mais altas que a economia precisa ser feita. Tratar todo mundo da mesma maneira é injusto. Os mais pobres, que entram e saem do setor informal, têm que ter mecanismos de proteção dentro da reforma, senão a carga em cima deles é excessiva. A responsabilidade fiscal tem que andar de mãos dadas com a responsabilidade social.

P. Este é o momento ideal para fazer a reforma?

R. Seria melhor se FHC ou Lula tivessem feito. Os dois tinham muito apoio popular, tentaram e avançaram, mas muito pouco. Este é um momento político ruim para discutir a Previdência. O governo está fragilizado porque, na prática, não foi eleito para isso e o Congresso está sob acusações graves, tem pouca legitimidade para mudanças constitucionais. O risco de tomar decisões sem legitimidade é que elas podem ser mais facilmente revertidas no futuro. Veja a PEC que limitou os gastos públicos, por exemplo. É o Congresso fragilizado de hoje tentando mandar no orçamento de um Congresso que ainda vai ser eleito daqui a quinze anos. É difícil políticos aceitarem isso, é provável é que a PEC seja desmontada por governos futuros.

Mas o pior não é isso. Decisões apressadas e sem convencimento generalizado criam condições para que surjam governos populistas. Na próxima década teremos um país saindo de uma recessão, com restrição a gastos públicos, pressões de natureza econômica e social, e as duas forças políticas de equilíbrio, PT e PSDB, extremamente fragilizadas internamente e externamente. Em política é difícil prever o futuro, mas o caldo de cultura para o populismo está criado. Não é o caso de um embate entre direita e esquerda, é outra coisa. Populistas não têm ideologia.

P. Por que você diz que a reforma não é definitiva?

R. Em política e economia não existe isso de tudo ou nada. Não existe reforma definitiva, porque o mundo muda e as políticas têm que acompanhar a mudança. Nosso modelo de Previdência se encaixa bem em uma sociedade em que todo mundo tem emprego estável e de carteira assinada. Funcionaria bem na Europade antigamente. Mas o trabalho no mundo inteiro está passando por uma transição, cada vez menos gente trabalha como empregado estável. Estão crescendo os trabalhos temporários por conta própria, como se a pessoa fosse uma empresa e não um empregado. Isso tem implicações para a Previdência, pois quem faz as contribuições para financiar a Previdência são os empregados formais. Advogados e médicos são exemplos da mudança, eles trabalham como empresas individuais ou coletivas e por isso pagam bem menos à Previdência. Isso também acontece com pessoas de renda mais baixa, a empregada doméstica regular vai sendo substituída pela diarista. Se isso continuar a forma de financiamento [da Previdência] terá que ser outra, algo como o Imposto de Renda, por exemplo. Como as mudanças já estão ocorrendo, é melhor começar a pensar nelas agora.

P: Mas e o trabalho hoje?

R: O mercado de trabalho no Brasil hoje tem três características que são importantes para a Previdência: muita informalidade, muita gente com renda baixa e uma diferenciação entre homens e mulheres. Muita informalidade significa que as pessoas não têm carteira assinada e, por isso, é difícil para elas contribuir para Previdência durante anos seguidos até atingir o mínimo de 25 anos para se aposentar. Renda baixa agrava o problema, pois é difícil para quem ganha pouco deixar de gastar com a família para contribuir como autônomo. Para cuidar de filhos e netos mulheres caem na informalidade ou saem do emprego durante um certo tempo e isso reduz seu tempo de contribuição, tornando mais difícil sua aposentadoria. Não se trata exatamente de uma escolha, mulheres não têm alternativas como creches e escolas em tempo integral. Combine essas coisas e a conclusão é uma só: existe uma parte grande da população brasileira que trabalha muito, mas terá grande dificuldade para cumprir 25 anos de contribuição e se aposentar. Os cálculos são de que para mais de um terço da população, esses 25 anos são tempo demais. Para as mulheres, aliás, é bem pior, quase metade terá grande dificuldade. É errado tratar todos da mesma forma, aposentadorias de baixa renda têm que ser mais acessíveis. Não é uma questão de mexer nas idades e sim nos tempos de contribuição para aposentadorias no valor mínimo.

P. Em um artigo escrito para a Folha de S. Paulo, economistas do governo afirmam que a reforma da Previdência tem que incluir o BPC (Benefício de Prestação Continuada) por conta de “distorções” no programa. Qual sua opinião à respeito?

