Sobre leões e cordeiros.

Sobre Leões e Cordeiros
Ou como se forma uma nação de Pocotós*
Caminhamos para uma mesmice. Não se discutem mais as grandes causas. Pior, não se incentiva mais essa discussão. Escolas formam manadas bovinas, a mídia se curva aos interesses econômicos e quem compreende isso muito bem manobra interesses convenientes através dessas instituições. Caso você tenha dificuldade em visualizar esse cenário, assista, por favor, ao filme Leões e Cordeiros**. Nele, três lados de uma mesma história são apresentados:
1. Um senador ambicioso (Tom Cruise) convoca uma jornalista famosa (Meryl Streep) para oferecer-lhe um furo de reportagem: a nova estratégia americana para derrotar o terrorismo.
2. Ao mesmo tempo, um experimentado professor universitário (Robert Redford), ele mesmo um ex-combatente do Vietnã, reúne-se com seu aluno mais brilhante, procurando motivá-lo a retornar às aulas.
3. Paralelo a esses dois momentos, dois soldados norte-americanos debatem-se contra guerrilheiros afeganes e lutam por suas vidas.
Aos poucos o filme vai mostrando a responsabilidade de cada membro da sociedade no desenrolar dos fatos. Cada um tem suas razões, mas uma pode ser destacada: a falta que faz pensar, desenvolver um espírito crítico.
O professor luta desesperadamente para não perder seu melhor aluno. Sente que está fracassando. O jovem percebe que é mais “lucrativo” focar suas energias em festas, televisão, roupas e mais festas. P.S.: Isso se aplica ao Brasil.
Os soldados, membros de classes econômicas pobres, acreditam ingenuamente (você já viu algum homem-bomba velho?) num ideal patriótico que há muito perdeu o sentido (talvez na Segunda Guerra Mundial). Dar-se-ão conta disso em pleno campo de batalha, defendendo não seu país, mas interesses econômicos – petróleo. Não existe o bom e o mau, heróis e bandidos. Apenas o mercado – viva o mercado! P.S.: Isso se aplica ao Brasil.
O confronto entre jornalista e político ilustra a realidade atual. A repórter percebe as falhas na estratégia do senador, mas terá de enfrentar a realidade econômica da empresa que a emprega. “Trate isso como um furo, não questione a veracidade dos fatos ou segundas intenções”, diria seu superior. Sabe como é, certa ou errada, essa informação venderá muito em revistarias. É isso que importa, afinal de contas! P.S.: Isso se aplica ao Brasil.
Sabe o que é mais perturbador nisso tudo? A falta que faz formar cidadãos que pensam, questionam, refletem. Como fazem falta os inconformados! Hoje o que importa são sapatos, tênis, carros, bundas, ombros, bolsas. Ganhar dinheiro e se dar bem na vida. Já dizia Millôr Fernandes: “É importante ter, sem que o ter te tenha”. Assusta-me ver que livros, salvos os de auto-ajuda, não são consumidos. Que um Big Brother tenha enésimas repetições. Que se saiba mais da novela das oito e menos sobre o que é uma República. Que se escolham candidatos e não partidos. Que se combata o cigarro, mas não o álcool, vide nosso Carnaval e seus trágicos acidentes automobilísticos. Que ser brasileiro tem mais a ver com futebol do que com política. Que ter o iPod do mome nto é mais importante que ler um jornal.
Enfim, como já dizia o saudoso Nélson Rodrigues, toda unanimidade é burra. E eu vou tomar um Prozac, “porque sou brasileiro e nunca desisto”, de outra forma terei uma baita depressão!
*Pocotós é um termo usado por Luciano Pires para classificar medíocres que compram tudo que lhes é oferecido principalmente pela mídia de massa, que precisa faturar.** Leões e Cordeiros é um filme que não foi um sucesso de bilheteria. Perdeu, por exemplo, para preciosidades como: Velozes e Furiosos, Mais Velozes e Mais Furiosos, Velozes e Furiosos em Tóquio, O Atirador, Rambo I, II, III, etc.
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