sábado, 28 de março de 2020

Isolamento vertical proposto por Bolsonaro se mostrou ineficaz e arriscado, como aconteceu em outros países

Giulia Afiune, na Agência Pùblica - Em entrevista exclusiva para a Agência Pública, a médica pneumologista, pesquisadora e docente da Fundação Oswaldo Cruz Margareth Dalcolmo disse que a flexibilização no isolamento social, proposta por Bolsonaro, foi uma medida ineficaz e perigosa para combater o coronavírus em outros países. Segundo a médica, quebrar o isolamento social agora pode levar a mortes que poderiam ser evitadas.
Na entrevista, ela alerta que quebrar o isolamento social, como propõe Bolsonaro, pode levar a um colapso do sistema de saúde e provocar mortes que seriam evitadas. "Nesse momento, que é o momento muito agudo dessa epidemia, não há nenhuma outra maneira de impedir a transmissão. Não há nenhuma outra arma", diz a pesquisadora, reiterando que ainda não há nem remédios nem vacinas de eficácia comprovada contra o novo coronavírus.  
A pesquisadora afirma que se fizermos um esforço para o isolamento mais intenso, enquanto o número de casos de Covid-19 está crescendo, é possível que possamos começar a sair do isolamento, gradualmente, dentro de 2 ou 3 semanas.

Margareth explicou que, o "isolamento vertical", sugerido por Bolsonaro, foi considerada uma medida ineficaz e perigosa para combater o coronavírus em outros países. “O maior exemplo é a Inglaterra que voltou atrás, verificando que [o isolamento vertical] não ia resolver. Eles voltaram atrás pelo risco que isso incorreria diante de uma doença nova de alta transmissibilidade, cujos riscos não estão completamente determinados. Agora, dada a progressão da epidemia, a Inglaterra está propondo o isolamento mais radical.”, disse a pesquisadora.

Durante a entrevista, Margareth explicou que já existe um coronavírus “brasileiro”, fruto de mutações do vírus importado. “Como a doença chegou ao Brasil pela classe média, ela é uma doença importada, e a transmissão sustentada ou comunitária começou com um espaço de tempo um pouco maior. Agora vai depender da velocidade com a qual ela vai se espalhar nas comunidades de grande aglomeração. Essa é a variável da qual dependemos agora”.

Primeira pergunta: Durante algumas semanas, o Ministério da Saúde deu recomendações a favor do distanciamento social e isolamento domiciliar. Agora, teve uma mudança de tom. O presidente está dizendo que “o Brasil não pode parar” e planejando a flexibilização da quarentena a partir do dia 7 de abril. Quais são os riscos do “isolamento vertical” proposto pelo Bolsonaro?

Margareth Dalcolmo: São coisas diferentes. O que o nosso presidente propôs foi uma quebra no isolamento social.

O risco que isso traz é que a doença que já chegou a essas áreas mais vulneráveis e pobres vai se disseminar com uma velocidade fora de controle. Ela vai lotar os serviços de saúde. O SUS, que é quem tem que dar resposta para 80% da população brasileira nessa grande epidemia atual, não tem condições de arcar e nós vamos ver um colapso generalizado, aumentando mais ainda a mortalidade que poderia ser evitada.

Nós estamos falando de um patógeno que é altamente transmissível e transmite com uma velocidade e uma intensidade maior do que a gripe comum. É considerado que uma pessoa pode transmitir para três ou quatro.

Realisticamente, vacina é uma coisa para se pensar para, no mínimo, daqui a dois anos. E da mesma maneira, não temos tratamento. Então assim, a única coisa a fazer, a meu juízo, é manter o isolamento social. Neste momento, que é o momento muito agudo dessa epidemia, não há nenhuma outra maneira de impedir a transmissão.

Então é preciso que nós separemos e isolemos as pessoas para interceptarmos essa cadeia de transmissão. Não há nenhuma outra arma.

Quebrar o isolamento domiciliar agora significa que haverá mortes que poderiam ser evitadas e não serão?

Margareth Dalcolmo: Sim. Mas isso não vai acontecer porque [a voz do presidente] foi uma voz que me pareceu muito isolada. Não é aquilo que foi secundado nem pelo Ministério da Saúde. Nosso Ministro ouviu a comunidade acadêmica, está trabalhando muito próximo de nós, e o Ministério da Saúde, formalmente, continua recomendando isolamento social.

E o que é o isolamento vertical?

Margareth Dalcolmo: Ele [Bolsonaro] está propondo que deixem apenas as pessoas idosas isoladas. Nós não concordamos com isso como medida de saúde pública porque outros países que pensaram em fazê-lo já voltaram atrás – é o que está ocorrendo agora no estado de Nova York.

Estou falando do ponto de vista técnico. Tecnicamente, nós vamos seguir a experiência dos países que nos antecederam e que, inclusive, pensaram em fazer isolamento vertical. E o maior exemplo disso é a Inglaterra que voltou atrás, verificando que [o isolamento vertical] não ia resolver. Eles voltaram atrás pelo risco que isso incorreria diante de uma doença nova de alta transmissibilidade, cujos riscos não estão completamente determinados. Agora, dada a progressão da epidemia, a Inglaterra está propondo o isolamento mais radical.

A economia terá que ter soluções alternativas, obviamente, como todo mundo está buscando, para resolver o problema durante esse período.

O isolamento vertical é muito eficaz quando se trata de uma epidemia menor. Mas numa doença com uma transmissibilidade tão alta quanto essa, é impossível. Os próprios epidemiologistas, grandes pensadores, já reviram essa posição agora. Todo conhecimento diante de uma situação tão nova é muito dinâmico. Tudo é revisto quase que permanentemente.

Clique aqui para ler a entrevista completa.

Imagem: reprodução/Foto: apublica.org/arquivo pessoal

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