R. Distorções no BPC não justificam reduzir seu valor. Se o BPC tem problemas administrativos, eles não vão ser resolvidos pela reforma da Previdência, tem que ser resolvido na esfera administrativa. Coisa, aliás, sobre a qual o governo não tem que reclamar, afinal ele tem o dever de administrar direito o BPC. Toda política precisa de ajustes contínuos, o BPC não é diferente. O governo se queixa de concessão por juízes, mas é preciso saber melhor o que está acontecendo. As linhas de pobreza do BPC são mais baixas que as do Bolsa Família, parte do problema pode ser que os juízes estão entendendo que isso é duro demais com idosos pobres. Não há nada de errado em levantar um debate público sobre quem merece proteção social no país e criar leis que reflitam escolhas sobre o que fazer com os idosos. Não precisa mudar a Constituição para isso. O que não pode haver é antipatia em relação à assistência social.

P. Então a reforma vai acabar sendo paga só pelos pobres?

R. Isso não é verdade. Há regras na proposta de reforma que são muito positivas e não afetam tanto os mais pobres. Um exemplo é o fim da aposentadoria por tempo de serviço. Essa medida afeta todo mundo, mas afeta mais os trabalhadores de renda mais alta. Mas existem trabalhadores de renda mais alta que estão sendo poupados sem nenhuma justificativa econômica para isso, só pelo receio de seu poder político. É muito ruim ter uma reforma dura com as mulheres e com os trabalhadores do setor informal enquanto militares e funcionários públicos de Estados e Municípios são deixados de fora. Não tem problema ter desigualdade se ela for criada para proteger os mais pobres. Mas então você cria a mesma regra para ricos e pobres e o primeiro gesto é dizer “é igual para todo mundo exceto certos grupos onde estão os mais ricos”? Não dá para começar uma reforma de forma ambígua e esperar que todo mundo confie na promessa de que esse problema vai ser enfrentado depois. Tem que haver um prazo limite para que Estados e Municípios façam suas reformas e a lei para mudar a aposentadoria dos militares tem que ser apresentada dentro do pacote político que discute a reforma geral.

P. A reforma da Previdência pode ter um impacto negativo na economia?

R. Tem impacto na economia, mas não dá para especular. As mudanças não têm grande impacto agora, vão começar a ser sentidas daqui a uma década. É difícil porque a gente não sabe como o Brasil será daqui a dez, vinte anos, principalmente no cenário atual onde a instabilidade é forte.

P. Como a reforma da Previdência pode impactar na vida das mulheres?

R. Na proposta inicial não havia preocupação alguma com as mulheres. O Congresso quer mudar isso. Se a proposta inicial não for alterada, o impacto negativo na vida das mulheres vai ser forte e não está claro que a economia feita compense. Por exemplo, há a ideia de impedir o acúmulo de aposentadorias e pensões. Isso por um lado tem que ser feito, para controlar aposentadorias muito altas. Mas precisa ser mais bem calibrado para aposentadorias de valor baixo, usando, por exemplo, um teto para o que pode ser acumulado, podendo até mesmo haver um certo desconto no valor final. Isso está sendo discutido agora e é mais sensato do que simplesmente proibir qualquer tipo de acumulação.

Tem muita gente falando de idades mínimas, mas para as mulheres mais importante que as idades são os tempos de contribuição obrigatórios, porque as mulheres saem do emprego formal para cuidar das crianças e demoram um pouco para voltar. Como isso não vai mudar facilmente, precisa ser levado em conta pela Previdência, os tempos de contribuição mínimos das mulheres têm que ser menores que os dos homens, ao menos para as aposentadorias de valor mais baixo.

Tudo isso tem um custo, portanto é preciso discutir as alternativas levando os gastos em consideração. Aliás, tem que discutir os custos dessas e das outras alternativas. A pergunta tem que ser “com custo do benefício que vamos dar para determinada categoria profissional, o que nós poderíamos fazer pelas mulheres ou pelos trabalhadores do setor informal”? A reforma foi feita correndo e não se discutiu alternativas. Não teve um debate muito claro. E é evidente que o Governo está tentando apressar o Congresso. Mas nós precisamos de uma reforma que seja socialmente e fiscalmente responsável. Uma coisa não pode existir sem a outra."

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domingo, 2 de abril de 2017

Reforma trabalhista: ataques aos direitos dos trabalhadores são “desastre total”, diz sub-procurador do trabalho


Por Helena Borges, no Intercept – O “presidente reformista” quer fechar o ano com seis reformas: entre elas, a da Previdência e a Trabalhista. Acompanhando de perto os movimentos palacianos — e muitas vezes demonstrando resistência a eles — o ex-procurador-geral do Trabalho e atual subprocurador-geral do Trabalho Luís Antônio Camargo de Melo participa de audiências no Congresso sobre a Reforma Trabalhista.
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quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Política: PEC 55 é aprovada no Senado em primeiro turno

El País - "O Senado aprovou na noite desta terça-feira a Proposta de Emenda à Constituição que estabelece um teto para os gastos públicos. Por 61 votos a 14, o texto base da PEC 55 – antiga PEC 241 – foi aprovado na primeira votação, mas ainda passará por mais três sessões de discussão e mais uma votação.



