Meta elimina checagem de fatos externa e adota modelo do X
Para evitar o que chamou de "vieses", dona do Facebook e Instagram terá notas da comunidade como as do X, em vez de checagem de fatos terceirizada. Justificativa de Zuckerberg coincide com discurso de Trump e Musk.
Segundo o proprietário das redes sociais Facebook e Instagram, "os checadores de fato simplesmente têm sido politicamente parciais demais, destruindo mais confiança do que criaram".
O anúncio da Meta repete muitas das reclamações de políticos republicanos e do dono do X, Elon Musk, que equiparam os programas de checagem de fatos a uma forma de censura.
O próprio Zuckerberg concedeu que as mudanças são, em parte, determinadas por eventos políticos, inclusive a vitória de Donald Trump nas presidenciais americanas. "As eleições recentes também parecem um ponto de inflexão cultural, no sentido de voltar a priorizar o discurso."
As plataformas da Meta, sobretudo Facebook e Instagram, vão "simplificar" suas políticas para conteúdos, prosseguiu o magnata de 40 anos num vídeo online, e "se livrar de um monte de restrições sobre tópicos como imigração e gênero, que estão simplesmente fora de contato com o discurso mainstream".
Assim, a gigante da mídia social passaria a permitir "mais fala", a fim de enforcar conteúdos ilegais ou "violações de alta gravidade", como terrorismo, exploração sexual infantil e narcotráfico.
Ao anunciar a mudança, Zuckerberg também afirmou que "países da América Latina têm tribunais secretos que podem ordenar que empresas removam conteúdos de forma silenciosa". Ele não mencionou a quais países se referia, mas é um argumento semelhante ao adotado por Musk em relação à atuação do Supremo Tribunal Federal, que chegou a derrubar o X no Brasil no final de outubro após a empresa não obedecer a ordens judiciais, bloqueio que durou cerca de 40 dias.
Rede de checadores critica mudança de regra
A diretora da Rede Internacional de Checagem de Fatos (IFCN, na sigla em inglês), Angie Drobnic Holan, afirmou que a decisão da Meta irá "prejudicar usuários de redes sociais que estão à procura de informações precisas e confiáveis paara tomar decisões sobre suas vidas cotidianas". "O jornalismo de checagem de fatos nunca censurou ou removeu publicações, ele adicionou informações e contexto a afirmações controversas e desmascarou conteúdo falso e teorias da conspiração."
Ela disse ainda considerar "lamentável" que a decisão da Meta tenha sido tomada "na esteira da extrema pressão política de um novo governo e de seus apoiadores". "Os checadores de fatos não foram tendenciosos em seu trabalho - essa linha de ataque vem dos que acham que devem ter a possibilidade de exagerar e mentir sem refutação ou contraditório."
As agências de notícias Agence France-Presse (AFP) e Associated Press (AP) estão entre os veículos de imprensa que têm atuado na checagem de fatos para a Meta.
Para João Brant, secretário de políticas digitais da Presidência do Brasil, o anúncio de Suckerberg antecipa o início do governo Trump e explica uma "aliança" da Meta com o próximo governo americano. "Meta vai atuar politicamente no âmbito internacional de forma articulada com o governo Trump para combater políticas da Europa, do Brasil e outros países que buscam equilibrar direitos no ambiente online", afirmou ele no X.
Brant é um dos representantes do governo brasileiro envolvidos na negociação do projeto de lei que cria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, engavetado em junho pelo Congresso. O texto é parcialmente inspirado na norma da União Europeia (UE) sobre o tema, o DSA (Digital Service Act).
Meta se alinha com Trump 2.0
Trump vinha criticado duramente a Meta e Zuckerberg, acusando-os de apoiar políticas liberais de tendência anticonservadora. Após a invasão da Capitólio em 6 de janeiro 2021, ao fim de seu primeiro mandato, o magnata nova-iorquino foi expulso do Facebook, mas foi readmitido no começo de 2023.
Numa aparente tentativa de remediar a relação entre a sua empresa e o presidente eleito, em novembro de 2024 Zucherberg jantou com Trump na propriedade deste em Mar-a-Lago, Flórida. Outro gesto conciliatório seria a recente nomeação de Dana White, presidente de uma organização de artes marciais e trumpista ferrenho, para o conselho da Meta.
Mais relevante ainda foi a contratação do republicano linha-dura Joel Kaplan como diretor de Assuntos Globais, substituindo o ex-vice-ministro birtânico Nick Clegg. "Conteúdo ofensivo demais é censurado, gente demais se vê injustamente trancada na 'prisão do Facebook", afirmou recentemente o lobista e advogado. O esquema anterior, de criar sistemas complexos para gerir os conteúdos, teria "ido longe demais", resultando em "erros demais".
Kaplan defendeu a nova estratégia, de eliminar especialistas externos. "Nós vimos essa abordagem na X, onde eles dão poder à comunidade para decidir até que ponto as postagens são potencialmente enganosas e precisam de mais contexto."
Como parte da reestruturação, a Meta realocará suas equipes de confiança e segurança, do estado da Califórnia, onde as posições liberais predominam, para o Texas, mais conservador. "Isso vai ajudar a criar confiança para fazer esse trabalho em lugares onde há menos preocupação com o viés das nossas equipes", afirmou Zuckerberg.
O quase independente Conselho Supervisor da Meta, criado para arbitrar sobre decisões de conteúdo controversas, disse saudar as medidas, estando ansioso para colaborar com a empresa "para entender as mudanças mais detalhadamente, assegurando que o a nova abordagem seja tão eficaz e favorável ao discurso quanto possível".
Publicado originalmente pela DW em 07/01/2025
Imagem: reprodução/Foto: Josh Edelson/AFP/Getty Images
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