domingo, 30 de setembro de 2012

Prática de jornalismo tendencioso vem de muito longe

Um artigo escrito com exclusividade para o site 247 do jornalista e escritor, Fernando Morais, autor de vários livros, entre eles "Chatô, o rei do Brasil, biografia do famoso jornalista Assis Chateaubriand, ganhou enorme repercussão na Blogosfera. Foi re-publicado em diversos blogs no decorrer desta semana. O texto nos remete à uma séria refflexão sobre o modus operandi da imprensa em geral, que no afã de manter a popularidade e ganhar muito dinheiro, acaba produzindo factóides (para usar uma expressão da moda na mídia), sem compromisso algum com a verdade.
Sequer preocupação com a qualidade da informação.Diria até que assumindo papel de partido político, ou quando muito, trabalhando a favor de uma legenda partidária da qual possa obter algum favorecimento. Em muitos casos, assumindo postura de autoridade política ou eclisiástica legalmente constituída.
Só depois de escandalizar o grande público e causar um tremendo estrago, descobre-se adiante que a matéria produzida e publicada, não passava de um embuste. Transferindo para o personagem central que teve sua moral detonada, o ônus da prova de algum suposto delito praticado, criminosamente lhe atribuído.
Há um batalhão de cronistas e articulistas, ganhando certamente uma fortuna, a prestar esse tipo de trabalho em importantes orgãos de comunicação do país.  

Quer um pequeno exemplo? Veja esta notícia vinculada no Site Terra, sobre uma nota publicada em uma "conceituada" revista semanal. Trata de uma doação de campanha a um candidato a prefeito da cidade de Salvador-BA. A nota publicada foi parar na justiça. Na decisão, a juíza Maria de Lourdes Oliveira Araújo, da 5ª Zona Eleitoral da capital baiana, afirmou na sentença que a nota "se aproxima de uma disfarçada propaganda, na medida em que ultrapassa os limites de informação imparcial ou de mera crítica, tanto por afirmar que não prova, como por passar um recado subliminar sobre qual candidato reputa melhor". A decisão determina que a revista terá que publicar o direito de resposta do candidato. (via)

Essa prática predadora, inconsequente e tendenciosa do jornalismo brasileiro, vem de muito longe. É o que podemos constatar neste artigo de Fernando Morais. Tema que já vinculamos por aqui.

Confira a íntegra do artigo.

Um espectro ronda o jornalismo: Chatô

Por Fernando Morais

As agressões e infâmias dirigidas por alguns jornais, revistas, blogs e telejornais ao ex-presidente Lula e ao ex-ministro José Dirceu me fazem lembrar um episódio ocorrido em Belo Horizonte em meados do século passado.
Todas as sextas-feiras o grande cronista Rubem Braga assinava uma coluna no jornal “Estado de Minas”, o principal órgão dos Diários Associados em Minas Gerais. Irreverente e anticlerical, certa vez Braga escreveu uma crônica considerada desrespeitosa à figura de Nossa Senhora de Lourdes, padroeira de Belo Horizonte. Herege, em si, aos olhos da conservadora sociedade mineira o artigo adquiriu tons ainda mais explosivos pela casualidade de ter sido publicado numa Sexta-Feira da Paixão.
Indignado, o arcebispo metropolitano Dom Antonio dos Santos Cabral redigiu uma dura homilia recomendando aos mineiros que deixassem de assinar, comprar e sobretudo de ler o “Estado de Minas”. Dois dias depois o documento foi lido na missa de domingo de todas as quinhentas e tantas paróquias de Minas Gerais.
O míssil disparado pelo religioso jogou no chão a vendagem daquele que era, até então, o mais prestigioso jornal do Estado. E logo repercutiu no Rio de Janeiro. Mais precisamente na mesa do pequenino paraibano Assis Chateaubriand, dono dos Diários Associados, um império com rádios e jornais espalhados por todos os cantos do Brasil.
Célebre pela fama de jamais engolir desaforos, o colérico Chateaubriand telefonou para Geraldo Teixeira da Costa, diretor do “Estado de Minas”, com uma ordem expressa, repleta de exclamações:
- Seu Gegê! Quero uma reportagem de página inteira contando que quando jovem Dom Cabral estuprou a própria irmã! O senhor tem uma semana para publicar isso!
Tamanha barbaridade não passaria pela cabeça de quem quer que conhecesse o austero Dom Cabral, cujas virtudes haviam levado o Papa Pio XI a agraciá-lo com o título de Conde. Mas ordens eram ordens.
Os dias se passavam e a reportagem não aparecia no jornal. Duas semanas depois do ultimato, um Chateaubriand possuído pelo demônio ligou de novo para Belo Horizonte:
- Seu Gegê! Seu Gegê! O senhor esqueceu quem é que manda nesta merda de jornal? O senhor esqueceu quem é que paga seu salario, seu Gegê? Cadê a reportagem sobre o estupro incestuoso cometido por Dom Cabral?
Do outro lado da linha, um pálido e tremebundo Gegê gaguejou:
- Doutor Assis, temos um problema. Descobrimos que Dom Cabral é filho único, não tem e nunca teve irmãs...
Sapateando sobre o tapete, Chateaubriand parecia tomado por um surto nervoso:
- TEMOS um problema? Seu Gegê, nós não temos problema algum! Isso é um problema de Dom Cabral! Publique a reportagem! Cabe A ELE provar que não tem irmãs, entendeu, seu Gegê? Vou repetir, seu Gegê: cabe A ELE provar que não tem irmãs!!
Passadas oito décadas, suspeito que Chatô exumou-se do Cemitério do Araçá e, de peixeira na cinta, encarnou nos blogueiros limpos e nos editores dos principais jornais e revistas brasileiros.

Como no caso de Dom Cabral, cabe a Lula provar que não marchou com a família e com Deus, em 1964, quando tinha 18 anos, pedindo aos militares que derrubassem o governo do presidente João Goulart. Cabe a Dirceu provar que não foi o chefe do chamado mensalão.


Imagem: dreamstime/Flynt 
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