A proposta, que prevê o congelamento dos gastos públicos por até 20 anos, foi aprovada em dois turnos pela Câmara antes de chegar ao Senado. Tornou-se prioridade do Governo Michel Temer que vê na medida a possibilidade de reequilibrar as contas públicas. Por outro lado, a proposta sofre oposição de parte dos especialistas e ativistas, que veem na regra ameaça a investimentos em saúde e educação.

Reprodução/@SenadoFederal
Poucas horas antes de a sessão no Senado começar, milhares de manifestantes tomaram as ruas no entorno do Congresso para protestar contra a PEC e pedir pelo fora Temer. A Polícia usou bombas de gás para reprimir a manifestação, que seguiu pelo início da noite. Não há registros oficiais sobre feridos."


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sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Não há harmonia entre os três poderes da República

Vivemos tempos de desarmonia entre os três poderes da República. Consumado o golpe político que afastou Dilma Rousseff, eleita democraticamente presidente do Brasil, o Poder Executivo assumido pelo vice-presidente Michel Temer perdeu o rumo da convivência pacífica e da harmonia constitucional que deveria existir entre o Poder Judiciário, o Poder Legislativo e o Poder Executivo.
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sábado, 24 de setembro de 2016

Política: ‘Todos são iguais perante a lei?’

"No Estado Democrático de Direito, o artigo 5° da Constituição Brasileira garante: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Iguais perante a Lei
A Constituição Brasileira também prevê o princípio da presunção de inocência no inciso LVII do mesmo artigo: "Ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Garante, ainda, habeas corpus, no inciso LXVIII: "conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder".

Isto posto, como explicar a notória seletividade da Justiça brasileira em investigações contra partidos e personalidades que atuam no campo da esquerda e a isenção de partidos e personalidades que atuam no campo da direita?
 
Trata-se de um flagrante desrespeito à Carta Maior, no caso, a carta constitucional brasileira.

A estratégia, todos conhecemos. Surge uma denúncia em um dos veículos do oligopólio midiático. Se for contra membros da base de apoio do governo de “plantão”, os anteriores, ela se torna instrumento de investigação e permanece durante semanas, meses, anos nas manchetes desses jornalões massacrando qualquer princípio de presunção de inocência.

O inverso é verdadeiro e se encaixa nas denúncias contra o governo de “plantão”, o atual, as notícias ganham as manchetes em um dia e somem no outro, sem qualquer investigação.
 
No que se refere às investigações da Polícia Federal, como visto em março de 2016, quando foi grampeada a própria presidência da República (G1, 16.03.2016), o que temos são abusos de autoridade inclusive reconhecidos pela Suprema Corte do país.
 
Um explícito abuso de poder.

Neste vale tudo, criam-se as condições para a ruptura da ordem institucional do país, chegando ao absurdo de levar ao poder um grupo de políticos contra os quais pesam seríssimas acusações.
 
O escárnio é mais um capítulo do espetáculo de violência na República brasileira, aplaudida por milhares de brasileiros manipulados, dia sim e no outro também, por uma máquina política ancorada na mídia, na corrupção política e em um modelo de judicialização nunca visto no país.
 
Segue abaixo uma lista de denúncias que saíram na imprensa brasileira envolvendo políticos intocáveis, até agora. Resta a pergunta: se “todos são iguais perante a lei”, quando o Supremo Tribunal Federal irá investigar essas pessoas?

[Logo abaixo, assista alguns vídeos com áudios que revelam a trama do golpe, que culminou no impeachment da presidente Dilma Rousseff. Ardilosamente arquitetado pelo grupo de maus políticos, que tomou o poder de forma ilegítima golpeando de morte o processo democrático em curso no Brasil. Se a Operação Lava Jato comandada pelo probo juiz César Moro, estivesse verdadeiramente comprometida na luta contra a corrupção, de forma irrestrita e imparcial, não seria tão seletiva em relação a determinados atores e partidos políticos. Não existe razão para não determinar ações jurídicas visando atingir exclusivamente algumas agremiações. Tendo em vista que outros partidos comprovadamente estão envolvidos da mesma forma, no esquema de corrupção cometendo os mesmos crimes. Inclusive partidos de direita, como PSDB, evidentemente poupado das investigações].

