O dilema sobre Dilma
“A ética é o ideal, mas a prática desonesta é a realidade. Pregamos a ética para os outros. Queremos que eles se demonstrem éticos, mas nos reservamos o privilégio de ser pragmáticos em benefício próprio.”
“O problema é que
os elogios e críticas incidem sobre o mesmo traço de personalidade - ou postura.
Distingo. Traço de caráter pertence à pessoa. Incorporou-se à sua psique, por
educação ou decisão. Postura é consciente, é mais racional. No seu caso, parece
que psicologia e ética correm na mesma direção. No começo do mandato, esse
rigor, que também se exprime num apreço à liturgia do cargo sem precedentes faz
bastante tempo, dado que inclui uma seriedade quase puritana, era louvado.
Tínhamos uma dirigente que não fazia negócios. Com o tempo, tornou-se tema de
preocupação e mesmo de crítica. Ela não cede. Para votar uma lei, faz o mínimo
de acordos. Isso estressa as relações com os parlamentares e os partidos. Mas
aparentemente tem dado certo, isto é, as derrotas em alguns projetos de lei não
trouxeram resultado pior do que teria sido aceitar desfigurá-los.
Muitas críticas a Dilma, penso eu, exprimem um problema nosso, de nossa
sociedade, não exatamente dela. Queremos ética na política, mas sabemos que na
prática não é bem assim. Desconfiamos que a ética, na política, não entrega os
bens desejados. Por isso, prestamos homenagem, da boca para fora, à moral, mas -
pragmaticamente - aceitamos infrações a ela. Isso não é raro. Já vi pessoas que
se indignavam com a desonestidade vigente mas sobrefaturavam a conta que
emitiam. Essa divisão na personalidade, essa contradição ética entre a fala
honesta e a prática desonesta, percorre a sociedade brasileira de cima em baixo.
Ninguém esquece o senador goiano que era um dos críticos mais veementes da
corrupção petista, estando, ele próprio, envolvido em negócios que lhe custaram
o mandato.”

- Parágrafos da matéria do professor titular de ética e filosofia política na
Universidade de São Paulo, publicada no Valor Econômico. A íntegra pode
ser lida aqui. O
texto inteiro foi repercutido no blog SQN.
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