Michel Temer: o presidente interino e golpista já foi citado por cinco delatores na Lava Jato e aparece em planilhas sob investigação da PF. Confiram as denúncias de Marcelo Odebrecht (OESP, 06.08.2016); Sérgio Machado ex-presidente da Transpetro, (G1, 15.06.2016); planilhas apreendidas de um executivo da Camargo Corrêa (OESP, 08.12.2014); Júlio Camargo, ex-consultor da Toyo Setal, (OESP, 22.08.2015); Léo Pinheiro, presidente da OAS (FSP,19.12.2015) e Delcídio do Amaral, (OESP, 15.03.2016).

José Serra: surge na delação de funcionários da Odebrecht e de Leo Pinheiro, ex-presidente da OAS (JB, 17.09.2016), (FSP, 07.08.2016), (Congresso em Foco,24.03.2016). Denúncias de irregularidades em suas gestões no governo de São Paulo também aparecem (G1, 28.01.2016). As reportagens “Operação Abafa, como o tucanato se mantém no poder” (CM, 03.02.2016), A corrupção endêmica e o aparelhamento tucano em SP (CM, 16.02.2016) e “Tucano bom é tucano solto?” (CM, 11.02.2016) reúnem várias dessas denúncias.

Eliseu Padilha: ministro-chefe da Casa Civil, surge nas delações de Delcídio do Amaral (O Globo, 25.04.2016), Marcelo Odebrecht (OESP, 06.08.2016), sendo réu em ação civil de improbidade administrativa (FSP, 17.05.2016).

Romero Jucá: citado na delação de Flávio Barros, ex-executivo da Andrade Gutierrez (OESP, 20.07.2016), de Nelson Mello, do Grupo Hypermarcas (OESP,28.06.2016), de Paulo Roberto da Costa e Alexandre Yousseff (Valor, 09.03.2016), de Delcídio do Amaral (O Globo, 09.03.2016) e Sérgio Machado (G1, 15.06.2016).

Governo FHC: irregularidades da Era FHC surgiram nas delações de Pedro Barusco (OESP, 05.02.2015), Nestor Cerveró (OESP, 11.01.2016) e (OESP,02.06.2016), e Delcídio do Amaral (El País, 03.05.2016). Confira as reportagens “Tucano bom é tucano solto?”(CM, 11.02.2016), “A sociologia da honestidade de FHC” (CM, 13.01.2016) e “FHC, o pior cabo eleitoral do país” (CM, 08.01.2016) com mais denúncias.

Governo Alckmin: citado em um relatório da PF (O Globo, 26.03.2016), além de denúncias de irregularidades envolvendo doleiros da Lava Jato (VioMundo,18.12.2015). Confira as reportagens “Operação Abafa, como o tucanato se mantém no poder” (CM, 03.02.2016), “A corrupção endêmica e o aparelhamento tucano em SP” (CM, 16.02.2016) e “Tucano bom é tucano solto?” (CM,11.02.2016) que reúnem várias denúncias.

Eduardo Cunha: citado pelo ex-executivo da Toyo Setal, Júlio Camargo (O Globo, 16.07.2015), também por envolvimento na obra do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro (O Globo, 16.12.2015), além de ser réu em duas ações penais no STF e uma denúncia sobre desvios do FGTS (OESP, 01.07.2016).

Moreira Franco: secretário do Programa de Parcerias de Investimentos do governo Temer, a primeira citação do homem bomba Eduardo Cunha por envolvimento na obra do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro (UOL, 18.09.2016).

Sérgio Guerra: finado presidente do PSDB, citado nas delações de Yousseff e Paulo Roberto da Costa (EBC, 25.08.2015).

José Sarney: citado por Sérgio Machado (G1, 15.08.2016).

Renan Calheiros: alvo de nove inquéritos no escopo da Lava Jato (OESP,03.05.2016). Citado porSérgio Machado (G1, 15.06.2016), Delcídio do Amaral (G1, 29.05.2016); Carlos Alexandre de Souza Rocha, o Ceará, (G1, 21.03.2016), Nestor Cerveró (OESP, 16.12.2015) e Fernando Baiano (OESP, 12.11.2015).

Aécio Neves: citado pelo doleiro Alberto Youssef (UOL, 25.08.2015); Carlos Alexandre de Souza Rocha, o Ceará, (O Globo, 30.12.2015); Fernando Moura (FSP, 03.02.2016); Delcídio do Amaral (OESP, 15.03.2016); Sérgio Machado (FSP,15.06.2016) e Leo Pinheiro (RBA, 11.07.2016) e (FSP, 27.08.2016). Confira também as reportagens Tucano bom é tucano solto? “(CM, 11.02.2016) e 14 escândalos de corrupção envolvendo Aécio, o PSDB e aliados” (CM, 17.10.2014)."







Via Carta Maior em 20/9/2016

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domingo, 10 de julho de 2016

'Voltar ao primeiro artigo da Constituição'

Por Leonardo Boff*, no Jornal do Brasil - "Quando há uma crise generalizada como esta que estamos vivendo e sofrendo sem perspectiva de uma saída que crie consenso, não temos outra alternativa senão voltar à fonte do poder politico, expressão da soberania de um povo. Temos que resgatar todo o valor do primeiro artigo da Constituição, parágrafo único:”Todo poder emana do povo”.



O povo é, pois,  o sujeito ultimo do poder. Em momentos em que uma nação se encontra num voo cego e perdeu o rumo de seu destino, este povo deve ser convocado para dizer que tipo de país quer e que tipo de democracia deseja: esta com um presidencialismo de coalizão, feito de negócios e negociatas ou uma democracia de verdade, na qual os representantes eleitos  representam efetivamente os eleitores e não os interesses corporativos e empresariais que lhe garantiram a eleição? Urge avançar mais: precisamos dar forma política ao nível de consciência que cresceu em todos os estratos sociais, mostrando vontade de participação nos destinos do país.

No fundo volta a questão básica: vamos nos alinhar aos que detém o poder mundial (inclusive de matar todo mundo) ou vamos construir o nosso caminho autônomo, soberano e aberto à nova fase planetizada da humanidade?

O primeiro projeto prolonga a história ocorrida até os dias de hoje: desde a Colônia, passando pelo Império e pela República sempre fomos mantidos subalternos. Os ibéricos não vieram para fundar aqui uma sociedade mas para montar uma grande empresa internacional privada, uma verdadeira. agro-indústria, destinada a abastecer o mercado mundial. Essa lógica perdura até os dias atuais: tentar transformar nosso eventual futuro em nosso conhecido passado. Ao Brasil cabe ser o grande fornecedor de commodities sem ou com parca tecnologia e valor agregado, num processo de recolonização.

Lamentavelmente este é o intento do atual governo interino, especialmente do PSDB que claramente se alinha a um severo neoliberalismo que implica diminuição do Estado, ataque aos direitos sociais em favor do mercado e um inescrupulosa privatização de bens públicos como o pré-sal entre outros.

O projeto alternativo finca suas raízes na cultura brasileira e no aproveitamento de nossa imensa riqueza que nos pode sustentar como nação independente, soberana e aberta a todas as demais nações. Seríamos uma grande potência, não militarista, nos trópicos, com uma  economia, entre as  maiores do mundo.

Curiosamente, as jornadas de junho de 2013 e posteriormente, mostraram que o povo percebeu os limites da formação social para os negócios. Quer ser sociedade, quer outras prioridades sociais, quer outra forma de ser Brasil.  Numa palavra, quer ser uma sociedade de humanos, coisa diversa da sociedade de negócios. Tal propósito implica refundar o Brasil sobre outras bases.

Mas quem escutou o clamor das ruas, especialmente, dos jovens? Efetivamente ninguém, pois tudo ficou como antes.

O que na verdade nos faltou em nossa história, foi uma verdadeira revolução como houve na França, na Itália e em outros países. A história nunca é uma continuidade, algo que cresce organicamente de uma para outra coisa. Ela é feita de descontinuidades e rupturas radicais que derrubam uma ordem e instauram uma nova.

No Brasil, como sempre lamentava Celso Furtado, nunca tivemos essa ruptura. O que predominou em todo o tempo até hoje é a política de conciliação entre os poderosos. O povo sempre ficou de fora como incômodo dos acertos feitos por cima e contra ele.

O que está ocorrendo agora com a tentativa de impeachment da Presidenta Dilma Roussef, legitimamente eleita, é de dar  continuidade  a esta política de conciliação das elites, do capital rentista e financeiro, daqueles, 10%, segundo o IBGE de 2013 que controlam  42% da renda nacional. Jessé Souza do IPEA  os enumera: são 71.440 super ricos que, por trás manejam o Estado e os rumos da economia na perspectiva de seus interesses, absolutamente egoístas, conservadores e anti-populares. Não lhes importa a perversa desigualdade social, uma das maiores do mundo, que se traduz em favelização de nossas cidades, violência absurda, geração de humilhação,preconceito e degradação social por falta de infra-estrutura, de saúde, de escola e de transporte.

Se o Brasil foi fundado como empresa e para continuar como empresa transnacionalizada, é hora de se refundar como sociedade de cidadãos criativos e conscientes de seus valores.

O meu sonho é que a atual crise com o sofrimento que  encerra, não seja em vão. Que ela crie as bases para o que Paulo Freire chamaria de “o inédito viável”: nunca mais coalização entre os poucos  ricos de costas para as grandes maiorias. Que se busque viabilizar o que prescreve a Constituição em seu terceiro artigo (IV):”promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.""

*Leonardo Boff é articulista do Jornal do Brasil online e escritor

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quarta-feira, 15 de junho de 2016

Quem não cabe no Orçamento do Brasil?

Por LAURA CARVALHO, em Outras Palavras - "No levantamento realizado pelos pesquisadores Pablo Ortellado, Esther Solano e Lucia Nader em São Paulo, durante as manifestações pró-impeachment do dia 16 de agosto de 2015, dois temas chamaram a atenção. Entre os manifestantes, 97% concordaram total ou parcialmente que os serviços públicos de saúde devem ser universais, e 96% que devem ser gratuitos. Já sobre a universalidade e a gratuidade da educação, o apoio foi de 98% e 97% dos manifestantes, respectivamente. “Isso é um resquício de junho de 2013”, afirmou Pablo Ortellado a uma reportagem do El País de 18/08/2015.


O resultado deste tipo de levantamento, quando somado aos resultados nas urnas das últimas quatro eleições presidenciais, sugerem que o pacto social que deu origem à Constituição de 1988 não foi desfeito. Ao contrário, as demandas nas ruas desde 2013 e nas ocupações das escolas desde 2015 têm sido por melhorias nos serviços públicos universais, e não pela redução na sua prestação.

A regra Temer-Meirelles prevê que as despesas primárias do governo federal passem a ser reajustadas apenas pela inflação do ano anterior. Se vigorasse no ano passado, e outros gastos não sofressem redução real, as despesas com saúde teriam sido reduzidas em 32% e os gastos com educação em 70% em 2015.

Pior. Se o PIB brasileiro crescer nos próximos 20 anos no ritmo dos anos 1980 e 1990, passaríamos de um percentual de gastos públicos em relação ao PIB da ordem de 40% para 25%, patamar semelhante ao verificado em Burkina Faso ou no Afeganistão. E se crescêssemos às taxas mais altas que vigoraram nos anos 2000, o percentual seria ainda menor, da ordem de 19%, o que nos aproximaria de países como o Camboja e Camarões.

“A Constituição não cabe no orçamento”, argumentam seus defensores, na tentativa de transformar em técnica uma decisão que deveria ser democrática. De fato, há uma contradição evidente entre desejar a qualidade dos serviços públicos da Dinamarca e pagar impostos da Guiné Equatorial. O que esquecem de ressaltar é que os que pagam mais impostos no Brasil são os que têm menos condições de paga-los. Se os que ganham mais de 160 salários mínimos por mês têm 65,8% de seus rendimentos isentos de tributação pela Receita Federal, fica um pouco mais difícil determinar o que cabe e o que não cabe no orçamento.

O fato é que as propostas do governo interino não incluem nenhum imposto a mais para os mais ricos, mas preveem muitos direitos a menos para os demais. Os magistrados conseguem reajuste de seus supersalários, mas a aposentadoria para os trabalhadores rurais é tratada como rombo. A cultura, a ciência e a tecnologia ou o combate as desigualdades deixam de ser importantes. O pagamento de juros escorchantes sobre a dívida pública não é sequer discutido, mas as despesas com os sistemas de saúde e educação são tratadas como responsáveis pela falta de margem de manobra para a política fiscal.

Essas escolhas estão sendo feitas por um governo que não teve de passar pelo debate democrático que só um processo de eleições diretas pode proporcionar. A democracia caberia no orçamento. O que parece não caber é a nossa plutocracia oligárquica."

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quinta-feira, 14 de abril de 2016

Por que se discute a constitucionalidade do impeachment

Por Lilian Milena e Pedro Garbellini, Jornal GGN - "Em entrevista a Luis Nassif, na redação do GGN, a professora da PUC-SP explica os nós em torno do debate sobre o impeachment e por que o Supremo Tribunal Federal (STF) anda tão requisitado para discutir a constitucionalidade do processo aberto na Câmara dos Deputados.

Flávia Piovesan-jurista
O assunto, destaca a jurista, realmente não é tão simples de compreender, primeiro porque o crime contra a probidade administrativa, ou seja, contra as formas legais da administração pública, é destacado tanto no Artigo 85 da Constituição Federal, que define os crimes de responsabilidade nos atos do Presidente da República, quanto no Código Penal (artigo 339). 

Outro ponto que atrapalha a objetividade nas discussões é que a forma como o Artigo 85 foi escrito “abre algumas hipóteses que interseccionam com crimes”, do código penal. Essa mescla, prossegue Piovesan, acaba confundindo até mesmos os juristas. 

Por outro lado, a professora destaca que a Constituição traz clareza quanto ao processo do julgamento, ou seja, como deve ser o rito do impeachment no Congresso.

“[No caso de] crime de responsabilidade, a primeira fase é de juízo de admissibilidade pela Câmara, [em seguida] processo e julgamento pelo Senado. (...) crime comum também requer, se for cometido pelo presidente, o juízo de admissibilidade pela Câmara e julgamento pelo Supremo”, completa.

Juízo de admissibilidade é um termo jurídico que quer dizer ‘exame do recurso’, para saber se o processo tem fundamento ou não. Assim, trazendo para o exemplo presente, o que está ocorrendo hoje na Câmara dos Deputados é a discussão do juízo dos fundamentos do impeachment, para depois, se for aceito, ser examinado pelo Senado e, também sendo lá aceito, julgando nesta última Casa.

Tendo em vista essa explicação, Piovesan pontua que o nó jurídico enfrentado hoje é sobre a definição do que é probidade administrativa que também, com base no código penal, “poderia, em tese, incidir como um tipo penal”.

A grande questão - sobre a qual Piovesan não tem clareza - é que se o Supremo não puder avaliar o mérito ou não das acusações, caberá à Câmara aceitar o impeachment e julgar seu mérito. Ou seja, ele ganha um poder para destituir o presidente que está previsto apenas no sistema parlamentarista - e não no presidencialista, que foi o sistema escolhido por plebiscito pelos brasileiros.

“Agora, o que nós aqui em direito constitucional, literatura, doutrina, [entendemos] que é claro é: crime de responsabilidade tem natureza política; infração penal comum tem natureza jurídica; cada qual julgado por uma casa, [um pelo Congresso, outro pelo Supremo, quando o crime comum é praticado por alguém de foro privilegiado como um presidente da República].  

Por isso, a afirmação dita entre os juristas de que o impeachment pode ser fruto de um crime político-jurídico, submetido a um julgamento político. 

Uma lei ultrapassada

O segundo fator que divide as interpretações é quanto às definições do que seriam os crimes de responsabilidade fiscal. Piovesan chama a atenção para o fato da legislação que define esse tipo de crime ser da década de 1950, portanto, antes mesmo da criação da própria Constituição Federal. 
“A Constituição de 1988 define de forma muito elástica e ampla, no Artigo 85, (...) crimes de responsabilidade nos atos do presidente que atentam contra a Constituição, especialmente contra probidade, livre exercício dos [demais] poderes, lei orçamentária etc. E a Constituição prevê que uma lei regulamentará o crime de responsabilidade. O ponto é que, lamentavelmente, o nosso legislativo foi incapaz nesses mais de 25 anos de adotar uma lei para regulamentar [o crime de responsabilidade administrativa] de forma adequada”, pontua.

Foi lhe lembrado que em muitos outros casos, não regulamentados por lei, coube ao Supremo definir a jurisprudência.

Piovesan compreende que a Lei do Impeachment (nº 1079/50) é desatualizada, se sobrepondo as normas que a própria Constituição estabelece sobre o que seria um crime de responsabilidade fiscal. A título de comparação, destacou que a lei de 50 coloca no bojo dos crimes contra probidade administrativa a falta de decoro no cargo. "Termos [como este são] extremamente amplos", pondera. 

O papel do Supremo

A jurista avalia que o STF tem se manifestado de forma cautelosa na matéria, procurando “ser coerente com a sua jurisprudência”, como, por exemplo, levando em conta as experiências do caso Fernando Collor de Mello. A destituição do seu mandato, em 1992, também se deu com base na Lei 1079/50.

Porém a avaliação dos ministros do STF, a qual Piovesan se refere, não foi especificamente sobre a aplicação dessa normativa, mas sim quanto à atuação do Senado e da Câmara. 

"O Supremo, quando decidiu [sobre o rito do impeachment na Câmara] tentou clarear um pouco essa penumbra de legislações, entendeu que cabe [o julgamento final] ao Senado, após a autorização da Câmara, [e que] o Senado não estaria obrigado, teria liberdade de processar ou não, votando e deliberando por maioria simples [a admissibilidade do processo de impeachment dentro da Casa]”.

Piovesan defende o papel do STF como corte garantidora dos direitos constitucionais. “No tocante ao impeachment (...) cabe ao Supremo tão somente a vigilância, o monitoramento do procedimento, porque pelo regramento constitucional o mérito, o processo e julgamento competem privativamente ao Senado Federal”.

Quanto ao rito de impeachment, o STF também interpretou que a presidente Dilma não será afastada do cargo por 180 dias, caso a Câmara decida pela destituição do seu cargo. 

"O Supremo teve o cuidado de dizer: não é bem assim! (...), o argumento foi: no caso Collor coube ao Senado, como a decisão era tão dramática, avalizar a admissibilidade pela Câmara. Então se a Câmara autorizar para que a presidente seja afastada por 180 dias é necessário ainda o aval do Senado por maioria simples endossando e instaurando".

Presidencialismo vulnerável

A docente da PUC-SP considera que o atual sistema político torna o presidencialismo vulnerável, alertando para a necessidade do país estabelecer de forma mais clara os papéis institucionais de cada poder. 

A professora mostra-se também preocupada com a proposta de um governo parlamentarista como saída para a crise política, não por conta do modelo de governo em si, mas pela ansiedade dos políticos no Congresso aplicarem alguma solução sem o amplo debate popular, que seja baseado na Constituição.

“Nós votamos em 93, a população escolheu o presidencialismo, não o parlamentarismo”, ressalta, lembrando em seguida que o universo da disputa de poderes na América Latina tem apontado nos últimos tempos para a teoria da “Supremocracia”, ou seja, do hiperfortalecimento do judiciário em detrimento do enfraquecimento dos demais poderes, desequilibrando o jogo democrático.
 
“[Dizíamos] na América Latina que saímos de regimes ditatoriais [e] prosseguimos a regimes hiperpresidencialistas. Hoje temos uma outra paisagem, o hiperpresidencialismo passa por um teste. (...) O que a gente está vivendo hoje é o desafio do fortalecimento de institucionalidade democrática com dificuldades e tensões”.
 
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PS: Não deixe de assistir aos vídeos da entrevista com a jurista Flávia Piovesan

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sexta-feira, 3 de julho de 2015

OAB diz que Eduardo Cunha rasgou a Constituição

Do Jornal do Brasil – “O presidente da Ordem do Advogados do Brasil, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, classificou como inconstitucional a PEC que propõe a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos no caso de crimes hediondos, aprovada na madrugada desta quinta-feira em primeiro turno na Câmara. Segundo ele, a PEC fere a constituição pela proposta em si, e agora pela manobra do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para aprová-la.

Depois de rejeitada na madrugada de quarta, a proposta ganhou uma emenda aglutinativa e foi colocada novamente em votação, por Cunha, quando foi aprovada. Coêlho destaca que a entidade irá recorrer ao Supremo Tribunal Federal caso a proposta seja aprovada em segundo turno na Câmara e depois passe no Senado.

"A redução da maioridade, que já possuía a inconstitucionalidade material, porque fere uma garantia pétrea fundamental, passa a contar com uma inconstitucionalidade formal, diante deste ferimento ao devido processo legislativo", destacou Coêlho, em nota. "Tanto pelo seu conteúdo, quanto pela forma de sua aprovação, a PEC [Projeto de Emenda Constitucional] não resiste a um exame de constitucionalidade", acrescentou o presidente da Ordem.

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) também divulgou nota apontando a medida como inconstitucional.

Leia abaixo:

AMB considera inconstitucional emenda que reduz maioridade

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) considera grave o procedimento adotado pela Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (2), ao levar para nova votação emenda aglutinativa idêntica à proposta reprovada pelo Plenário da Casa na noite de terça-feira.

Além da constitucionalidade material da PEC 171/1993 ser alvo de questionamento junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), a medida adotada pela Câmara fere o regimento legislativo e representa inconstitucionalidade formal à proposta.

Para a entidade, não se pode alterar o que está estabelecido pelo artigo 228 da Constituição Federal; e o artigo 60, que trata de emenda à Constituição, veda a deliberação sobre matéria que tente abolir direito ou garantia individual.

Esse é mais um retrocesso para a democracia brasileira. O sentimento de todos os operadores do sistema de infância e juventude hoje é de indignação. Buscar a redução da maioridade penal como solução para diminuição da violência juvenil, sem o profundo e importante debate, trará intangíveis danos à sociedade.

Fonte: Jornal do Brasil

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quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Constituição Brasileira completa 25 anos - uma análise de juristas e políticos

Por Ricardo Galhardo - iG São Paulo -

"Em 25 anos, Constituição se adapta a mudanças sem perder conquistas sociais - Prestes a completar 25 anos de vigência, a Constituição Federal promulgada em 5 de outubro de 1988 recebeu 74 emendas. Outras 1.700 propostas de emendas (PECs) tramitam no Congresso Nacional e a cada quatro anos o tema da suposta necessidade de reformas constitucionais volta à tona em forma de discurso eleitoral.
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